por Horacio Quiroga
trad.: Henry Alfred Bugalho
I
Creia em um mestre — Poe, Maupassant, Kipling, Tchekov — como em Deus mesmo.
II
Creia que sua arte é um cume inacessível. Não sonhe em domá-la. Quando puder fazê-lo, você o conseguirá sem mesmo sabê-lo.
III
Resista o quanto puder à imitação, mas imite se o influxo for forte demais. Mais do que qualquer outra coisa, o desenvolvimento da personalidade é uma grande paciência.
IV
Tenha fé cega não em sua capacidade para o triunfo, senão no ardor com que o deseja. Ame a sua arte como à sua namorada, dando-lhe todo seu coração.
V
Não comece a escrever sem saber desde a primeira palavra aonde vai. Em um conto bem realizado, as três primeiras linhas têm quase a importância das três últimas.
VI
Se quer expressar com exatidão esta circunstância: “Do rio soprava o vento frio”, não há em língua humana mais palavras do que as apontadas para expressá-la. Uma vez dono de suas palavras, não se preocupe em observar se são consoantes ou assonantes entre si.
VII
Não adjetive sem necessidade. Inúteis serão quantas notas de cor adicionar a um substantivo débil. Se achar aquele que é necessário, apenas ele terá uma cor incomparável. Mas tem de achá-lo.
VIII
Tome seus personagens pela mão e conduza-os firmemente até o final, sem ver outra coisa além do caminho que lhes traçou. Não se distraia vendo o que eles podem ou não lhes importa ver. Não abuse do leitor. Um conto é um romance depurado de cascalho. Tenha isto como uma verdade absoluta, mesmo que não seja.
IX
Não escreva sob o império da emoção. Deixe-a morrer, e evoque-a depois. Se for capaz então de revivê-la tal qual foi, terá chegado à metade do caminho na arte.
X
Não pense em seus amigos ao escrever, nem na impressão que causará sua história. Conte como se seu relato não tivesse mais importância do que para o pequeno ambiente de seus personagens, dos quais você poderia ter sido um. De nenhum outro modo se obtém a vida do conto.
Biografia do autor
Horacio Silvestre Quiroga Forteza (Salto, 31 de dezembro de 1879 — Buenos Aires, 31 de dezembro de 1937) foi um escritor uruguaio famoso por seus contos, que geralmente tratavam de eventos fantásticos e macabros na linha de Edgar Allan Poe e de temas relacionados à selva, sobretudo da região de Misiones, na Argentina, onde Quiroga passou parte da vida.
Sua obra mais famosa são os Cuentos de amor de locura y de muerte (1917; título sem vírgula no original), na qual se encontra o célebre conto A Galinha Degolada.
Em 1937, após ter sido diagnosticado com câncer, Quiroga cometeu suicídio, ingerindo uma dose letal de cianureto.
(Publicado originalmente na SAMIZDAT 32)
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