Thursday, October 29, 2009

Concorra a uma câmera fotográfica na compra do guia "Nova York para Mãos-de-Vaca"


Vocês sabem como é: o Natal está chegando e todo mundo gosta de um presentinho, por isto, nós do "Nova York para Mãos-de-Vaca" vamos dar uma de Papai Noel.

A partir do dia 1 de novembro, todos que comprarem o guia eletrônico "Nova York para Mãos-de-Vaca" através de depósito bancário estarão concorrendo a uma (1) câmera fotográfica digital de 10 megapixels, com um cartão de memória de 2 gigas.

O sorteio será realizado no dia 25 de dezembro de 2009 e o ganhador poderá receber o prêmio pessoalmente, caso esteja em NY nesta época, ou através dos Correios.


Importante, leia com atenção o regulamento do concurso:


1 - só serão válidos os depósitos efetuados entre 1 de novembro e 24 de dezembro;

2 - apenas os depósitos bancários na conta corrente abaixo poderão participar.

Transferência bancária no valor de R$ 12,00 (doze reais)

Banco do Brasil
Denise R. Nappi
Agencia: 1537-7
conta corrente: 9481-1

Depois é só mandar a cópia do comprovante de depósito (pode ser foto ou imagem escanerizada) para o e-mail:

maosdevaca@hotmail.com

que a inscrição será automaticamente feita e o número de sua inscrição, bem como o guia eletrônico "Nova York para Mãos-de-Vaca", serão enviados para o seu e-mail, assim que confirmarmos o crédito em conta.
Guarde bem este número, pois será através dele que identificaremos o vencedor.
Paciência, porque transferências interbancárias (DOC) costumam demorar mais para apareceram na conta.

3 - cada comprovante de depósito vale para uma única inscrição. Em caso de duplicidade de comprovantes, valerá somente a primeira inscrição.

4 - o prêmio poderá ser entregue pessoalmente em Nova York (Manhattan) ou através do correio, dependendo da preferência do ganhador. As despesas do envio serão por nossa conta, porém não nos responsabilizamos por qualquer tipo de tributação feita sobre o produto pelas autoridades aduaneiras no Brasil. Caso a câmera retorne por não pagamento das tarifas, ela não será reenviada.

5 - o sorteio será feito através de um software que selecionará aleatoriamente o número do ganhador.

6 - O nome e número do ganhador serão divulgados no blog "Nova York para Mãos-de-Vaca", no dia 25 de dezembro de 2009, às 11 horas da manhã da Costa Leste (EUA).

7 - É proibida a participação de parentes dos organizadores do sorteio.

Participe, boa sorte e espalhe a notícia para seus amigos.

Abraços,

Henry e Denise.

***

- Guia Nova York para Mãos-de-Vaca (depósito bancário) -- R$ 12,00
Importante: Quem quiser adquirir o e-book do Guia Nova York para Mãos-de-Vaca através de depósito bancário, favor ler as Perguntas Frequentes - FAQ

- Guia Nova York para Mãos-de-Vaca e-book (.PDF) -- U$ 4,99

Monday, October 19, 2009

Caminhos para o autor independente

(Este é o terceiro artigo de uma série sobre publicação independente na era digital. Para ler o primeiro texto: Publicação independente ontem e hoje, e o segundo texto: Os desafios da autopublicação)

Nos artigos anteriores sobre publicação independente, já expressei muito claramente o que é, para mim, o principal caminho para o autor independente hoje: a internet.
Publicar e divulgar seus trabalhos literários através da internet é o modo mais barato e eficaz para chegar aos leitores. No entanto, esta não é a única possibilidade, apesar de hoje ser quase inevitável a utilização da rede, em alguma etapa do processo de autopublicação.
Basicamente, há quatro opções principais para o autor independente publicar suas obras: 1 – impressão off-set; 2 – impressão digital; 3 – blog ou sítio literário; e 4 – livro eletrônico.

1 – impressão off-set
Não entraremos nas especificidades técnicas do processo de impressão off-set (principalmente porque não me sinto apto a explicá-las), mas o importante é saber que a escolha por este método dependerá do tiragem desejada para o seu livro.
A impressão off-set só compensa para tiragens superiores a mil exemplares, aliás, muitas gráficas nem aceitam encomendas para tiragens menores. O valor unitário do livro em off-set, em preto e branco, costuma ficar em torno de 3 ou 4 reais, mas pode sair mais em conta para tiragens mais altas, ou seja, para mil exemplares esteja preparado para desembolsar uns 4 mil reais, incluindo, às vezes, a diagramação.
Vale lembrar que este tipo de impressão só vale a pena caso o autor já tenha um número razoável de leitores (ie. compradores) e um local para armazenar os livros. Vender mil livros no Brasil não é nada fácil e nem sempre aquelas pessoas com as quais contamos — parentes e amigos — comprarão um exemplar.
Até poucos anos atrás, esta era a única alternativa existente para um autor independente, o que dificultava bastante a vida pelo alto custo da impressão e pelas centenas de exemplares encalhados em casa.
Para quem pretende publicar deste modo, é fundamental fazer uma boa pesquisa, solicitar orçamentos e, se possível, conversar com autores que já tenham publicado através da gráfica consultada e conferir a qualidade da impressão e acabamento dos livros.

2 – Impressão digital
O processo de impressão digital se aproxima mais do que estamos habituados com a nossa impressora doméstica, resguardando os diferenças de processos e qualidade, com a impressão feita sem a necessidade de fotolitos, como ocorre no caso da impressão off-set.
A grande vantagem da impressão digital é a possibilidade de se imprimir tiragens menores, às vezes de um único exemplar, com um custo relativamente baixo. Há algumas críticas em relação à qualidade da impressão, mas acredito que seja algo pouco distinguível para o leitor leigo e que não afete a leitura.
O autor pode optar por uma gráfica e encomendar tiragens menores, como 100 ou 200 exemplares, ou por uma editora sob demanda, que imprimirá apenas os exemplares encomendados por leitores. Desta maneira, o autor se livra de altos custos iniciais e de pilhas de livros empoeirando no quarto.
No entanto, mesmo assim, uma tiragem de 100 exemplares pode chegar a custar uns 600 reais, já que o preço unitário é um pouco maior do que no caso da impressão off-set. Já no caso de editoras sob demanda, existe um vasto rol de opções e pacotes, desde editoras que não cobram nada, ou muito pouco, para inserir o livro no catálogo, até outras que chegam a cobrar até mais do que custaria uma tiragem off-set. Novamente, uma boa pesquisa é crucial para não cair numa furada.

3 – blog ou sítio literário
Ao contrário dos dois itens anteriores, publicar um blog ou num sítio literário costuma ser de graça.
O blog como conhecemos hoje surgiu em 1998, inicialmente como uma espécie de diários abertos ao público na internet. A primeira reação foi de repúdio, considerando este como um fenômeno adolescente passageiro. Contudo, após o surgimento de vários blogs de influência em 2000 e 2001, a mídia e a crítica começaram a rever o papel dos blogs na cultura digital. Hoje, praticamente quase todo grande veículo de comunicação mantém um ou mais blogs, e dezenas de milhares são criados todos os dias.
A grande vantagem do blog, e este é um dos segredos de imensa popularidade, é a facilidade da interface para publicação e atualização de conteúdo. Com um mínimo de conhecimento de informática, é possível criar uma conta num dos vários provedores de blogs e começar a publicar.
Esta é uma ferramenta que tem sido usada por escritores desconhecidos para dar visibilidade a suas obras, ou para escritores já consagrados manter um contato mais próximo com seus leitores.
Ressalto que este é um instrumento de comunicação que não pode ser desprezado e, por mais que passe por muitas mudanças no futuro, acredito que redefinirá a nossa noção de cultura e contato com os leitores.
Além deste recurso, há vários sítios literários que agregam textos e autores, e que propiciam troca de experiência entre seus participantes e servem de vitrines literárias. Todavia, na minha opinião, estes sítios tendem a servir mais como comunidades de escritores do que uma via de acesso aos leitores, o que não diminui a importância deste tipo de relacionamento.

4 – livro eletrônico
Não sabemos qual será o futuro do livro eletrônico, ou e-book.
Significará o fim do livro impresso? Conseguirá sobreviver à crise do copyright? Finalmente popularizará a leitura entre os brasileiros?
São questões sem resposta, por enquanto. No entanto, para o autor independente, ao lado dos blogs, é a maneira mais barata para conseguir se publicar um livro e talvez ser lido por alguém.
Estatísticas do ano passado, no mercado editorial norte-americano, indicam que houve uma queda significativa nas vendas de livros (algo em torno de 15%), enquanto que as vendas de livros eletrônicos quintuplicaram. Isto pode insinuar duas coisas: a) que o livro eletrônico está realmente começando a se popularizar, graças aos preços mais baixos e à proliferação de dispositivos eletrônicos, como celurares, palm-tops e leitores de e-books, e por isto está se consumindo mais, ou b) que o mercado tem começado apenas agora a investir neste nicho e o crescimento só reflete este influxo inicial de consumidores que estão migrando do livro impresso para o digital.
A vantagem do livro eletrônico é que ele pode ser diagramado em programas simples, como o Microsoft Word, e facilmente convertido em .PDF através de programas baixados gratuitamente na internet.
Um autor que já possua um pequeno público leitor chegará sem dificuldades a 200 ou 300 downloads, se o livro for distribuído gratuitamente, ou até venderá alguns exemplares se o preço unitário for razoavelmente baixo. Tudo isto a custo zero.

Conclusão
Estas quatro alternativas já representam um grande passo para o autor independente, que encontra na internet uma inestimável aliada na hora de divulgar e distribuir sua produção literária.
Obviamente que, ao mesmo tempo em que a publicação digital facilita a vida do autor, ela também dificulta a visibilidade, já que um número muito maior de autores também competirão por seu lugar ao sol.
Por isto, o fundamental é, antes de tudo, um bom conteúdo, uma boa apresentação gráfica e um dedicado trabalho de divulgação.
No entanto, nada disto é garantia de sucesso, mas é um ótimo começo.

ALGUMAS RECOMENDAÇÕES
Editoras sob demanda e/ou impressão digital no Brasil
Grupo Editorial Scortecci
http://www.scortecci.com.br/home.php

Fábrica de Livros
http://www.fabricadelivros.com.br/home.php

Clube de Autores
http://clubedeautores.com.br/

Editoras sob demanda/e ou impressão digital no Exterior
Lulu
http://www.lulu.com/

Café Press
http://www.cafepress.com/cp/info/sell/books.aspx

XLibris
http://www2.xlibris.com/

Bubok
http://www.bubok.pt/

IUniverse
http://www.iuniverse.com/

Sítios Literários
Espaço da Escrita
http://www.espacodeescrita.web2logy.com/

Recanto das Letras
http://recantodasletras.uol.com.br/

Serviços de blog
Blogger
http://www.blogger.com/home

Wordpress
http://wordpress.org/

LiveJournal
http://www.livejournal.com/

(texto publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)

Monday, September 07, 2009

Entrevista sobre a Revista SAMIZDAT, feita por Naldo Gomes


Há alguns meses, Naldo Gomes, estudante de jornalismo da UniSant'ana, entrou em contato comigo solicitando uma entrevista, para um trabalho acadêmico, sobre Indústria Cultural e publicação independente.

Agora esta entrevista pode ser conferida na íntegra no blog abaixo:

http://naldogomes.blogspot.com/2009/09/entrevista-filosofo-novaiorquino-fala.html

Seguem trechos de algumas respostas minhas:

"...não basta escrever bem, é fundamental trazer leitores a tiracolo. Neste sentido, já ser conhecido por um grupo de leitores é uma maneira que o autor possui para conseguir publicar comercialmente seu primeiro livro."
***
"Para um autor não publicado, o primeiro grande inimigo é o mercado literário e sua indiferença. Então, a Revista Samizdat surgiu como uma espécie de provocação, duma prova de que fora das grandes livrarias, longe das bienais, sem ganhadores de Jabuti ou Nobel, sem remuneração, é sim possível fazer literatura de qualidade, por vezes até melhor do que está sendo comercializado e ostentado em listas de mais vendidos."
***
"E assim como na seleção natural, as obras que não se “adaptaram” se extinguiram e, muitas vezes, delas não restou rastro. Não temos como constatar se, por acaso, não havia algum autor melhor do que Pushkin ou Dostoiesvsky na Rússia de suas épocas, pois, se havia, simplesmente se perdeu no tempo. Não podemos reproduzir aquilo a que não se tem acesso e, por isto, a Samizdat, ao apresentar autores canônicos, está sim reiterando o discurso dos vencedores, dos mais adaptáveis, dos que resistiram à prova do tempo."

Wednesday, August 19, 2009

Os desafios da autopublicação

(Este é o segundo artigo de uma série sobre publicação independente na era digital. Para ler o primeiro texto: Publicação independente ontem e hoje)

Frustrações iniciais


Assim como a maioria dos escritores, o meu sonho também já foi o de ser publicado comercialmente. Ao concluir o meu segundo romance, “O Rei dos Judeus”, perfiz a via crucis do autor iniciante: imprimi suas 200 páginas, tirei 3 fotocópias, pus num envelope e mandei para quatro editoras.

Três responderam rapidamente, recusando o original. A Cia das Letras, por exemplo, conseguiu a proeza de responder-me em uma semana, ou seja, das 200 páginas, não devem ter lido nem dez. Por sua vez, a Rocco demorou onze meses para enviar uma resposta, igualmente negativa.
As rejeições, que para alguns autores podem chegar às centenas, fazem parte desta etapa inicial de inserção no mercado. Daquele momento em diante, confesso que fiquei um pouco descrente com a possibilidade de ser “descoberto” em meio a outros milhares de autores que, como eu, também enviavam seus livros para serem avaliados. Aliás, até hoje duvido que a leitura de manuscritos seja o principal processo de seleção de novos autores; pode até acontecer, mas as chances devem ser muito pequenas para valer a pena o tempo e o dinheiro investidos.

O que me restava então?

Eu mesmo publicar meus livros. Fiz orçamentos com várias gráficas, mas o custo era surreal. Para uma tiragem de mil exemplares, seria necessário desembolsar três mil reais. Convenhamos que, para um investimento sem perspectivas de retorno, isto é queimar dinheiro.

Seria necessário vender 100 livros a R$ 30 para recuperar o dinheiro gasto. Para um autor iniciante, vender 100 livros é tão insólito quanto vender 100 mil. Se ninguém conhece o seu talento, ninguém se interessará em conhecer; é o ciclo oposto do sucesso, no qual, quem vende mais, vende mais porque vende mais.

Excluídas as duas opções mais óbvias, restou-me dedicar ao que me parecia ser o mais promissor: o blog.


A internet como forma de autopublicação

Publicar significa “tornar público”. Neste sentido, pouca diferença faz em ter um livro publicado, um blog, ou distribuir na esquina os textos impressos em folha sulfite; tudo isto são formas de publicação, de tornar público o seu trabalho literário.
Poucos autores darão valor a outras formas de publicação se desconsiderarem o princípio básico da literatura — ser lida por alguém.

Desde os primórdios da civilização ocidental, o importante para os escritores/narradores era chegar a seu público, estivesse ele num anfiteatro na Grécia Antiga, estivesse ele na sala duma família burguesa, estivesse ele diante da tela dum computador.

A remuneração foi, por muito tempo, um problema periférico. Vários escritores tiveram de dividir seu tempo entre uma outra ocupação e a Literatura; em alguns casos, até conseguiram sobreviver das Letras, mas sob extrema penúria, enquanto alguns poucos, especialmente durante o século XX, chegaram a fazer fortuna com a escrita. No Brasil, o primeiro a autor a viver exclusivamente de direitos autorais foi Érico Veríssimo, isto apenas na década de 1930.

Este fato nunca comprometeu a qualidade da escrita, nunca significou um demérito para os autores — inclusive, alguns dos mais influentes escritores da modernidade não obtinham renda alguma da escrita, tais quais Franz Kafka e Fernando Pessoa —; apenas recentemente que viver da escrita, ou enriquecer através dela, se tornou uma meta, uma proposta de carreira.

A existência do “escritor profissional” é recente, e aparentemente terá vida breve, se depender da internet.

Por isto que o retorno a uma escrita descompromissada, livre da necessidade monetária me atraiu. Através do blog, eu poderia tornar público meus textos — contos, crônicas, críticas cinematográficas —, sem a mínima necessidade de me enquadrar em parâmetros mercadológicos, sem o compromisso de produzir algo vendável.

No entanto, o número de leitores era relativamente pequeno, isto até 2007.


Ficção X não-ficção

Sempre ouvi relatos de que obras de não-ficção costumam fazer mais sucesso do que ficção. As razões para isto me parecem evidentes: vivemos numa era utilitária, tudo precisa ter uma serventia, o conhecimento precisa ser aplicado em alguma função.

A ficção é inútil por sua própria natureza. Por mais que retrate a realidade, ou apresente problemas sociais, ou instigue mudanças, pelo fato de não ser verídica, ela não tem a mesma serventia que uma obra de não-ficção, que visa estar de acordo com a verdade.

Em 2007, criei o blog “Nova York para Mãos-de-Vaca” (http://www.maosdevaca.com), para falar de coisas baratas na cidade. De maneira espontânea e inusitada, o blog se tornou um sucesso e, um ano depois, virou um livro.

Nenhuma outra obra literária minha chegou nem perto da repercussão deste blog, nem antes, e, por enquanto, nem depois.

Foi mais ou menos nesta época que conheci a lulu.com, uma editora sob demanda que caiu como uma luva para minhas necessidades como autor. Nesta editora, bastava você carregar os arquivos com o texto que o seu livro estava publicado. Não há estoques, não há tiragens iniciais, não há gasto algum para o autor. Simplesmente, o leitor acessa o sítio, encomenda o livro, eles imprimem e mandam pelo correio para a casa do comprador. Melhor, impossível!

E o mais surpreendente para mim foi que, apesar de todo o conteúdo do livro estar disponível de graça no blog, em um ano o guia havia vendido mil exemplares, sendo que 70% ou 80% deles haviam sido de exemplares digitais (e-books).

“Se houve tanta procura, não teria sido melhor tê-lo publicado por uma editora comercial?”, você me pergunta.

Talvez, e até houve um editor que se mostrou interessado. Todavia, numa editora comercial, o autor ganha 10% do preço de capa, ou seja, se um livro custa 30 reais, o autor ganha 3 reais, sendo que o restante do valor se esvai na distribuição, para a livraria, em impostos e para a editora.

Já no caso do autor independente, e este é o meu caso, o lucro inteiro é meu, já que fui eu quem preparou a diagramação do livro e sou eu quem negocia, às vezes, com o comprador. O e-book do guia é vendido a 12 reais, ou seja, para ter o mesmo lucro por uma editora comercial, eu precisaria vender 4 mil exemplares, o que é um número considerável.

Por fim, ao estar à frente da publicação, fica a meu critério quando atualizar o livro, quando aumentar ou reduzir o preço, quanto do conteúdo eu posso distribuir gratuitamente, ou seja, tudo relacionado ao meu livro está sob meu poder de decisão.

E este modelo pode ser reproduzido para ficção?

Possivelmente, mesmo que eu ainda não tenho conseguido. Até o momento, na minha experiência pessoal, a repercussão e o sucesso do meu livro de não-ficção em comparação às minhas obras de ficção reproduziu, em menor escala, a dinâmica do mercado editorial.

Quase todos os meus romances estão publicados independentemente, do mesmo modo que o meu guia de viagem, porém as tentativas de torná-los rentáveis não deram certo e, atualmente, todos eles estão disponíveis de graça na internet.

A não-ficção envolve a questão de credibilidade do autor, no entanto, isto não é tão fácil de se estabelecer para a ficção. Para saber se um autor duma obra de referência sabe do que está falando, basta investigar sua formação e de onde ele está falando, mas para se certificar se um autor de ficção possui competência, é preciso ler a obra inteira, às vezes, várias de suas obras, e este é um esforço que poucos leitores estão dispostos a empreender para um autor desconhecido.


As dificuldades (e algumas soluções) da publicação independente

Assim, a publicação independente reflete exatamente o que ocorre na publicação comercial: não-ficção de autores com credibilidade costuma vender muito mais do que ficção; e ficção de autores desconhecidos tende a encalhar nas prateleiras, isto até estes autores atingirem determinado grau de notoriedade.

Perceba que não estamos realizando nenhum juízo de valor, como se publicação comercial fosse melhor do que a independente, ou vice-versa; estamos apenas falando em magnitude. Uma grande editora comercial tem acesso a canais de distribuição que o autor-editor independente não tem, como livrarias, bancas de jornais e revistas, supermercados, etc. Além disto, a mídia costuma acolher com maior descrença obras independentes, principalmente porque por detrás duma editora comercial há uma equipe interessada em promover seus livros, assessores de imprensa e de marketing.

A dificuldade de distribuição é o calcanhar de Aquiles da publicação independente. Se a obra não chega ao leitor/comprador, é muito improvável que consiga atrair atenção para si.
É neste ponto que a internet acaba servindo como a maior aliada do autor autopublicado.

As editoras comerciais utilizam a internet de maneira pouco eficaz, por enquanto. Para estas editoras, a internet possui o papel simples e único de uma livraria virtual. Você, leitor, acessa o catálogo online da editora, procura seu livro de interesse e o compra, repetindo quase o mesmo procedimento que faria numa livraria física.

Mas o autor independente tem de fazer da internet não apenas a sua livraria, mas a sua vitrine. É através dela que ele pode vender seus livros, mas também é através dela que ele estabelecerá sua reputação como escritor e criará vínculos com seus leitores.

O que eu percebo é que ainda há um certo menosprezo quanto a capacidade de um blog cativar leitores, mas já temos alguns exemplos de autores que se lançaram na internet para depois chegarem ao mercado editorial.

Já no meu caso, o grande problema é encontrar o caminho para me estabelecer como autor independente, sem a necessidade de considerar uma editora comercial como Meca literária.

“É possível consolidar uma carreira literária independentemente do mercado?”, é a pergunta que proponho, ainda sem ter muita certeza de qual é a resposta.

(Publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)

Sunday, July 26, 2009

O Homem Pós-Histórico



O mundo, tal qual conhecemos, não mais existe.
Há apenas um ­homem diante de uma assombrosa descoberta, ­enveredando-se na intrigante busca pelo conhecimento. Um sujeito ­solitário, desenraigado e oprimido por sua condição humana: este é o ­Homem Pós-Histórico.

(...) Sem dificuldades, ele deduz que coisas inanimadas não lhe podem dizer como se chamam, então, ele seria obrigado a dar-lhe nomes convenientes. Dá um nome às pedras, mas são tantas espalhadas pelo caminho que ele percebe que não pode dar nome diferente a cada uma delas, precisava de um título genérico, que servisse para designar todas, independentemente do formato, posição espacial e tamanho. Estabelece a primeira regra de aposição de nomes: para objetos, ele pode conceber um nome coletivo, como para pedras, árvores, montes, rios, flores, nuvens, animais, etc. Porém, ele não pode chamar a Mulher de qualquer coisa, pois ela é especial, individual, ela tem de ter um nome só dela, pelo qual nenhuma outra mulher no mundo, caso haja outra, possa ser chamada. (...)

Ficha Técnica:

Autor:
Henry Alfred Bugalho

Ano:
2009
Edição:
1
Número de páginas:
113

Download Gratuito - Oficina Editora

Sunday, July 19, 2009

O bicentenário de Edgar Allan Poe, a vida e a criação de um mito literário


A vida do escritor


Há exatos duzentos anos, em 1809, nascia, na cidade de Boston, Edgar Poe. Filho de David Poe, Jr. e Elizabeth Arnold Hopkins Poe, ambos atores, Edgar perdeu os pais ainda muito criança; David Poe abandonou filhos e esposa em 1810, enquanto que Elizabeth Poe morreu de tuberculose em 1811.

Apesar de nunca ter sido adotado formalmente, Edgar foi acolhido na casa de John Allan, um rico comerciante de Richmond, e passaria a ser conhecido como Edgar Allan Poe.

Ele viajou com a família de John Allan à Inglaterra em 1815, onde morou por cinco anos. De volta aos Estados Unidos, Edgar Allan Poe se inscreveu na Universidade de Virginia em 1826. Envolvido em dívidas de jogos e com pouco apoio financeiro do pai adotivo, Edgar se viu obrigado a abandonar a carreira universitária e se alistou no exército. Nesta época, já se interessava pela Literatura e, em 1827, lançou sua primeira coletânea de poemas — “Tamerlane e outros poemas” —, que teve repercussão praticamente nula.

Após servir por dois anos, Edgar conseguiu a dispensa com o auxílio de John Allan, caso prometesse se matricular na Academia Militar de West Point. Neste meio tempo, em 1829, ele se mudou para Baltimore e foi acolhido na casa de uma tia e da prima, Virginia Clemm, com quem se casaria alguns anos depois. Foi nesta época que publicou seu segundo livro de poemas.

Em 1830, matriculou-se em West Point, mas foi expulso de lá um ano depois, voluntariamente forçando a corte marcial por mau comportamento. Também havia sido deserdado pelo pai adotivo, por pressões da mais recente esposa dele.

Foi para Nova York, onde lançou um terceiro livro de poemas, financiado com a contribuição de seus colegas de West Point, mas logo retornou a Baltimore, para a casa da tia, por causa de seu irmão, seriamente doente devido a problemas relacionados a alcoolismo.

Ao morrer o irmão, Edgar Allan Poe tentou se dedicar exclusivamente à carreira literária, tornado-se o primeiro autor norte-americano a viver apenas da escrita. No entanto, longe de representar fortuna e sucesso, esta escolha significou para Edgar uma vida repleta de dificuldades e privações. Começou a se dedicar também ao gênero da prosa, publicando alguns contos em periódicos da Filadélfia e Baltimore.

Casou-se, em segredo, com Virginia Clemm em 1835; ela tinha apenas 13 anos, mas declarou ter 21.

Publicou o romance “A Narrativa de Arthur Gordon Pym” em 1838, que foi bem recebido pela crítica. Aquela que é provavelmente sua obra em prosa mais importante, “Contos do Grotesco e do Arabesco”, foi publicada em 1839, mas a recepção foi contraditória.

Virginia, sua esposa, apresentou os primeiros sintomas de tuberculose em 1842, e nunca conseguiu se recuperar totalmente. A doença da esposa acentuou os problemas de Edgar com o álcool. Após ter trabalhado em vários jornais, ele retornou a Nova York e se tornou editor do “Broadway Journal” e, posteriormente, proprietário.

Sou poema mais famoso, “O Corvo”, foi publicado em 1845. Apesar da enorme repercussão, Edgar Allan Poe recebeu apenas 9 dólares pela publicação. Seu jornal faliu um ano depois, quando Poe se mudou para um casebre no Bronx, onde Virginia morreria.
Voltou a Richmond e começou um relacionamento com uma paixão da juventude, Sarah Royster.

Edgar Allan Poe morreu em 1849, vagando pelas ruas de Baltimore, delirante. Apesar de seu falecimento estar evidentemente relacionado ao abuso de álcool, as causas ainda são questionadas.

Influência de Poe

A árdua e trágica vida de Poe, que cedo perdeu os pais, viu o irmão e o amor de sua vida morrerem, teve de superar a pobreza e a inclemente crítica de seus contemporâneos, dificilmente poderia prenunciar a relevância futura de suas obras.

Na verdade, imediatamente após seu falecimento, as controvérsias ao redor de sua personalidade e obras já começaram; primeiro com o obituário do reverendo Rufus W. Griswold, assinado com o pseudônimo de “Ludwig”

“Edgar Allan Poe está morto. Morreu em Baltimore anteontem. Este anúncio poderá sobressaltar muitos, mas poucos se lamentarão. O poeta era bem conhecido pessoalmente ou por reputação, em todo o país. Ele tinha leitores na Inglaterra e em vários países da Europa Continental. Mas ele tinha poucos ou nenhum amigos. Os pesares por sua morte poderão ser induzidos principalmente pela consideração que a arte literária perdeu uma de suas mais brilhantes, porém erráticas, estrelas (...)”. Apesar de vários críticos e escritores se erguerem contra as acusações de Griswold, parecia ser um consenso o fato de que Edgar Allan Poe não era uma pessoa de fácil convivência, adepto de polêmicas e que havia criado muitos desafetos no mundo literário.

Estranhamente, o próprio Griswold foi incumbindo de editar e publicar o espólio de Poe, alegando ter sido este o pedido do autor. Não há nenhum documento que comprove esta afirmação, mas muitos teóricos argumentam que a caracterização de Poe feita por Griswold — de um homem diabólico, sem amigos, bêbado, drogado, problemático em sua vida social e pessoal — foi a principal responsável pelo sucesso póstumo do escritor. A aura demoníaca criada em torno de Poe foi o fator de atração do público leitor norte-americano, que se aproximava da obra de Poe com reverência e temor.

Griswold também redigiu a primeira biografia oficial de Edgar Allan Poe, quando da publicação das obras completas dele. Tal biografia é repleta de inverdades e adulterações, e foi repudiada por quem conhecia o autor, mesmo tendo servido de fundamento para boa parte das biografias subsequentes.

A história de Poe é um dos casos nos quais uma campanha difamatória, ao invés de prejudicá-lo, atuou em seu favor.

Todavia, enquanto o debate era acalorado nos EUA, na Europa, graças às traduções feitas por Charles Baudelaire, Edgar Allan Poe já era acolhido como um autor engenhoso e de grande qualidade. Baudelaire encontrava na obra de Poe muitas de suas próprias características, como o misticismo, o fantástico, o macabro e grotesco, e a busca por respostas filosóficas para questões estéticas e literárias. Foi através das traduções de Baudelaire que a obra de Poe pode ser recebida e influenciar os autores simbolistas e surrealistas.

Na obra “Sobre a Modernidade”, Baudelaire não poupa elogios a Poe, e não hesita em incluí-lo no rol dos grandes artistas da modernidade:

“Lembram-se de um quadro (e um quadro, na verdade!) escrito pelo mais poderoso autor desta época e que se intitula “L’Homme des Foules” (“O Homem das Multidões”)? Atrás das vidraças de um café, um convalescente, contemplando com prazer a multidão, mistura-se mentalmente a todos os pensamentos que se agitam à sua volta. Resgatado há pouco das sombras da morte, ele aspira com deleite todos os indícios e eflúvios da vida; como estava prestes a tudo esquecer, lembra-se e quer ardentemente lembrar-se de tudo. Finalmente, precipita-se no meio da multidão à procura de um desconhecido cuja fisionomia, apenas vislumbrada, fascinou-o num relance. A curiosidade transformou-se numa paixão fatal, irresistível!”
No mundo lusófono, a obra de Poe se refletiria e influenciaria os trabalhos de Machado de Assis, que definitivamente buscou no autor norte-americano sua inspiração para a estruturação e para algumas temáticas de seus contos. Por sua vez, em Portugal, Fernando Pessoa afirmava que Edgar Allan Poe “era uma das figuras literárias mais notáveis da América Inglesa”. Ambos, Machado de Assis e Pessoa, traduziram poemas de Poe para o português.

Enfim, Jorge Luis Borges, um dos autores hispano-americanos mais influentes do século XX, renovou o gênero conto ao ressuscitar questionamentos, técnicas, ambientações, sutilezas já utilizadas ou levadas à perfeição por Poe, como o embuste, o raciocínio lógico, o macabro e fantástico, o enigmático, a criptografia, a antiguidade histórica e povos exóticos ou desaparecidos.

A controversa figura de Edgar Allan Poe, que sofreu para poder viver de sua pena, converteu-se numa das mais ricas fontes de inspiração para a literatura vindoura. E o grande segredo disto residiu, principalmente, na transformação de um atormentado indivíduo real em um personagem bizarro e assustador, que toma vida todas as vezes que um leitor entra em contato com sua obra.

A obra de Poe

Em vida, Edgar Allan Poe era conhecido como um competente, porém cáustico, crítico e ensaísta. Publicou resenhas e críticas literárias em inúmeros periódicos. Participou de polêmicas e embates com grandes autores e ensaístas, atacava ferozmente o “Transcendentalismo” de Emerson e Thoreau. Também viveu para presenciar, alguns anos antes de seu falecimento, o arrebatador sucesso de poemas como “O Corvo” e “Annabel Lee”.
Mas, sem dúvida, a principal contribuição de Poe está na sua obra prosaica, em seus contos e em seu único romance “A Narrativa de Arthur Gordon Pym”.

A obra de Poe tende a gravitar ao redor de alguns temas bastante específicos, como:
- a Morte (“A Queda da Casa de Usher”, “A Máscara da Morte Vermelha”, “O Gato Preto”, “O Enterro Prematuro”, “Os Fatos no Caso do Sr. Valdemar”, “Uma Revelação Mesmérica”, entre outros;

- investigações policiais (“Os Assassinatos da Rua Morgue”, “O Mistério de Marie Rôget”, “O Coração Delator”, “Tu és o Homem”, “A Carta Roubada”)

- eventos marítimos bizarros ou fantásticos (“A Narrativa de Arthur Gordon Pym”, “Mensagem numa Garrafa”, “Descida ao Maelström”)


Além disto, há vários outros textos satíricos, de humor, enigmáticos (como “O Escaravelho de Ouro”) e profundamente metafísicos. Edgar Allan Poe é considerado como um dos precursores da Ficção Científica, por causa de contos como “O Embuste do Balão”, “A Aventura sem par de um tal Hans Pfaall”. Poe é também considerado como o primeiro autor de ficção policial, ao conceber o antológico personagem Auguste Dupin. Tornou-se um ícone da literatura de Terror e Gótica.

Paralelamente aos mestres russos e franceses, como Pushkin, Tchekov e Maupassant, Edgar Allan Poe instaurou as bases do conto moderno, produzindo alguns dos textos mais perfeitos e emblemáticos do gênero.

No campo da poesia, Poe foi considerado como cerebral demais, apesar de ainda ser tomado como um autor do Romantismo. Para o ele, era muito mais importante a forma e a sonoridade dos versos do que o conteúdo, no entanto, isto nunca significou um desequilíbrio entre forma e mensagem na obra poética de Poe.

Pessoalmente, acredito que no corpus literário de Poe existem algumas das mais fundamentais obras-primas da escrita, mas há uma qualidade díspar entre os textos. Quem se aventurar a ler a obra completa do autor se deparará com obras incomparáveis, mas também com outras de difícil acesso, ou até desinteressantes.

Definitivamente, Edgar Allan Poe é leitura obrigatória para qualquer um interessado em Literatura. Uma obrigação repleta de prazeres, surpresas e assombro.

A comemoração do bicentenário de nascimento de Poe

Durante todo o ano de 2009, em várias cidades do leste dos EUA, comemora-se o bicentenário de nascimento e o centésimo sexagésimo aniversário de morte de Edgar Allan Poe. Por todo o lugar que o escritor viveu, estão sendo organizados eventos, como palestras, recitação de poemas e debates em sua homenagem, mas principalmente em Richmond, Boston e Baltimore, cidades nas quais ele passou a maior parte da vida.

Inclusive, em Baltimore, no dia 10 de outubro de 2009, está sendo preparado um funeral em homenagem a Poe, que contará com atores representando os papéis de amigos e rivais do autor.

Nas ligações abaixo, há parte da programação das comemorações do bicentenário de nascimento de Edgar Allan Poe.

Poe Bicentennial - Baltimore - http://www.poebicentennial.com/index.html
Poe Revealed 1809-2009 – Richmond - http://www.poe200th.com/index.php
The New York Times – Edgar Allan Poe at 200 (Slideshow)
http://www.nytimes.com/slideshow/2009/01/16/books/eapoe-SLIDE-SHOW-01-17-2009_index.html

Para saber mais:
- BAUDELAIRE, Charles, Sobre a Modernidade. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1996.
- Baudelaire and the Arts, Translations: Baudelaire, translator of Edgar Allan Poe
http://dl.lib.brown.edu/baudelaire/translations1.html
- The Literature Network – Edgar Allan Poe
http://www.online-literature.com/poe/
- PEEPLES, Scott, The Afterlife of Edgar Allan Poe. Boydell & Brewer, 2007.
http://books.google.com/books?id=NyEumvZL1QMC&printsec=frontcover
- Poe Museum
http://www.poemuseum.org/poes_life/index.html
- Wikipédia – Edgar Allan Poe
http://en.wikipedia.org/wiki/Edgar_Allan_Poe
- Wikipédia – Poe’s obituary
http://en.wikisource.org/wiki/Death_of_Edgar_Allan_Poe
- Wikipédia – Rufus Wilmot Griswold
http://en.wikipedia.org/wiki/Rufus_Wilmot_Griswold
- The works of Edgar Allan Poe, in four volumes. Vol I, with Memoirs by R. W. Griswold. New York: W. J. Widdleton, Publisher, 1865.
http://books.google.com/books?id=Cy4CAAAAQAAJ&printsec=titlepage

(Publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)

Saturday, July 18, 2009

Publicação independente ontem e hoje

(Este é o primeiro artigo de uma série sobre publicação independente na era digital)

A legitimação do mercado literário


Todo o mundo, ao começar a escrever seu primeiro livro, tem em mente o esquema clássico de publicação: autor => editora => livraria => leitor.

Quase ninguém questiona este modelo ao tentar ingressar na carreira literária e, para muitos, um autor que não seja publicado por uma editora comercial — ou uma “editora de verdade” — não merece ser lido.

O processo de concluir um livro, enviá-lo para ser avaliado por uma editora, ser aceito, assinar o contrato e chegar às livrarias é a primeira legitimação dum autor, é o primeiro grande funil entre os escritores. Entre os pretendentes a escritores e os poucos que fazem parte do catálogo de uma editora, há um cruel processo de triagem que nem de longe contempla o valor artístico ou o mérito literário dum livro.

O que estes autores, e os leitores também, parecem se esquecer é que as editoras e livrarias são empresas como outras quaisquer. Concordo que no interior dos bens materiais (os livros) estejam contidos valores imateriais (o que está escrito, os ideais, as teses, a concepção de mundo do autor), no entanto, o importante é que este bem material seja vendido; o objetivo principal do mercado editorial é vender livros, gerar lucro.

Por isto, pouco importa o valor literário duma obra, se ela não apresentar perspectivas de lucro.

Podemos dizer, então, que ser publicado por uma editora é, de fato, uma legitimação?

Sim, evidentemente: é a legitimação de que alguém dentro duma editora considerou seu livro vendável.
Nada mais do que isto.

É óbvio que passar por esta etapa inicial conduz a outros patamares de legitimação. A União Brasileira de Escritores – UBE só considera, por exemplo, escritor aquele que possui pelo menos um livro publicado. Neste sentido, escritores talentosíssimos que publicam na internet ou mesmo para si próprios não passam de meros diletantes.

Também é muito improvável que uma publicação de renome, como jornais ou revistas, dedique alguma atenção a autores não publicados. E não podemos nos esquecer dos grandes prêmios literários, que geralmente são concedidos aos melhores livros do ano, ou a autores com algum tempo de estrada e que já possuem vasto currículo literário.

Isto nos leva a concluir que apenas após passar no quesito vendável um livro pode ser considerado literário.

A publicação independente

Apesar do domínio que exerce, a existência do mercado editorial é algo relativamente recente, se analisarmos a História da escrita e da publicação. As primeiras evidências de escrita datam de 3500 antes de Cristo, enquanto que a forma do livro como códice ocorreu por volta do século I a.C.

Durante muito tempo, a escrita e o acesso a pergaminhos, manuscritos ou livros se restringia à classe sacerdotal e a alguns monarcas. O processo de produção de um livro era lento e dispendioso, isto até o advento da imprensa, invenção de Johann Gutenberg, em 1450. Esta foi a grande revolução na escrita e tornou o livro, se não acessível ao público, pelo menos viável comercialmente.

No entanto, apenas no século XIX, auge da era industrial, que a publicação de livros conseguiu reduzir drasticamente os custos de produção e abrir as portas para a cultura de massas.
O controle da cultura deixou as mãos do clero e de patronos aristocratas para pequenos editores ou grandes associações que impulsionaram a publicação de livros rumo ao mercado de consumo.

Então, a figura do autor publicado por uma editora (como Victor Hugo) dividiu espaço, pela primeira vez, com o autor independente, ou seja, aquele que custeia do próprio bolso a publicação de seu livro (como quase todas as obras de Friedrich Nietzsche), e com o autor-editor, aquele escritor que assume também o papel de editor de seus próprios livros e periódicos (como Balzac, Dickens e Edgar Allan Poe).

Estes três modelos ainda vigoram hoje em dia, mas as editoras comerciais acabaram se sobressaindo e obscurecendo os outros dois.

E como se caracteriza o autor independente hoje?

Assim como predominou no século XX, a publicação independente é tida como a via de acesso a uma editora comercial, ou apenas como publicação por vaidade.

No primeiro caso, o autor custeia a primeira tiragem de seu livro, na expectativa de chegar a alguns leitores, mas, principalmente, de atrair a atenção de editores. Este foi o percurso realizado por quase todos os grandes autores contemporâneos, os quais através de pequenas tiragens iniciais provaram a qualidade e a viabilidade comercial de suas obras.

No segundo caso, temos o escritor amador que encontra na publicação independente a possibilidade de suprir o desejo de ver seu livro impresso e vendido (ou distribuído gratuitamente) para amigos e parentes. Não há grandes pretensões comerciais ou literárias, apenas a necessidade de ter em mãos o resultado de meses de trabalho.

Todavia, ainda há um terceiro caso, e que resgata uma das propostas do século XIX, do autor-editor, que encontra na publicação independente uma via alternativa para consolidar sua carreira.

O autor-editor no mundo digital

A informatização se caracteriza como a maior inovação na publicação de livros desde Gutenberg. Nunca antes foi tão fácil, barato e rápido de se produzir e distribuir informação. A internet rompeu todas as barreiras geográficas e materiais do processo de publicação.

Por um lado, tem sido possível armazenar todo o tipo de obras, de todas as épocas, em todos os idiomas. Obras raras existentes apenas em bibliotecas pessoais ou livros pouco conhecidos podem ser encontrados sem dificuldades. O critério mercadológico deixa de predominar, e o valor histórico ou literário volta a ser mais importante. Sítios como os do Projeto Gutenberg (www. gutenberg.org), do Internet Sacred Texts Archive (http://www.sacred-texts.com/), do Perseus Digital Library (http://www.perseus.tufts.edu/hopper/), do Domínio Público (http://www.dominiopublico.gov.br/), entre vários outros, disponibilizam obras de domínio público, muitas que não são reeditadas há décadas por causa da pouca demanda.

Por outro lado, a internet permitiu, primordialmente através dos blogs, o nascimento e a divulgação de novos escritores, que encontraram na publicação virtual um acesso imediato a seus leitores, pulando o longo e excludente percurso que passa pelas editoras e livrarias. O autor da era digital fala diretamente para seu público e é, deste modo, igualmente autor e editor de seus textos, já que está sob seu poder determinar qual conteúdo será apresentado.

Além disto, a impressão digital tornou possível a publicação de livros em pequenas tiragens, o que facilitou a vida do autor independente na hora de distribuir seus livros em menor escala.
Contudo, mesmo com o surgimento de alguns autores de renome através da publicação e divulgação pela internet, o autor independente ou não publicado ainda é recebido com desconfiança em comparação àqueles publicados por editoras comerciais.

A falsa legitimação de qualidade das editoras ainda continua sendo a principal legitimação literária, mas que talvez esteja em vias de extinção. Mais do que nunca, a internet tem representado uma forte ameaça à onipresente cultura de massas.

(Publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)

Monday, June 22, 2009

Tamanho não é .DOC


Acabou de ir ao ar o livro de microcontos escritos pelos membros da comunidade "Escritores - Teoria Literária". Os microcontos foram publicados no twitter entre os meses de maio e junho.

Autores:
Erik Kurkowski Weber
Fabio Cunha P. Coelho
Henry Alfred Bugalho
Rafael T. Okada
Wilson Gorj

scribd - http://www.scribd.com/doc/16678651/tamanhodocumento

calámeo - http://en.calameo.com/read/0000022388dabc23135eb

recanto das letras - http://recantodasletras.uol.com.br/e-livros/1662440

Publicado por: Oficina Editora

E em julho haverá uma segunda rodada de microcontos!

Friday, June 19, 2009

Fluxo de consciência, a literatura dentro da mente

Os mistérios da mente e dos pensamentos sempre despertaram a atenção dos sábios e filósofos, desde a Antiguidade grega e das primeiras investigações teóricas sobre o Homem e o Universo; no entanto, apenas durante os séculos XIX e XX que a ciência se debruçaria, primeiro cautelosamente, depois com um fervor extraordinário, sobre as questões da Psicologia. É neste momento, na virada do século, que pesquisadores basilares como Wilhelm Wundt, William James, C. G. Jung e, principalmente, Sigmund Freud consolidaram suas carreiras e apontaram os rumos desta nova ciência que se engendrava.

A Psicologia e suas ramificações influenciaram vários estratos da sociedade e da cultura, e encontraram um solo bastante fértil na Literatura. Imediatamente, os autores deste período de ebulição científica trouxeram para dentro de suas obras conceitos psicológicos e inverteram o eixo que predominava anteriormente, de eventos externos estimulando os personagens à ação para motivações internas compelindo-os a uma tomada de atitude.

Raskolnikov e sua intensa vida mental são um grande exemplo desta apropriação; Dostoievski utiliza com maestria o conhecimento científico de seu tempo para desenvolver um personagem psicologicamente complexo e intrigante, divido entre a certeza de sua superioridade intelectual e moral e o jugo da medíocre vida comunal.

Dostoievski foi, aliás, um dos primeiros autores a utilizar, ainda embrionariamente, o que ficaria conhecido como “fluxo de consciência”.

As características do fluxo de consciência

O conceito de “fluxo de consciência” foi cunhado por William James e se referia ao turbilhão de pensamentos na mente consciente, isto é, toda a gama de impressões, sensações, raciocínios que se desenrolam em nível superficial.

A definição básica de William James é a seguinte:

O primeiro e mais importante fato concreto que cada um afirmará pertencer a sua experiência interior é o fato de que a consciência, de algum modo, flui. “Estados mentais” sucedem-se uns aos outros nela. Se pudéssemos dizer “pensa-se”, do mesmo modo que “chove” ou “venta”, estaríamos afirmando o fato da maneira mais simples e com o mínimo de presunção. Como não podemos, devemos simplesmente dizer que o pensamento flui. (JAMES, William. The Stream of Consciousness. 1892)

E William James ainda enumera quatro características deste fluxo mental: 1 – cada estado tende a ser parte duma consciência pessoal; 2 – dentro de cada consciência pessoal os estados estão sempre mudando; 3 – cada consciência individual é sensivelmente contínua e 4 – é interessada em algumas partes de seu objeto em detrimento de outras, e acolhe ou rejeita – escolhe-os, numa palavra – o tempo todo.

A grosso modo, o que se propõe é que a consciência está em constante mutação, ininterruptamente, concentrado-se sobre determinadas impressões e sensações, enquanto ignorando outras.

A primeira aplicação óbvia na Literatura é através dum narrador em primeira pessoa, que expõe seus pensamentos e vivências numa sequência contínua e abrupta, alternando seu foco de acordo com a corrente mental.

A revolução joyceana

Poucos autores enfeixaram tanto as propriedades do mundo moderno quanto James Joyce. Este autor irlandês, que viveu grande parte de sua vida no exílio, introduziu na Literatura um novo universo de possibilidades estéticas, temáticas e linguísticas, digerindo a tradição e abrindo as portas para toda uma geração futura, que encontraria em Joyce a inspiração para inovar.

E o grande diferencial de Joyce foi justamente a apropriação do “fluxo de consciência” como técnica narrativa, que também ficaria conhecido como “monólogo interior”, quando os pensamentos do personagem são apresentados, de maneira ilógica, ao contrário do solilóquio, quando um personagem expõe oral e logicamente suas reflexões.

Na antologia de contos “Dublinenses”, James Joyce realizou os primeiros experimentos com esta forma, mas ainda com timidez.
Mas foi em seu primeiro romance, “Retrato do artista quando jovem”, que narra a juventude de Stephen Dedalus e seu processo de ruptura com a Igreja Católica e com o provincianismo dublinense, que Joyce realmente desenvolveu a sua técnica de “fluxo de consciência”, cujo ápice se deu no romance “Ulisses”, publicado em 1922.

Numa espécie de releitura do enredo da “Odisseia” de Homero, “Ulisses” é a história do anti-herói Leopold Bloom, que vaga pelas ruas de Dublin atormentado pela suspeita de que sua esposa o trai, mas sem coragem para tomar atitude. Nesta obra, James Joyce apela para vários recursos narrativos, desde o monólogo interior, passando por um narrador onisciente em terceira pessoa, até a estrutura dramatúrgica. O autor transita por estes vários registros estilísticos, eliminando os limites do gênero romanesco, e também une a fala da rua e dos bares ao mais sofisticado discurso teórico.

“Ulisses” tenta abarcar a totalidade do mundo através da linguagem, e isto passa necessariamente pela dissecação da mente dos personagens. Três momentos antológicos do romance são também três grandes monólogos interiores, ou “fluxos de consciência”: o primeiro deles ocorre no terceiro capítulo e se passa na mente de Stephen Dedalus (o mesmo personagem de “Retrato do artista quando jovem”); o segundo deles no quarto capítulo, no qual Leopold Bloom é mostrado em sua vida cotidiana, despertando e saindo para comprar o café-da-manhã; e o terceiro deles é o gigantesco monólogo interior, sem sinais de pontuação e com pouquíssimos parágrafos, que encerra o livro e se trata dos pensamentos da esposa de Leopold, Molly Bloom.

O biógrafo Richard Ellmann, em seu livro “James Joyce”, afirma que o desenvolvimento da técnica joyceana de “fluxo de consciência” ocorreu acidentalmente. Joyce era professor de inglês em Triste, na Itália, e um de seus alunos, o também escritor Italo Svevo, tinha dificuldade para pontuar suas redações em inglês, escrevendo assim um texto contínuo. Joyce teria achado engraçada esta peculiaridade, mas logo percebeu as implicações literárias duma estrutura como esta, adotando-a em sua escrita quase imediatamente.

Outros fluxos de consciência

Paralela e simultaneamente a Joyce, vários outros autores também mergulhavam neste turbilhão interior das psiques de seus personagens, fossem eles influenciados pelos trabalhos de Freud, Jung ou Henri Bergson.

Na França, o grande expoente foi Marcel Proust e sua monumental obra “Em Busca do Tempo Perdido”, dispersa em vários volumes e relatando, de maneira bastante pessoal e autobiográfica, as rememorações do narrador, Marcel, desde a infância até a idade adulta.
Na Inglaterra, Virginia Woolf experimentava novas formas narrativas através de enredos cotidianos ambientados nos círculos da alta classe média britânica. Enquanto que, nos EUA, o fluxo de consciência apareceria nos trabalhos de Faulkner e T. S. Eliot.

O impacto desta técnica narrativa foi avassalador. Ela se disseminou entre os autores das gerações seguintes, perpassando todo o movimento modernista da década de 20 e chegando até os nossos dias, acolhida pelos arautos da pós-modernidade.

A lista de autores que namoraram “o fluxo de consciência” é imensa: Albert Camus, Hermann Hesse, Salinger, Samuel Beckett (herdeiro direto de Joyce), William Burroughs e vários outros autores da geração beatnik, Milan Kundera, Julio Cortázar e alguns outros escritores do Boom latino-americano.

O Brasil também possui os seus representantes, como Clarice Lispector, Paulo Leminski, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa, para citarmos alguns, dentre inúmeros autores contemporâneos, que se munem deste mergulho ao íntimo do ser humano para expressarem o assombro dum sujeito cindido, desorientado, esmagado pela rapidez da era digital.

Para saber mais:

- ELLMANN, Richard, James Joyce. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1989.
- JAMES, William, The Stream of Consciousness. 1892. http://psychclassics.yorku.ca/James/jimmy11.htm
- JOYCE, James, Dubliners. New York: Dover Thrifts Editions, 1991.
Portrait of the artist as a young man. New York: Penguin Books, 1982.
Ulysses. New York: Random House, 1946.
- Wikipédia: stream of consciousness - http://en.wikipedia.org/wiki/Stream_of_consciousness_(narrative_mode)

(Publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)

Sunday, May 10, 2009

Entrevista para o site "Contos Fantásticos"

Entrevista: Henry Alfred Bugalho

Henry Alfred Bugalho, homem culto e articulado, já disponibilizou alguns contos para publicação aqui mesmo em Contos Fantástico e agora ele nos concede uma entrevista para falar um “pouquinho de um tudo”: livros, projetos seus e de amigos, revistas digitais, as possibilidades da literatura na Internet, a atual condição da literatura fantástica no Brasil, o mercado excludente das grandes editoras... e por aí vai.

Esta entrevista foi concedida em 15/04/2009

Henry, vamos iniciar a nossa entrevista com a pergunta padrão. Quem é Henry Alfred Bugalho?

Esta é uma pergunta profudamente filosófica... (risos)

Acho que todos nós passamos a vida procurando uma resposta para esta questão e, no decorrer de nossa existência, fazemos escolhas que tentam nos encaminhar em direção a uma solução. Não somos uma coleção de nossos gostos, nossas idiossincrasias, nem das nossas conquistas ou derrotas: somos algo para além, algo de indefinido, que não pode ser verbalizado. Bem, uma pergunta filosófica exigia uma resposta filosófica, o que já diz um pouco sobre mim, que me graduei em Filosofia, trabalhei numa videolocadora e numa livraria, e atualmente moro em Nova York, fazendo duas de minhas paixões: escrever e cuidar de cães.

Em agradecimento a sua disponibilidade e paciência para a nossa entrevista, vamos fazer um “Merchandising” gratuito para você. Como surgiu a idéia e a consequente repercussão do "Guia Nova York para mãos de vaca”.

O blog e, posteriormente, o guia "Nova York para mãos-de-vaca" é meio que uma anomalia no conjunto da minha obra. Foi o meu primeiro trabalho de não-ficção, sem relação alguma com literatura, e visava falar um pouco sobre a cidade e como se virar nela com pouca grana. Foi um trabalho que começou de maneira despretenciosa, através do blog, e que logo escapou de controle. Além disto, foi uma evidência de que, quando o leitor gosta de algo, ele faz questão de compartilhar deste gosto com as outras pessoas. A propaganda boca-a-boca foi fundamental para o sucesso do blog e do guia, e hoje não é incomum, quando encontramos algum brasileiro nas ruas ou no metrô de NY, descobrir que eles já conheciam o trabalho. Isto é algo bastante recompensador. É um projeto que ocupa bastante parte do meu tempo, pois eu e minha esposa sempre tentamos trazer conteúdos novos e conferir as dicas dadas por leitores. E este é um dos segredos da popularidade do maosdevaca.com, pois conquistamos credibilidade ao apresentarmos sempre dicas que foram verificadas por nós.

No Recanto das letras, site muito prestigiados pelos escritores amadores, o seu acervo de contos transita por vários gêneros: Terror, Ficção Científica, Insólitos e outros. Afinal, qual gênero lhe dá mais prazer de escrever?

Na minha opinião, escritor é quem escreve. Apesar de compreender a predileção que certos autores destinam a um gênero, ou a um estilo, eu defendo que o escritor tem de ser capaz de produzir obras de todos os gêneros. E esta foi uma decisão consciente que fiz, quando iniciei a redação do romance "O Covil dos Inocentes", que foi escrito diretamente num blog e dum gênero que eu não dominava (romance policial). Desde então, tento escrever contos dos mais variados gêneros - ficção científica, terror, suspense, policial, histórico, regionalista, etc. -, apenas como um modo para testar meus limites e tentar expandir o meu domínio sobre a escrita. Por durante quase dois anos, organizei uma oficina literária virtual com uma proposta semelhante, a cada 15 dias era proposto um tema e/ou um gênero, e os escritores da oficina tinham de se esforçar para produzir algo. Foi uma experiência bastante interessante e me obrigou a escrever muito nos últimos meses.

Quais são os projetos relacionados a literatura (sites, blogs, livros, e-books) que você está envolvido atualmente?

Os dois projetos que mais consomem o meu tempo são os blogs maosdevaca.com (não-ficção) e a Revista SAMIZDAT (literário). Também estou trabalhando num romance, no qual espero condensar um pouco do que disse acima: o livro terá várias partes interligadas, mas cada uma de um gênero diferente - aventura, romântico, terror... Por fim, há a Oficina Editora (www.oficinaeditora.org), que é uma editora virtual que publica e-books de autores inéditos. O acervo ainda é pequeno, mas é através dela que publico a Revista SAMIZDAT, alguns romances meus para download gratuito, e alguns projetos coletivos com outros autores.

A Revista Samizdat está no seu 15˚ número. Como surgiu a idéia deste periódico digital e quais são os temas que ele aborda?

A Revista SAMIZDAT (www.revistasamizdat.com) surgiu a partir da oficina literária que já mencionei. Tínhamos uma vintena de bons autores, produzindo textos de qualidade, mas encerrados numa espécie de conclave. Então, chegou uma hora que perguntei aos participantes: "E por que não divulgamos este trabalho num e-zine? "Muitos toparam e este foi o nascimento da SAMIZDAT. A princípio, era tudo muito tosco. Eu não tinha noção de diagramação e, ao término de um mês, a edição não era nada mais que um arquivo do Word com capa. Mas, aos poucos, o trabalho foi se aperfeiçoando e hoje é algo sofisticado e que nos envaidece bastante.

A Revista SAMIZDAT é razoavelmente livre nos temas e nos gêneros que publica. Cada autor tem autonomia para selecionar parte do conteúdo, e temos seções para resenhas literárias, contos, teoria literária, poesia, crônica, traduções, autores em língua portuguesa, autores convidados e entrevistas. No entanto, a cada 4 meses, nós preparamos uma edição especial, contemplando um gênero literário. Já publicamos edições especialis de Ficção Científica, Terror, Erótico e, agora em maio, sairá a de Humor.

“Samizdat” é um nome no mínimo estranho, para não dizer anti-comercial. Quem pensou nele e por que?

"Anti-comercial"? Não tinha pensado nisto, mas vem bem a calhar. (risos)

Na verdade, o nome da revista foi decidido através duma votação e SAMIZDAT foi considerado o "menos pior". Coincidentemente, o nome foi proposto por mim após ter lido um texto sobre o autor russo Alexandr Soljenítsin, e como ele, para burlar a repressão do regime comunista na União Soviética, publicava seus livros em publicações clandestinas, chamadas samizdats (que nada mais significa do que "autopublicado", em russo). As samizdats eram distribuídas de mãos em mãos, através de cópias datilografadas, mimiografadas ou manuscritas, e era obrigação do leitor passar as samizdats adiante.

Para mim, este conceito fazia sentido não apenas num país ou numa época repressora, mas também em nossa era digital, dividida em parte por um mercado literário excludente, que trata os autores iniciantes como restolho, em parte pela legião de blogs e autores espalhados pela internet, que também são excludentes, posto que muitos blogs não têm leitor algum. Enfim, a Revista SAMIZDAT representaria um meio de driblar a indiferença da Indústria Cultural e conquistar leitores, cuja missão seria divulgar e passar adiante esta mensagem.

Sei que estarei te colocando numa sinuca de bico, mas a revista “Samizdat” agrega um número expressivo de bons escritores amadores. Quais você considera ( tirando você mesmo ) como nomes que merecem uma chance no mercado editorial brasileiro?

Esta é realmente uma pergunta complicada, principalmente porque há autores de vários estilos, gêneros e propostas literárias na Revista SAMIZDAT. Sem dúvida que tenho minhas predileções, autores com os quais me identifico mais, ou que me dizem mais através do que escrevem. Gosto muito do que o Volmar Camargo Jr. escreve, o José Espírito Santo é dotado duma inventividade extraordinária e a Maristela Deves possui uma escrita que me faz lembrar da minha própria. É claro que há a dupla portuguesa Joaquim Bispo e Maria de Fátima Santos que são hors concour, com uma maestria invejável. Mas eu acredito que qualquer um dos autores da SAMIZDAT tem o potencial e a qualidade para ingressar no mercado, alguns já estão mais bem encaminhados (como a Mariana Valle, já publicada), enquanto outros ainda têm uma longa estrada de desafios pela frente.

Quando eu entrei em contato, via e-mail, você me disse que o projeto que atualmente mais lhe dá satisfação é a publicação da “Samizdat” e que, depois de tanto tempo, você está colhendo frutos de tal empreitada. Em que sentido você coloca a questão?

A Revista SAMIZDAT não visa lucro, então este não é um aspecto que nos importa. Todos publicam espontaneamente e participam na medida de suas capacidades: ninguém ganha nada, nem os autores, nem os revisores, nem quem faz o design da revista (isto é, eu). Este desapego é fundamental, na minha concepção, pois os nossos esforços podem se concentrar no que vamos doar, e não no que vamos receber. Por outro lado, a Revista SAMIZDAT tem conseguido atingir o nosso objetivo inicial - chegar aos leitores. As edições já foram lidas por mais de 10 mil pessoas e o blog já foi acessado por mais de 20 mil leitores. No Brasil, onde vender mil exemplares dum livro é uma vitória, podemos dizer que já obtivemos uma grande conquista ao reunirmos autores de gabarito, numa publicação periódica e, acima de tudo, termos leitores fiéis.

No “Blog do Escritor” você discorre sobre um assunto muito interessante e pertinente a respeito da publicação “on-line” de livros (e-books) digitais por escritores ainda desconhecidos em contraponto ao excludente mercado editorial brasileiro? Você poderia nos falar novamente sobre este assunto aos visitantes do site Contos Fantásticos?

A verdade é que o mercado editorial brasileiro é muito acomodado. Nenhum editor está interessado em procurar por um talento, cultivá-lo e torná-lo um autor de sucesso. O sonho de toda editora brasileira é encontrar um novo Paulo Coelho sem ter de levantar a bunda da cadeira, ou seja, eles querem um autor pronto e, mais do que isto, que seja garantia de sucesso. É o mesmo dilema do mercado de trabalho: "como é que vou conseguir experiência se ninguém me dá uma oportunidade de emprego?

"Os novos autores brasileiros estão lançados no abismo da indiferença, ignorados totalmente pelo mercado que deveria investir neles, e longe da vista dos leitores. O que acontece é que quase todo mundo tem o "complexo do best-seller". Todo autor iniciante acha que venderá milhões, por isto, distribuir gratuitamente suas obras (contos, poemas, romances...) é uma heresia. Eles esperam que uma editora os publique, para então enriquecerem.

Demora um tempo até a ficha cair e se perceber que são poucos os que ficam ricos com literatura e que um autor tem de se dar por satisfeito se chegar a vender 200 exemplares do seu livro. Literatura é um artigo de luxo, e os leitores vão optar por autores consagrados, na hora de comprar um livro, do que por um autor desconhecido. É um círculo vicioso - o que vende mais vende mais porque vende mais. Enquanto isto, os autores estreantes ou desconhecidos se digladiam por migalhas.

No entanto, a internet tem se tornado a porta de entrada para muitos autores inéditos ao universo da literatura. Um blog de sucesso, ou um e-book baixado por milhares de leitores, pode representar justamente aquilo que os editores sempre esperaram: que o próximo autor de sucesso caia no colo deles (e trazendo leitores junto). A internet pode servir de vitrine para o autor que possui talento, disciplina e algo interessante para dizer. Por outro lado, pode também significar a ruína do autor medíocre.

Além disto, acredito que uma revolução ainda está para acontecer quando se trata de remuneração. Estamos acompanhando a agonia da indústria fonográfica e cinematográfica por causa da pirataria digital. Os próximos a sofrer disto serão as editoras (é muito fácil encontrar os livros mais vendidos para download) e será preciso descobrir uma alternativa para enfrentar a pirataria. Duvido que esta solução passe por um endurecimento dos direitos autorais; na minha visão, penso que os autores terão mais liberdade, maior independência, e encontrarão na auto-publicação, ou em edições sob demanda, um caminho para a consolidação de suas carreiras. Esta descentralização (longe dos grandes conglomerados editoriais) me parece ser a nova via da Literatura.

Alguns blogs e sites como Contos Fantásticos, por exemplo, preferem filtrar os contos que publica enquanto outros deixam qualquer pessoa publicar o que lhes der na veneta. Você acha que tal liberdade ajuda ou atrapalha no processo de atrair “olheiros” das editoras ou, na sua opinião, “caça-talentos” e “olheiros” são figuras que só existem no futebol?

Eu não acredito muito nesta figura do "olheiro". Pelo que sei, já existiram caça-talentos na história da literatura brasileira, mas hoje como a oferta de autores é muito maior do que a demanda, os editores podem fazer vista grossa e aguardar até que os melhores (ou os mais vendáveis) se destaquem. É inegável também que existe muito lixo. A internet é, no fundo, um imenso lixão, no qual, às vezes, se soubermos como procurar, podemos encontrar algumas pérolas. Esta informação desenfreada é um desestímulo quando se trata de procurar conteúdo de qualidade. Contudo, a comunidade virtual possui seus mecanismos para separar o joio do trigo - como o pagerank do Google, ou o technorati - e felizmente, de um modo um tanto misterioso, o que há de bom acaba se sobressaindo, em algum momento.

Neste sentido, o Contos Fantásticos e a própria Revista SAMIZDAT são espécies de triagens, tentando selecionar o que há de bom, ou pelo menos, o que há de legível, em meio a milhões de outros autores e textos de qualidade duvidosa. Podemos estar ignorando algum gênio literário escondido em algum blog às moscas? Sim, mas a internet tem mostrado também que gênios existem às pencas, o que diferencia quem prossegue na carreira literária ou quem afunda não é apenas o talento, mas a capacidade de aguentar os trancos e seguir em frente.

Você mora em Nova York desde 2006. Qual é a diferença mais gritante relativa ao acesso à cultura (livros, teatro e cinema) entre os americanos e os brasileiros?

A primeira coisa que eu percebi é que não existem, em Nova York, tantas livrarias quanto seria de se esperar. Em Curitiba, cidade onde nasci e cresci, era mais fácil de se encontrar uma livraria ou um sebo do que aqui. Por outro lado, a cultura é muito barata e só não tem acesso a ela quem não quer: há cinemas, museus, exposições, shows gratuitos. E mesmo quando é pago, o preço é muito menor do que seria em correspondência ao Brasil. Outro aspecto que pude notar é que há uma segmentação muito nítida e, por isto, é fácil para um artista, mesmo independente, sobreviver com o que faz. Há os fãs de FC, de Terror, de Mangás, de música punk, e eles sustentam o movimento artístico que lhes agradam, comprando livros, indo a shows, ou até mesmo doando dinheiro. É uma outra relação entre produtor e consumidor cultural.

Entretanto, o que vigora nos EUA é um espírito bastante mercenário, tudo é voltado para dinheiro, para captação de verbas, para lucro, para retorno financeiro. E isto está inculcado até em autores iniciantes, que poderiam se dar o luxo de romper um pouco com este ciclo mercadológico e inovarem. A inserção no mercado é muito rápida e natural, portanto os autores americanos não precisam, na maioria das vezes, driblar os obstáculos como nós, brasileiros, precisamos. Ainda não descobri se isto é bom ou ruim.

Vamos falar um pouco do gênero fantástico na literatura brasileira. Qual a sua opinião sobre isso? Você acha que tantos blogs e sites criados na Internet podem acabar atraindo e sensibilizando as grande editoras para o assunto ou o gênero fantástico está fadado a ficar circunscrito apenas no mundo digital?

Não vejo o gênero fantástico como viável comercialmente no Brasil, ou melhor dizendo, não vejo o gênero fantástico made in Brazil como viável. Sabemos o sucesso que Tolkien, Stephen King, Rowling, C.S. Lewis, ou que filmes americanos do gênero fazem no Brasil. No entanto, são poucos autores brasileiros que conseguem se consolidar no cenário. Fomos habituados desde sempre a consumir tais produções dos americanos e, via de regra, a produção brasileira é um reflexo turvo do que se faz no exterior. Acredito que esta resistência ao que se faz no Brasil é porque ainda não se criou uma identidade do que é o "fantástico" brasileiro. Tenho a sensação que é um tanto deslocado um autor brasileiro falar de fadas, druidas ou bárbaros, mas é aquilo com que fomos alimentados desde a infância. Até os outros países da América Latina, como a Argentina, a Colômbia, a Venezuela conseguiram descobrir seus temas fantásticos, mas o brasileiro padece primeiro deste colonialismo cultural, depois de uma inclinação ao realismo social. É muito díficil romper esta cadeia e temos muito chão ainda a percorrer.

A saudosa revista 'Isaac Asimov Magazine” não vingou, mas, segundo dizem, também não deu prejuizo. Muitos periódicos digitais que vemos tem nela uma referência de dinâmica editorial parecida. Você acha que se uma outra revista, aos moldes da “Issac Asimov Magazine” surgisse nas bancas hoje ela teria sobrevivência mais auspiciosa do que nos anos noventa?

Algo que percebo é que estes grupos - de Ficção Científica, Fantasia e Terror - são bastante unidos e seriam, em tese, capazes de sustentar um esforço prolongado de publicação. Bem, há a Scarium, que já está bastante tempo no mercado. Mas os desafios são muito maiores do que o retorno e imagino que muita gente se encolha diante disto. A verdade é que insistir nestes gêneros é mais uma questão de paixão do que qualquer outra coisa. O Brasil tem todas as condições hipotéticas para promover publicações, revistas ou livros do gênero fantástico, mas na prática tudo é mais complicado. Entre um leitor falar "quando seu livro (ou revista) for publicado, vou comprá-lo", e ele comprá-lo de fato, há um abismo. (risos)

Não sei se você pode me responder esta pergunta, mas vou fazê-la mesmo assim. Como estamos na questão de representatividade no gênero Terror , Ficção Científica e Fantasia em termos de mercado editorial no Brasil?

Há muitos escritores talentosos, muita gente com vontade, porém há uma carência de novos temas, quase tudo acaba recaindo no lugar-comum e nos clichês. Isto é um tanto inevitável, já que a literatura mundial está recheada de clichês, de temas e estruturas que se repetem ad infinitum. Mas esta situação não favorece a inserção de autores inéditos. Precisamos de novidade e originalidade. Enquanto não apresentarmos algo de inovador, permaneceremos à margem do que se faz no resto do mundo. Até onde percebo, os autores de FC são os mais organizados e a Ana Cristina Rodrigues, através do Clube de Leitores de Ficção Científica, tem conseguido agregar autores e leitores. Há também as publicações como a Black Rocket, a Scarium, e a editora "Fábrica dos Sonhos". No gênero do Terror, há a galera da Necrozine e da Tarja Editorial. Existem alguns outros esforços isolados...

Fique a vontade para as suas últimas palavras?

Se alguém conseguiu sobreviver até esta última pergunta, então segue o que penso: estamos diante dum momento único na História. Vez ou outra, há uma ruptura no fluxo histórico e conceitos obsoletos são substituídos por outros. Por isto, temos de estar preparados. A internet é uma ferramenta valiosíssima para os novos autores, nunca antes uma pessoa comum, como eu ou você, teve em seu poder o mecanismo para falar diretamente às outras pessoas. Antes, para atingir as massas, era preciso passar pelo crivo dos grandes aparelhos midiáticos - TV, rádio, cinema. Hoje, qualquer um, desde que tenha algo de interessante para falar, pode chegar a milhões de pessoas através de algo tão simples como um blog. Este é um poder que não pode ser menosprezado. Há alguns anos, para um autor desconhecido, o fato de não conseguir ser publicado por uma editora comercial era o fim da estrada. Hoje, há blogueiros com mais leitores do que best-sellers; tem gente que vive apenas com a renda de seus blogs. Não consigo pensar em maior liberdade literária do que esta: você sendo o autor, o próprio editor e atingindo diretamente seu público-alvo. Não existe época mais propícia para um bom escritor.


Entrevista dada a Afonso Luiz Perereira para o site Contos Fantásticos

Wednesday, April 08, 2009

Realismo Mágico, a realidade à mercê da Literatura


A Revolução Cubana, em 1959, inseriu a América Latina no panorama global.
No quintal de sua casa, os EUA assistiram à instalação de um regime comunista, que representaria uma potencial porta de entrada da URSS no país. Na intrincada dinâmica da Guerra Fria, Cuba se tornou uma importante peça no jogo, mas, além dos aspectos geopolíticos, fez com que os olhos do mundo se voltassem para a cultura latino-americana. Como sempre, os ianques precisavam conhecer seus inimigos para derrotá-los.
Podemos considerar este evento como o início do boom da literatura latino-americana, quando autores como Cortázar, Garcia Marquez, Vargas Llosa, Carlos Fuentes e Alejo Carpentier despontaram no cenário literário internacional e se tornaram as estrelas da vez.
Para compreendermos este fenômeno, e também sua vertente mais marcante — o chamado “realismo mágico”, ou “fantástico” —, devemos, antes de tudo, dividirmos estes dois termos, “realismo” e “mágico”, encontrarmos suas origens e correlacioná-los ao uso feito pela literatura latino-americana.

O mágico na Literatura
O aspecto extraordinário e fantástico sempre esteve presente na Literatura. Desde a relação íntima entre deuses e homens de Homero, onde as divindades interferiam na vida mundana, participavam ativamente dos eventos, o sobrenatural e o inexplicável foram incorporados pela Literatura e utilizados para expressar uma verdade maior.
A realidade, tal qual, fornecia os elementos básicos da narrativa literária, posto que os autores eram pessoas como outras quaisquer e buscavam em suas épocas e no comportamento de seus contemporâneos a inspiração, no entanto, a verdade pertencia a um plano superior, algo próximo a um platonismo literário, no qual a verdade sempre estaria para além do que os olhos enxergavam — o Livro do Mundo sempre nos remetia ao Livro do Universo, o microcosmo como manifestação do macrocosmo.
Fosse no contexto clássico, com o panteão grego ou romano, fosse no contexto cristão, com uma divindade todo-poderosa, a tradição literária expressou, em vários momentos, suas mensagens através do fantástico: Dante desceu aos infernos, conduzido pelo poeta romano Virgílio, para se encontrar com sua Beatrice; as lendas do ciclo arturiano apresentaram cavaleiros em busca do mítico Santo Graal; em Rabelais, os gigantes Gargântua e Pantagruel atravessavam a França, guerreando e festejando, e partiram em busca de Théleme, uma abadia fictícia onde poderiam encontrar a verdade; Fausto entregou a alma a Mefistófeles em troca da sabedoria.
De fato, o fantástico não permeava apenas as obras ficcionais, mas também narrativas que se pretendiam verídicas. Em Heródoto, o extraordinário estava presente o todo tempo, mesclado a eventos históricos, e a própria Bíblia propaga tradições orais calcadas no fantástico, tais como os milagres e ressurreição de Jesus.
E esta predominância do mágico não era um problema para autores e leitores, até o Racionalismo entrar em cena e, como afirmou Descartes, daquele ponto em diante só se poderia confiar no “certo e indubitável”, e não mais em meras fantasias (Meditações Metafísicas, 1641).

O realismo na Literatura
É impossível de se determinar o momento exato em que a razão passou a ter a primazia. No entanto, é evidente que entre o final do século XV e o começo do século XVII, houve profundas transformações nos saberes, na cultura e na política da civilização ocidental.
As grandes navegações significaram uma mudança nos planos político e econômico, enquanto que nos campos especulativos, as reflexões de René Descartes, as descobertas de Copérnico, Galileu e Newton, trouxeram uma cisão com os conhecimentos de outrora.
Obviamente que esta profunda revolução intelectual se disseminaria pelo mundo ocidental e influenciaria as Artes e a Literatura. É durante este período que a Renascença européia atingiu seu auge, com expoentes como Leonardo Da Vinci, Miguelangelo e Rafael, na Itália, e Albrecht Dürer, na Alemanha. Enquanto que, na Espanha, despontou aquele que seria, na opinião de Foucault (As Palavras e as Coisas, 1966), o primeiro escritor moderno, Miguel de Cervantes.
A obra de Cervantes é, neste sentido, bastante intrigante, ao observamos sua construção: Dom Quixote é um senhor que, por causa da leitura excessiva de romances de cavalaria, decide ele próprio se tornar um cavaleiro andante. A realidade da Espanha de Dom Quixote não corresponde em nada ao mundo dos livros que ele lia, o que não o impede de visualizar, em sua imaginação ou delírio, gigantes, cavaleiros inimigos, belos corcéis e princesas, quando tudo não passa de moinhos de vento, viajantes pegos de surpresas, pangarés e moças desdentadas.
O personagem Quixote não pertence a dois mundos que se tocam, como os heróis das épocas anteriores, mas sim a dois universos que repelem. Em “Dom Quixote”, a realidade e o imaginário são antagônicos.
Esta foi uma tendência que se acentuou com o passar dos anos, a ponto que, nos séculos XVII e XVIII, o realismo já predominava. Em “Robinson Crusoé”, considerado o primeiro romance inglês, há uma ausência total do fantástico. Daniel Defoe escolheu um homem comum, com uma vida comum, mas diante duma situação incomum — o naufrágio. Contudo, as soluções do romance são plausíveis em comparação à realidade.
Para a literatura moderna, além da verossimilhança interna, a escrita também precisava se aproximar do real. Balzac e Dickens foram dois mestres neste campo: eles recriaram ficcionalmente situações e caracteres de suas cidades — Paris de Balzac e Londres de Dickens, se não eram cópias exatas, eram retratos minuciosos do mundo em que viviam.
O Naturalismo, durante o século XIX, significaria a hipérbole do realismo e, na figura de Émile Zola, buscou reproduzir a realidade em sua imundície, relevando um determinismo científico.
Após séculos de domínio do mágico, a Literatura ocidental se dobrou à realidade.

Kafka e o mundo inexplicável
Mas a transição para o século XX expôs as fragilidades da razão.
Nietzsche talvez tenha sido o primeiro grande intelectual a identificar a razão como deturpadora, em oposição aos sentidos. A razão distorceria a realidade, ao tentar unificá-la em conceitos e buscar uma essência para as coisas.
O filósofo alemão retraça o domínio da razão desde Sócrates até seus tempos, sob a inquestionável influência de Kant e Hegel, e desfere golpes letais contra o pensamento ocidental.
Não é à toa que Nietzsche se tornaria referência para toda uma geração futura de pensadores e artistas e apontaria para novos rumos criativos.
Nas Artes e na Literatura, a virada para o século XX foi de profundas transformações e de acirrado ataque à tradição. Durante a primeira metade do século, incontáveis movimentos de vanguarda se proliferaram pela Europa e Estados Unidos, imbuídos dum único compromisso: arrastar a Arte para fora de seu conformismo, testar seus limites e renová-la.
É neste ponto em que a realidade novamente se encolhe diante de sua representação. Artistas como Picasso, Kandinsky, Dalí, Braque, se descolam do realismo e recriam a realidade de outra maneira. O mesmo fenômeno também ocorreria em outros campos artísticos, como na música, na escultura, na fotografia, e principalmente na literatura. Este foi o momento de buscar o real na finitude do Homem, dentro de sua própria psique e do tempo intangível. Proust, Joyce, Breton, Sartre, Camus, Virginia Woolf, Samuel Beckett, entre outros, assumiram a linha de frente deste embate contra a tradição e conduziram a literatura a novos patamares.
Distante dos grandes centros culturais e dos movimentos estéticos, Franz Kafka foi um destes autores que incorporaram o espírito de seu tempo e, através de sua escrita, apresentou possibilidades criativas inéditas e restaurou a presença do fantástico. Nas obras de Kafka, o real e o mágico voltaram a se tocar, o segundo invadindo o primeiro duma maneira assustadora, não mais com a naturalidade dos tempos antigos, mas sim com a aporia da era industrial.
Em “A Metamorfose”, por exemplo, obra na qual o protagonista Gregor Samsa desperta tornado um inseto repugnante, o inexplicável só é acentuado pelo absurdo de que, mesmo metamorfoseado num bicho, tudo que o personagem mais deseja é se levantar e ir trabalhar, para não receber um esporro do chefe.
De maneira abrupta e, de certo modo, violenta, o fantástico reassumiu sua posição. Com a crise da razão, o mundo não precisava mais de explicação.

O modernismo europeu e os acólitos latinos
Tais vanguardas modernistas se disseminariam pelo mundo, alcançando inclusive a América Latina.
Em 1922, ocorreu no Brasil a Semana de Arte Moderna, que tornou pública toda uma geração de artistas brasileiros, como Tarsila de Amaral, Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Brecheret, Villa-Lobos, Mário e Oswald de Andrade, para citar alguns. Obviamente estimulados pelas vanguardas européias, eles assumiram o compromisso de digerir as propostas de revolução artística e regurgitá-las com a voz e identidade brasileiras.
Algo semelhante também ocorreria em outros países da América Latina e, na Argentina, Jorge Luis Borges seria um dos autores que acompanharia a onda dos modernistas.

Borges, o criador de labirintos
O argentino Jorge Luis Borges é uma grande sombra pairando sobre a literatura latino-americana. Por décadas, foi quase impossível escapar de sua influência.
Primeiro, ele pertenceu ao movimento ultraísta argentino e fundou algumas revistas, como Cosmópolis, Prisma e Proa. Dedicou-se, no início de sua carreira literária, à poesia, mas seria durante a maturidade que ele produziria suas mais importantes obras, em prosa, entre elas “Ficções” e “O Aleph”, isto durante entre as décadas de 1930 e 1950.
As narrativas de Borges são permeadas de paradoxos, intertextos, referências fictícias e muitas vezes abordam o processo de criação literária. Leitor de Kafka, Edgar Allan Poe e Joyce, Borges condensou o espírito duma geração em crise e sublimou este esfacelamento da noção de verdade e referência em seus contos.
Não é acidentalmente que, posteriormente, Borges seria acolhido pelos teóricos estruturalistas, que encontrariam em seus textos a expressão desta cisão, deste corte epistemológico. O universo de Borges não era utópico, posto que não apresentava um mundo idealizado, nem distópico, já que não representava uma outra realidade decadente e opressora, mas sim paratópico (Foucault, no prefácio de “As Palavras e as Coisas”), no qual, em alguns casos, nem as regras físicas da nossa realidade vigoravam, tal qual ocorre no conto “Tlön, Uqbar, orbis tertius” ou na antologia “Livro dos Seres Imaginários”, escrito em parceria com Margarita Guerrero.
Para Borges, a literatura era um “orbe autônomo”, descolado da realidade, e onde tudo é possível de acordo com a vontade do autor.
Esta falta de engajamento, que transparecia neste ideal duma literatura voltada para a própria literatura, seria o calcanhar de Aquiles de Borges, cotado várias vezes para receber o prêmio Nobel, mas repudiado por causa de sua falta de comprometimento político e também pelo equivocado apoio ao governo peronista e ao golpe militar de Pinochet no Chile.
Em 1960, a obra de Borges já havia sido traduzida para inúmeros idiomas e era acolhida pela crítica e público internacional.
Este escritor, que durante praticamente toda a vida lutou contra problemas de visão e morreu completamente cego, enxergou mais longe de que muitos de seus contemporâneos, e traçou o caminho para a geração seguinte, que conquistaria o mundo com suas histórias extraordinárias.

O Boom e seus estilhaços
Num intervalo de poucos anos, vários autores da América Espanhola publicaram seus livros e se tornaram sucesso de vendas e crítica.
Há pouco consenso sobre qual livro teria inaugurado, de fato, a geração do Boom, mas “O Jogo da Amarelinha” de Julio Cortázar é um forte candidato, ao lado de “A Cidade e os Cachorros” de Mario Vargas Llosa, ambos publicados em 1963. Numa sucessão vertiginosa, vieram as principais obras de Carlos Fuentes — “A Morte de Artemio Cruz” e “Aura” — e aquele romance que talvez condense melhor o espírito da literatura do boom, “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez, de 1966.
Na obra “Spanish American Fiction”, o pesquisador Donald L. Shaw apresenta as seguintes características da literatura do boom:

“1. O desaparecimento do velho romance “criollista”, ou “telúrico”, de tema rural, e o surgimento do neo-indigenismo de Asturias e Arguedas.
2. O desaparecimento do romance “engajado” e o surgimento do romance “metafísico”.
3. A tendência a subordinar a observação à fantasia criadora e à mitificação da realidade.
4. A tendência de enfatizar aspectos ambíguos, irracionais e misteriosos da realidade e da personalidade, desembocando, às vezes, no absurdo como metáfora da existência humana.
5. A tendência a desconfiar do conceito de amor como suporte existencial e de enfatizar, em troca, a incomunicabilidade e a solidão do indivíduo. Antirromantismo.
6. A tendência a desprover de valor o conceito de morte num mundo que, por si só, é infernal.
7. A revolta contra toda espécie de tabu moral, sobretudo aqueles relacionados à religião e à sexualidade. A tendência paralela a explorar a tenebrosa magnitude de nossa vida secreta.
8. Um emprego maior de elementos eróticos e humorísticos.
9. A tendência a abandonar a estrutura linear, ordenada e lógica, típica do romance tradicional (e que refletia um mundo concebido como mais ou menos ordenado e compreensível), substituindo-a por outra estrutura baseada na evolução espiritual do protagonista, ou com estruturas que refletem a multiplicidade do real.
10. A tendência a subverter o conceito de tempo cronológico linear.
11. A tendência a abandonar os cenários realistas do romance tradicional, substituindo-os por espaços imaginários.
12. A tendência a substituir o narrador onisciente em terceira pessoa por narradores múltiplos ou ambíguos.
13. Um emprego maior de elementos simbólicos.”

Muitos destes elementos já haviam sido explorados, em separado, pelo romance modernista, mas a verdadeira novidade foi o tom e a engenhosidade dos autores latino-americanos.
Julio Cortázar, em entrevista a Joaquin Soler Serrano, tentou reverter a imagem de que o boom não passava duma manobra editorial. Segundo Cortázar, ele e outros expoentes do boom haviam iniciado suas carreiras literárias com dificuldade, publicando pequenas tiragens independentes e conquistando os leitores de maneira espontânea.
Não há razão para duvidarmos desta afirmação, mas também não podemos questionar o papel do mercado editorial. As editoras, como quaisquer outras empresas capitalistas, visam o lucro e, para tanto, buscam agregar autores e obras em seus catálogos que maximizem tal lucro. Os primeiros a identificarem o fenômeno entre os autores latinos foram as casas editoriais espanholas, mas, sem dúvida, a entrada do mercado norte-americano foi fundamental para a propagação e consolidação do boom.
Em 1970, os EUA e o mundo já haviam sido conquistados pela literatura hispânica da América. No entanto, considera-se que o final do boom, e a consequente transição para a geração pós-boom, tenha ocorrido exatamente nesta época, quando os abusos do regime castrista em Cuba começaram a abalar a confiança da intelectualidade na experiência comunista na América.
Contudo, sem dúvida, o boom significou a inserção da literatura latino-americana no cenário internacional, ao mesmo tempo em que se projetou como uma maldição para as gerações vindouras de escritores da América Espanhola, que acabaram coagidos a se inserirem nas temáticas e formas adotadas pelos autores do boom, sob o risco de serem rechaçados como párias.
O próprio Cortázar admoestou sobre os perigos de se considerar que todo escritor latino-americano seria, naturalmente, um grande prosador, e que o sucesso de alguns e o orgulho não deveriam ofuscar as possibilidades criativas.
Foi no rastro do boom, ou em oposição a ele, que a geração literária seguinte teve de encontrar sua identidade.

Pós-boom e a geração McOndo
Este artigo não estaria completo se não nos detivéssemos, por alguns instantes, para observarmos os efeitos do boom. Os autores exponenciais, como Cortázar, García Marquez, Vargas Llosa e Carlos Fuentes continuaram escrevendo, e fazendo sucesso, mesmo após o término do boom.
E adotando várias das técnicas e/ou características da narrativa deles, alguns outros autores conseguiram romper a barreira do anonimato, entre eles Isabel Allende, Laura Esquivel, Elena Poniatowska, António Skármeta, Gustavo Sainz e Manuel Puig — em muitos casos, com uma escrita tipo exportação, visando o público internacional, que já sabia o que esperar da literatura latino-americana.
Além destes, na contramão do realismo mágico, surgiu um grupo de escritores, encabeçados por Alberto Fuguet, agregados pelo movimento McOndo, uma corruptela do nome da cidade fictícia de Macondo, criada por García Márquez.
Fuguet define McOndo assim:

“(...) Chegamos a pensar que a América Latina era uma invenção dos departamentos de espanhol das universidades norte-americanas. Saímos para conquistar McOndo, e só descobrimos Macondo. Estávamos em sérios problemas. As árvores da selva não nos deixavam ver a ponta dos arranha-céus.
(...)
O nome (marca-registrada?) McOndo é obviamente um chiste, uma sátira, uma brincadeira. Nosso McOndo é tão latino-americano e mágico (exótico) quanto o Macondo real (que, no final das contas, não é real, mas sim virtual). Nosso país McOndo é maior, superpovoado e cheio de contaminação, com rodovias, metrô, tv-a-cabo e subúrbios. Em McOndo, há McDonald’s, computadores Mac e condomínios, além de hotéis cinco estrelas construídos com dinheiro lavado e gigantescos shopping centers. Em nosso McOndo, assim como em Macondo, tudo pode acontecer, claro que, no nosso, quando a gente voa, é porque anda de avião ou está muito drogado. A América Latina, e de algum modo, A América Espanhola (Espanha e todo o EUA latino) nos parece tão realista mágico (surrealista, louco, contraditório, alucinante) quanto o país imaginário onde as pessoas levitam ou predizem o futuro, e os homens vivem eternamente. Aqui, os ditadores morrem e os desaparecidos não retornam. O clima muda, os rios desembocam, a terra treme e Dom Francisco coloniza nossos inconscientes. (...)” (McOndo, 1996)

Alberto Fuguet e seus McOndianos se precipitam em direção à realidade, renegando um passado que, para eles, era de ilusão, alienação e de mitificação da América Latina como uma terra mágica e exótica, reforçando a imagem coletiva que já se formava, desde sempre, do subcontinente americano: florestas, selvagens, macacos e xamanismo.
Talvez a crítica de McOndo seja drástica demais, contudo, não deixa de ter sua pertinência.

Conclusão
O realismo mágico foi a via de acesso que o mundo teve da América Latina. Grandes autores se consagraram durante o período do Boom, e moldaram toda uma percepção da literatura e da cultura latino-americana.
O Brasil teve pouca importância neste processo. Alguns teóricos consideram Guimarães Rosa como um dos autores do boom, mas isto me parece um equívoco. Apesar de alguns elementos de realismo mágico na obra de Guimarães Rosa, acredito que ele esteja intimamente vinculado ao realismo social que predomina na Literatura Brasileira desde a década de 30 até hoje.
Há poucos autores de realismo mágico no Brasil, e quase todos são de vertente borgeana, de índole quase parasitária. O Boom latino-americano foi muito mais influente na Europa, arrebanhando autores como Saramago, Italo Calvino e Umberto Eco, do que no Brasil.
Entendo que, pelos limites de um artigo como este, que tentou abarcar um lapso temporal imenso (ao contrário do recomendável para trabalhos acadêmicos, do recorte, do estudo de caso), haja uma tendência a um certo reducionismo e a algumas generalizações indesejáveis. Também é inevitável que muitos autores importantes, tanto do pré e pós-boom, quanto do próprio boom, não tenham sido mencionados, mas isto é, em parte, uma falha da minha própria leitura, já que preferi me ater aos autores com os quais tive, pelo menos, algum tipo de contato.

Para saber mais
FUGUET, Alberto, Prólogo libro McOndo - http://www.marcosymarcos.com/macondo.htm

The Cambridge History of Latin America, vol. X - http://books.google.com/books?id=3NiCQFfSGIkC

Entrevista de Julio Cortázar a Joaquin Soler Sorrano, 1977 - http://www.zyntag.com/tags/video/Dgfr5k9dzfw/

SHAW, Donald L., The Post-boom in Spanish American Fiction - http://books.google.com/books?id=ZutRjqaSQlAC

Latin American Boom (Wikipédia) - http://en.wikipedia.org/wiki/Latin_American_Boom

(Publicado originalmente na Revista SAMIZDAT)
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