Wednesday, February 29, 2012

Arte não é o que você pensa


Em janeiro de 2007, o jornal The Washington Post resolveu fazer um experimento: convidaram um dos maiores violinistas da atualidade para tocar no metrô da capital dos EUA e ver no que dava, e gravaram com uma câmera escondida o resultado.

A expectativa era que o músico e seu violino Stradivarius valendo 3,5 milhões de dólares atraíssem muita gente e que sua apresentação de quase uma hora rendesse uns bons trocados.
Todavia, o desfecho foi bastante diferente do esperado. Quase ninguém parou para ouvi-lo, ele ganhou míseros 32,17 dólares e ergueu-se a indagação: por que quase ninguém foi capaz de reconhecer a habilidade de um prodígio do violino?

O artigo do Post, Pearls Before Breakfast, para quem souber inglês, é longo e discorre sobre a natureza da Arte. Sugere-se que se isto ocorresse na Europa, o público seria maior; uma engraxate brasileira até supõe que os brasileiros teriam sido mais receptivos; e culpou-se inevitavelmente o ritmo frenético do mundo contemporâneo.

No entanto, a Arte não é o que pensamos, nem o que os poetas cantam. A Arte não é uma coisa objetiva e palpável, de fácil determinação, que se possa apontar o dedo e afirmar categoricamente: "isto é uma obra de arte, sem sombra de dúvida".

A Arte é uma questão de contexto, de tempo e espaço. A Arte é uma convenção.

O violinista estava no lugar errado e na hora errada. Ninguém está interessado em ouvir música clássica na passagem de entrada do metrô, aliás, são bem poucos os que apreciam música erudita em nossos dias.
Arranque a obra de arte de seu contexto, neste caso dos grandes salões de concerto, e ela perderá grande parte de sua relevância, a não ser para aqueles que realmente a apreciam e a reconhecem.

Esta divisão, entre o mundo sagrado e profano, ou entre a alta e baixa cultura, existe desde sempre. Selecione qualquer grande pintura em um museu e dependure-a num tapume de uma construção que seu valor imediatamente desaparecerá, e quase qualquer transeunte deixará de identificar sua importância. Imprima qualquer obra de um escritor de renome e distribua em panfletos em esquinas de grandes cidades, e verá que o destino será a lixeira mais próxima.

A Arte é o reconhecimento de determinada criação como Arte, e isto depende de várias instâncias de legitimação, como um museu, um teatro, uma livraria ou uma sala de cinema, e dos críticos, da imprensa e de acadêmicos. Arranque a obra de arte de seu contexto de legitimação, jogue-a na rua, no domínio do profano, e poucos lhe darão valor.
Mas se você fizer o caminho inverso, como Duchamp que leva um mictório de um banheiro público para um museu, numa crítica evidente ao que é Arte, você também romperá estes limites, dotando de sentido um objeto totalmente ignorado na vida corriqueira.

A qualidade da Arte não é intrínseca, é coletiva. Se houvessem espalhado o rumor que um dos maiores violinistas dos EUA estava tocando no metrô, a situação seria diferente, pois as pessoas tendem a valorizar o que outros valorizam. Se houvessem contratado uma dúzia de figurantes para se acercarem do músico, outros teriam parado para escutá-lo, pois se tanta gente se interessou, é porque deve ser bom.
No fundo, não basta tanto ser competente ou talentoso, é preciso que os outros se convençam disto e que estes convençam também os demais.

E esta é a maior dificuldade de qualquer artista em início de carreira, como atrair a atenção dos pedestres que passam por nós, todos imersos em suas próprias preocupações cotidianas, divididos por tantas outras atrações ao redor?
Como revelar aos outros o valor daquilo a que damos tanto valor, sendo que este valor depende necessariamente do reconhecimento coletivo?

A obra de arte não é o resultado de trabalho de gênios, de sujeitos inspirados, não é evidente e universalmente aceita. É cultural, é localizada, é intangível e temporal. O que é Arte hoje pode não sê-lo amanhã, e só reconhecemos a Arte de ontem graças à instâncias de legitimação que a preservam e que canonizam alguns artistas, enquanto olvidam arbitrariamente outros.

A Arte não é o que você pensa.

Tuesday, February 28, 2012

29 regras para escrever Português correcto, explanadas de forma exemplificada



Este texto foi publicado por Joaquim Bispo na comunidade "Escritores - Teoria Literária" em 2008. Ele havia recebido-o por e-mail, até tentei descobrir a autoria, mas não consegui.
Mesmo assim, valem as dicas, apesar de sempre haver exceções para elas.

1. Deve evitar ao máx. a utiliz. de abrev., etc.

2. É desnecessário fazer-se empregar de um estilo de escrita demasiadamente rebuscado. Tal prática advém de esmero excessivo que raia o exibicionismo narcisístico.

3. Anule aliterações altamente abusivas.

4. não esqueça as maiúsculas no início das frases.

5. Evite lugares-comuns como o diabo foge da cruz.

6. O uso de parêntesis (mesmo quando for relevante) é desnecessário.

7. Estrangeirismos estão out; palavras de origem portuguesa estão in.

8. Evite o emprego de gíria, mesmo que pareça nice, tá fixe?

9. Palavras de baixo calão podem transformar o seu texto numa m****.

10. Nunca generalize: generalizar é um erro em todas as situações.

11. Evite repetir a mesma palavra, pois essa palavra vai ficar uma palavra repetitiva. A repetição da palavra vai fazer com que a palavra repetida desqualifique o texto onde a palavra se encontra repetida.

12. Não abuse das citações. Como costuma dizer um amigo meu: "Quem cita os outros não tem ideias próprias".

13. Frases incompletas podem causar

14. Não seja redundante, não é preciso dizer a mesma coisa de formas diferentes; isto é, basta mencionar cada argumento uma só vez, ou por outras palavras, não repita a mesma ideia várias vezes.

15. Seja mais ou menos específico.

16. Frases com apenas uma palavra? Jamais!

17. A voz passiva deve ser evitada.

18. Utilize a pontuação correctamente o ponto e a vírgula especialmente será
que já ninguém sabe utilizar o ponto de interrogação

19. Quem precisa de perguntas retóricas?

20. Conforme recomenda a A.G.O.P, nunca use siglas desconhecidas.

21. Exagerar é cem milhões de vezes pior do que a moderação.

22. Evite mesóclises. Repita comigo: "mesóclises: evitá-las-ei!"

23. Analogias na escrita são tão úteis quanto chifres numa galinha.

24. Não abuse das exclamações! Nunca!!! Jamais!!! O seu texto fica horrível!!!!

25. Evite frases exageradamente longas, pois estas dificultam a compreensão da ideia nelas contida, e, por conterem mais que uma ideia central, o que nem sempre torna o seu conteúdo acessível, forçam desta forma, o pobre leitor a separá-la nos seus diversos componentes, de forma a torná-las compreensíveis, o que não deveria ser, afinal de contas, parte do processo da leitura, hábito que devemos estimular através do uso de frases mais curtas.

26. Cuidado com a hortografia, pra não viular a língúa portuguêza.

27. Seja incisivo e coerente, ou não.

28. Não fique escrevendo no gerúndio. Você vai deixando seu texto pobre – causando ambiguidade – e esquisito, ficando com a sensação de que as coisas ainda estão acontecendo.

29. Outra barbaridade que você deve evitar é usar muitas expressões que acabem por denunciar a região onde tu moras, carago!

(autor desconhecido)

Sunday, February 26, 2012

A Maldição da Língua Portuguesa


Qualquer escritor sabe, ou pelo menos deveria saber, que um título pode mudar toda a recepção de seu texto.
Um título como "A Maldição da Língua Portuguesa" é destes que atrairá todo os tipos de revoltados, professores de português e outros escritores, com sete pedras na mão, prontos para linchar o heresiarca.

Então, passado o furor inicial, é hora de botar panos quentes e tentar esclarecer o mal-entendido (?).

A Benção

A língua portuguesa é belíssima e, sonoramente, talvez seja uma das mais agradáveis. Há seis anos que moro fora do Brasil, e se há uma sensação que eu gostaria de ter pelo menos uma vez na vida, é a de ouvir o português com o ouvido que os gringos o escutam.
Os americanos são fascinados pela Bossa Nova e nos dizem que o português brasileiro é como se estivéssemos cantando, talvez porque a Bossa Nova é quase como se os cantores estivessem falando com este jeito malemolente do brasileiro.
Já os argentinos são deslumbrandos com o Brasil e muitos arriscam um português rudimentar com sotaque brutal. Dizem que é uma língua linda e são fãs da Xuxa e da Daniela Mercury. A rivalidade conosco é somente no futebol mesmo, de resto, eles adoram e consomem quase tudo que sai do Brasil e, quando podem, embarcam nas férias de verão para algumas das praias catarinenses.

O português realmente é uma língua linda e, assim como Fernando Pessoa, arrisco-me a dizer que "a minha pátria é a língua portuguesa". Não há como escapar disto: somos moldados por nossa família, pelo país no qual nascemos, pela escola, mas também pela língua que falamos, pois é através dela que apreendemos o mundo e por intermédio dela que nos expressamos.
Já tentei escrever alguns contos em inglês e traduzir outros, mas é antinatural. O português está em minhas veias e em minha mente, é a essência de quem sou como escritor, não há alternativa, é um caminho de via única.
Admiro aqueles escritores como Nabokov ou Beckett, que adquirem competência e maestria suficiente em outro idioma para serem capazes de escrever romances em inglês ou francês. Acredito que sejam necessárias décadas, pelo menos para mim, vivendo e convivendo com falantes de outro idioma, para um dia adquirir tal habilidade. O português está enraizado dentro de mim, fatal e inevitavelmente.

Todavia, literariamente o português é uma maldição.

A Maldição


Somos a ilha portuguesa na América Latina e Portugal é a ilha portuguesa na Europa. Somando todos os países falantes de português no mundo somos 236 milhões, a sexta língua mais falada no planeta e oficial em nove países, o que não seria nada desprezível se a maior parte destes países não fosse atrasada, pobre e com um número pequeno de leitores potenciais.
Além disto, não existe unidade entre estas nações, ao ponto de o português falado em outros países chegar a ser, em alguns casos, quase incompreensível entre si. As variações históricas e de colonização criaram vertentes deste idioma, com vocabulários próprios e até uma ortografia diferente, que uma medonha reforma ortográfica tentou unificar, sem sucesso até o momento.
Temos grandes autores canônicos, sem sombra de dúvida, como o próprio Fernando Pessoa já mencionado, que ouso afirmar ser o melhor escritor em português de todos os tempos e um dos maiores do mundo também. Há Camões, Machado de Assis, Guimarães Rosa, Clarice Lispector e o nosso único prêmio Nobel, Saramago.
Esta lista é imensa, eu lhe asseguro, mas somente para nós, falantes de português, porque fora de nossas fronteiras, fora de nossa pátria linguística, pouquíssimos deles são conhecidos, e muitos menos ainda os lidos. Os únicos autores realmente presentes no exterior, isto onde quer que você ponha os pés, são Paulo Coelho e Saramago.
O primeiro, ainda a maior vergonha para a intelectualidade brasileira, é um fenômeno inquestionável de vendas. Seus enredos simplórios, a escrita pouco rebuscada e os temas espiritualizados atraíram uma legião de fãs e cruzaram as fronteiras do Brasil, quase num projeto de dominação global. As pessoas leem Paulo Coelho e se sentem bem consigo próprias, esta é a natureza do que ele escreve e imagino que seja parte do que o tornou famoso. São poucos os que gostam de ler, ou ver um filme, para se sentirem mal, para ficarem desconfortáveis, para se angustiarem, ou serem tomadas pelo "desassossego". Num mundo como o nosso, tão violento e sem esperanças, talvez muita gente necessite deste alento, falso suponho, de encontrar respostas na Literatura: que nem tudo está perdido, que existe algum sentido e que podemos ser felizes.
Já Saramago, porque um prêmio Nobel nas costas pode catapultar a carreira e as vendas de qualquer escritor, mesmo que a escrita dele seja a extrema oposta da de Coelho, densa, inquietante, confusa e que exige grande esforço do leitor.

Excetuando estes dois nomes, e algumas publicações esporádicas por editoras ou por universidades estrangeiras, a língua portuguesa praticamente inexiste fora dos países lusófonos. E neste ponto estamos muito atrás dos países hispânicos da América Latina, e também de países com muito menos falantes do que nós, como a Alemanha, a Itália, ou o Japão, mas que proporcionalmente possuem um público leitor muito superior ao nosso. E também corremos atrás de paisotes, como a Irlanda, com vários grandes autores reconhecimentos mundialmente, quatro prêmios Nobel de Literatura, vindos de uma ilha com menos de 5 milhões de habitantes, mas que falam inglês, a língua hegemônica em nossos tempos.
Mesmo assim, uma língua literária não se faz através de seu número de falantes, mas através de seu número de leitores de fato.

E some-se a isto uma educação precária, desde as primeiras letras, uma escolha equivocada de autores extemporâneos no ensino da literatura em língua portuguesa, famílias sem hábito de leitura, escritores sem hábito de leitura (o que para mim é o mais surpreendente), e um mercado literário totalmente provinciano e colonizado, então é possível ter um vislumbre da maldição que a língua portuguesa é na vida de seus escritores.
Escrevemos mal, escrevemos para poucos, escrevemos sem perspectivas alguma de publicação, e se o sucesso um dia ocorrer, será localizado regionalmente e quase insignificante.

A nossa língua é belíssima, repito, mas ser um escritor de língua portuguesa é praticamente um suicídio literário. Pois uma obra sem leitores não existe.
Resta-nos pouco a fazer... Continuaremos escrevendo, uma letra após a outra, palavra após a outra, construindo frases, parágrafos, páginas, livros, sempre insuflados por esta esperança que algum destes poucos leitores desta nossa pátria da língua portuguesa deite seus olhos sobre nossos escritos, e nos alegraremos genuinamente quando isto ocorrer.

Thursday, February 23, 2012

Kindle Direct Publishing - preparando o seu e-book para publicação na Amazon


As metas da amazon.com são humildes, vender todos os produtos possíveis no planeta.

Autoproclamada, e com razão, "a maior livraria do mundo", a amazon.com é mais do isto, é um site de compras online que tem redefinido as bases do comércio eletrônico e uma das maiores evidências do conceito de cauda-longa, no qual os produtos mais vendidos representam uma parcela pequena das vendas totais de todos os produtos, o que é pouco verificável em livrarias físicas, pelas óbvias limitações de espaço e catálogo, a escassez.

E a amazon.com está fazendo com os livros digitais o que o iTunes fez com o MP3, após o lançamento dos leitores de livros digitais Kindle, bastante populares nos EUA mas nem tanto no Brasil, e de um sistema próprio de lançamento de e-books, a empresa tem se estabelecido também como uma das gigantes do mercado editorial neste século XXI.

A estratégia tem sido agressiva, tentando convencer autores independentes e também best-sellers notórios a se juntarem ao catálogo exclusivo da amazon, e estamos vendo uma revolução sem precedentes no mercado, além de um assustador inchaço no número de publicações anuais.

Se você não quer ficar para trás deste processo e deseja ver sua obra disponível gratuitamente para venda na amazon.com, segue um passo a passo para publicação através da Kindle Direct Publishing (https://kdp.amazon.com/), que é o serviço de publicação independente da amazon.com.

Criando sua conta

Antes de tudo, você precisa criar sua conta no KDP, como chamaremos o Kindle Direct Publishing de agora em diante, informando seu endereço e as informações para o pagamento de direitos autorais.

As duas opções de pagamento existentes hoje são através de transferência eletrônica diretamente para sua conta bancária, ou envio de cheque para seu endereço. O envio de cheques pelos correios é comum nos EUA, mas pode parecer um pouco estranho para nós, e os valores são pagos em três moedas: dólar, euro ou libra esterlina, dependendo de por onde foram feitas as vendas, já que as vendas através amazon.com, da amazon.uk e das ramificações da europa continental são autônomas.
Obs: com a expansão da amazon.com para outros países, agora estão pagando em outras moedas também, como em reais. Para isto, é necessário ter conta corrente no Brasil para o pagamento dos royalties.

A vantagem da transferência é que os valores são pagos a cada 10 dólares acumulados, enquanto que em cheque apenas quando se atingir a quantia de 100 dólares, o que você descobrirá que não é nada fácil, como veremos mais adiante.

Formatando o seu livro para publicação

O formato recomendado para publicação de livro digital pela Kindle Direct Publishing é .DOC.

É muito simples realizar a formatação através do Word, sem se importar com tamanhos de margem, ou tamanho de fontes, mas é preciso seguir algumas recomendações para que tudo dê certo no final.
Itálicos e negritos são mantidos sem problemas, mas fontes especiais podem não ser convertidas corretamente. O ideal é escolher uma das fontes padrão, como Arial ou Times New Roman.

Tabulação

Não use o botão tab para indicar a primeira linha de novos parágrafos, mas sim a barra de tabulação na régua do Word.

Quebras de página

O Kindle só reconhecerá finais de capítulos se você incluir quebras de páginas no arquivo: control+enter, ou "inserir", "quebra" e "quebra de página".

Imagens

As imagens até aparecerão no Kindle, mas nada de um layout muito sofisticado. Inclua suas imagens no corpo do texto e elas aparecerão centralizadas no arquivo convertido.

Outros elementos

É possível incluir tabelas ou um sumário interativo no arquivo, mas se esta é a sua primeira experiência publicando e-books por conta, sugiro que mantenha tudo o mais simples possível.

Criando um projeto para o Kindle

Para criar o seu projeto, você precisa clicar no botão "Adicionar nova obra".

Logo de cara, você terá a opção de cadastrar sua obra no KDP Select, um sistema de exclusividade da amazon.com, ou seja, você não poderá comercializar seu livro em nenhum outro site ou livraria física pelo período de 90 dias, porém a obra terá mais visibilidade no site, o percentual dos direitos autorais serão maiores (70%, ao invés dos habituais 35%) e poderá ser emprestado pelos usuários do Kindle, ganhando por isto. Para muita gente, pode ser um negócio vantajoso.

Em "Nome do livro", você incluirá o título de seu livro e, se ele fizer parte de uma série, você selecionará a opção "este livro faz parte de uma série", onde você incluirá o nome da série, senão não mexerá nesta opção.

Em seguida, redija uma breve descrição do seu livro em "Descrição". Em "Colaboradores do livro", clique "adicionar colaboradores" e inclua o seu nome como autor.

Selecione o idioma em "Idioma" e, se a obra for de sua autoria, clique na opção "Esta não é uma obra de domínio público e eu tenho os direitos de publicação necessários." na seção "2. Confira seus direitos de publicação".

Na terceira seção, "Direcione seu livro aos clientes", você escolherá a categoria da obra para facilitar que os leitores encontrem o seu livro. Se a sua obra é um romance, você clicará em "adicionar categorias", em "Ficção", e escolha a subcategoria, se você estiver na dúvida em qual sua obra se enquadra, marque "Geral".

Na seção 4, você fará o upload da capa do seu livro, que deve ter sido preparada anteriormente por um designer, ou por você mesmo, caso saiba como fazê-la. Para adicioná-la, clique em "Procurar por imagem".

Por fim, você adicioná, na seção 5. "Envie o arquivo do seu livro", o arquivo do seu livro, que já deve estar formatado especialmente para o Kindle, portanto não pode ser um arquivo .PDF, o melhor mesmo, para um leigo, é um arquivo .DOC seguindo as especificações do KDP.

Depois que subir o arquivo, clique em "salvar e continuar", então o site fará uma conversão do arquivo para o formato do Kindle. Para conferir se está tudo certo, clique em "Visualização do livro", então abrirá uma janela com uma visualição exata de como será o seu livro no Kindle.

No passo 7, "Confira seus territórios de publicação", você escolherá se deseja que sua obra seja distribuída internacionalmente em "Direitos mundiais - todos os territórios", ou se apenas em países específicos através de "Territórios individuais - territórios selecionados".

Na seção 8, "Escolha seu royalty", é a hora de definir quanto você quer ganhar. Nos EUA, há um certo consenso entre os autores que o preço ideal de um romance em e-book é de 99 centavos de dólar. Se você concorda com este modelo, deseja distribuição internacional com o mesmo preço ou venderá apenas para o Brasil, terá de selecionar a opção 35% royalty, ou seja, você ganhará mais ou menos 35 centavos de dólar para cada compra, isto é, quase nada.

A opção de 70% royalty só vale em certos países (o Brasil não é um deles, a não ser que você tenha cadastrado seu livro no KDP Select) e o preço mínimo do livro deverá ser de U$ 2,99.

Na opção 9, "Empréstimo de livros do Kindle", você decide se quer participar do sistema de empréstimo da amazon.com, no qual compradores podem emprestar o seu livro para alguns usuários por tempo limitado. É uma maneira interessante para que outras pessoas possam conhecer o seu trabalho.

Por fim, marque o campo concordando com os termos e condições, "Termos and Condições", e conclua a publicação em "Salvar e Publicar".

Depois, você terá de aguardar por volta de 24 horas para o seu livro aparecer na amazon.com e 48 horas nas outras ramificações ao redor do mundo.
Você receberá o aviso por e-mail.

E depois?


E depois você divulga seu livro para os amigos e conhecidos. Se você não possui um grupo fiel de leitores, as probabilidades é que você venda poucos ou nenhum exemplar, ainda mais com as milhões de opções de livros disponíveis na amazon.com.

Agora começa a parte mais difícil de todas, vender o seu livro.

Eu fiz um teste com o meu romance "O Covil dos Inocentes", caso você queira conferir o resultado final.

E sucesso com o seu livro digital!

Saturday, February 18, 2012

Sobre a Escrita, por Stephen King



Algum tempo atrás, li "On Writing" de Stephen King e gostei muito. Em suas 300 páginas há valiosas dicas para um pretendente a escritor.

"On Writing" é um livro muito divertido e lúcido, sem grandes reflexões metafísicas sobre o ofício da escrita, com recomendações bastante práticas sobre como produzir um texto melhor.

Traduzi alguns trechos que me chamaram atenção.

***


Quando adolescente, King editou uma edição caseira de um romance inspirado em um conto de Poe e vendeu na escola em que estudava. Segundo ele, este foi o primeiro "best-seller" da carreira dele, pois vendeu todas as 40 cópias. No entanto, a diretora da escola não gostou desta iniciativa e o repreendeu, perguntando: "Por que você escreve este lixo?"


"... eu não tinha uma resposta para ela. Eu estava envergonhado. Passei muitos anos desde então - anos demais, acho - envergonhado daquilo que eu escrevia. Acho que eu tinha quarenta anos quando percebi que quase todo escritor de ficção ou poesia que já publicou uma linha foi acusado por alguém de desperdiçar o talento dado a ele por Deus. Se você escreve (pinta, dança, esculpe, ou canta, suponho), alguém tentará fazê-lo se sentir mal, simples assim". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 50)



Mais tarde, no último ano do ensino médio, King começou a trabalhar num jornal da escola. O primeiro texto que ele escreveu, para a seção de esportes, foi lido pelo editor, que rabiscou e cortou vários trechos do texto. Então este editor disse para o autor:

"Escreva com a porta fechada, reescreva com a porta aberta. Em outras palavras, sua obra começa a ser escrita apenas para você, mas então ela vai embora. A partir do momento em que você sabe qual é a história e consegue realizá-la bem - quão bem você puder - ela passa a pertencer a qualquer um que queira lê-la. Ou criticá-la." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 56)

Stephen King enviou, ainda criança e adolescente, inúmeros contos para revistas literárias, principalmente para revistas de Ficção Científica, Terror e Fantasia. As cartas de recusa foram aumentando, até que uma delas enviou uma carta diferente.


"Este é um bom material. Não serve para nós, mas é bom. Você tem talento. Tente novamente".


Depois que ele começou a fazer sucesso, ele releu o mesmo conto que havia sido recusado vários anos antes. Ainda achava que era um bom conto, deu uma burilada no texto e enviou novamente para a mesma revista. Desta segunda vez, o conto foi aceito. Então King conclui:


"Algo que percebi quando você obtém algum sucesso - as revistas tendem a usar menos a frase: 'não serve para nós". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 41)


King afirma que a fase mais difícil para escrever foi quando ele lecionava inglês numa escola secundarista. Ele chegava tão cansado em casa que mal tinha disposição para escrever e chegou a pensar em desistir da carreira literária. Foi neste momento que o apoio da esposa, Tabitha King, foi crucial para ele persistir.


"Escrever é um trabalho solitário. Ter alguém que acredita em você faz bastante diferença. Eles não precisam fazer discursos. Apenas acreditar já é suficiente". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 74)


Foi nesta época que ele começou a escrever "Carrie, a Estranha", que seria seu primeiro best-seller. Ele havia escrito algumas páginas, mas o enredo e as personagens não o agradaram. Ele jogou o manuscrito no lixo, mas, ao chegar em casa, encontrou a esposa lendo as folhas amassadas.
Ela insistiu que ele continuasse escrevendo o romance, mas ele tinha muitas dificuldades para desenvolver uma personagem adolescente com problemas de aceitação. Segundo King, o desafio para escrever "Carrie" ensinou várias lições a ele.


"A mais importante (lição) é que a percepção inicial do autor de um personagem, ou de personagens, pode ser tão errônea quanto a do leitor. Num apertado segundo lugar, foi a constatação que interromper um trabalho apenas por ser difícil, seja emocional ou criativamente, é uma má ideia. Às vezes, você tem de ir adiante mesmo que não queira, e às vezes você está realizando um bom trabalho mesmo que tenha a sensação de estar cavando merda." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 77)


Por vários anos, Stephen King se afundou na bebida e nas drogas. Quando chegou ao fundo do poço, as família dele interveio e ele teve de escolher entre a esposa, filhos e amigos, ou a bebida, a cocaína e remédios.
Ele acreditava que boa parte de sua criatividade derivava de estados alterados de consciência, mas, mesmo assim, ele preferiu abdicar da escrita, se fosse necessário, para não ferir mais aqueles que o amavam. Logo ele descobriu que podia escrever tão bem, ou melhor, sóbrio.


"A ideia que o esforço criativo e substâncias entorpecentes estão vinculadas é um dos maiores mitos intelectuais pop de nossa época. (...) Escritores dependentes químicos são simplesmente dependentes químicos". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 77)


***


A Caixa de ferramentas do escritor


Na primeira parte de "On Writing", King conta a trajetória dele como escritor. Na segunda parte, ele dá algumas recomendações ao escritor iniciante.
Sinceramente, o relato da própria experiência me soou bem mais autêntico do que as regras genéricas que ele apresenta posteriormente, mesmo assim, vou traduzir alguns trechos.


"As ferramentas básicas vêm primeiro. E a mais básica de todas, o pão da escrita, é o vocabulário. Neste caso, você pode empacotar feliz o que tem sem o mínimo de culpa ou inferioridade. Como a prostituta disse ao marinheiro acanhado: 'Não importa o tamanho, benzinho, mas como você usa'". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 114)


"Você também precisa da gramática no topo da sua caixa de ferramentas(...)
Ou se absorve os princípios gramaticais da língua nativa através de conversação e leitura, ou não se absorve. (...)
Assim que você começar (a estudar a gramática), descobrirá que você já sabe quase tudo, ou seja, é só uma questão de limpar as teias de aranha." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 118)


Depois ele enumera alguns elementos de estilística (defendidos à exaustão nos manuais de escrita americanos), como:


- nunca utilizar a "voz passiva", sempre tente encontrar um correspondente em "voz ativa", por exemplo:


Passiva - "O corpo foi carregado da cozinha e posto no sofá da sala".


Ativa - "Freddy e Myra carregaram o corpo para fora da cozinha e puseram-no no sofá da sala".


"(A voz passiva) é fraca, é um rodeio e frequentemente é tortuosa também". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 123)


- evitar usar advérbios, ou usá-los com extrema cautela.



"Não importa o quanto eu queira encorajar o homem ou a mulher que está tentando escrever seriamente pela primeira vez, não posso mentir e dizer que não há maus escritores. Desculpe-me, mas existem vários maus escritores". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 141) 

"Estou chegando ao âmago deste livro com duas teses, ambas simples. A primeira é que a boa escrita consiste em dominar o fundamental (vocabulário, gramática, os elementos do estilo) e então preencher o terceiro nível da sua caixa de ferramentas com os instrumentos corretos. A segunda é que, mesmo que seja impossível fazer um escritor competente a partir de um mau escritor, e mesmo que seja igualmente impossível fazer um grande escritor de um bom, é possível, com muito trabalho duro, dedicação e ajuda ocasional, fazer um bom escritor de um meramente competente." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 142)

"Críticos e eruditos sempre suspeitaram de sucessos populares. Geralmente, as suspeitas deles são justificadas. Em outros casos, tais suspeitas são usadas como uma desculpa para não pensarem." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 143) 


"Se você quer ser um escritor, você deve fazer duas coisas acima de tudo: ler muito e escrever muito. Até onde eu saiba, não há como evitá-las, não há atalhos". (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 145)


"Quase todo mundo consegue se lembrar quando perdeu a virgindade, e a maioria dos escritores pode se lembrar do primeiro livro que pôs de lado pensando: eu posso fazer melhor do que isto. Diabos, eu faço melhor do que isto! O que poderia ser mais encorajador para o escritor iniciante do que perceber que seu trabalho é inquestionavelmente melhor do que de alguém que realmente foi pago por sua obra?" (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 146)


"É difícil para mim acreditar que pessoas que leem muito pouco (ou nada, em alguns casos) pretendam escrever e esperar que outras pessoas gostem do que eles escevem, mas eu sei que isto existe. (...) Se você não tem tempo para ler, você não tem tempo (ou o instrumental) para escrever. Simples assim." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 147) 


"Agora vem a grande questão: sobre o que vou escrever? E a igualmente grande resposta: qualquer maldita coisa que você quiser. Qualquer coisa mesmo... desde que você diga a verdade.
(...)
Em termos de gênero, é justo presumir que você provavelmente começará escrevendo aquilo que você gosta de ler(...)
Não há nada errado nisto. O que seria muito errado, acho, é voltar as costas para aquilo que você sabe e gosta (...) para privilegiar aquilo que você acredita que impressionará seus amigos, parentes ou colegas de literatura." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 158)


"Compradores de livros não são atraídos, nem de longe, pelos méritos literários de um romance; compradores de livros querem uma boa história para carregar com eles no avião, algo que primeiro os fascinarão, então os agarrarão e os manterão virando as páginas. Isto acontece, acho, quando os leitores reconhecem as pessoas num livro, seus comportamentos, o que as cercam e a fala delas. Quando o leitor ouve fortes ecos de sua vida e crenças, ele está mais apto a se interessar pela história." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 160) 


"Escreva o que você gosta, então insira vida e torne-a única ao mesclar seu próprio conhecimento da vida, amizade, relacionamentos, sexo e trabalho. Especialmente trabalho. Pessoas adoram ler sobre trabalho. Sabe Deus porquê, mas elas adoram.(...) O que você precisa se lembrar é que há uma diferença entre palestrar sobre o que você sabe e usar isto para enriquecer a história. Este último é bom. O primeiro não." (KING, Stephen, On Writing. New York: Scribner, 2000. p. 161)


Depois deste ponto, o livro deixa de ser tão interessante, mesmo assim, é muito esclarecedor ver um dos maiores best-sellers do mundo se abrindo desta maneira, e revelando algumas constatações que obteve durante sua carreira literária, com todas as críticas que recebeu por causa da qualidade de sua escrita e pela visibilidade de suas obras.


Quem está exposto, deve estar preparado para as pauladas...

Thursday, February 16, 2012

Está instaurada a guerra entre escritores e editoras?


Não sou comunista, nem socialista, nem acredito que a palavra de Marx seja definitiva para encerrar qualquer debate sobre economia e a exploração do proletariado. No entanto, não podemos negar que as teorias de Marx foram um dos pontos altos da transição para o século XX, ao lado de Nietzsche e Freud.

Há uma frase de "O Capital", sobre o conceito de mais-valia, que nunca deixou a minha mente:

"Um escritor é um trabalhador produtivo não tanto por produzir ideias, mas por enriquecer o editor que publica suas obras, ou se ele for um trabalhador assalariado para um capitalista." (Capítulo IV, 3)

Para Marx, se o escritor se sujeita às regras do mercado, ele não é tão diferente de um torneiro mecânico, de um motorista de ônibus, de um caixa de supermercado ou de um executivo num escritório, pois de seu trabalho, e de seu consequente salário de miséria, deriva a riqueza dos donos do capital.

Um rápido vislumbre sobre como é feita a divisão do preço de capa de um livro nos esclarecerá mais esta exploração. Com o livreiro, ou livraria, fica 40% do valor, 15% para a editora, 25% para a gráfica e outros custos editoriais, 10% para a distribuidora e os 10% restantes para o escritor (dados de "A Economia da Cadeia Produtiva do Livro", BNDES).
Se um livro custa 40 reais, o autor ganha quatro reais, a livraria leva dezesseis reais, a editora ganha seis, enquanto os quatorze reais que faltam seriam referentes ao preço de custo, incluindo impressão, design de miolo e capa, etc.
O escritor, que está na origem da obra, sem o qual não haveria editoras e livrarias, sem o qual não existiria sequer Literatura, é o que menos lucra com esta estrutura, é o peão de obras do mercado editorial.

O escritor é o alicerce imprescindível, mesmo que tentem nos convencer do contrário.
Os escritores iniciantes são tratados como restolho, com indiferença ou desprezo. A inserção no mercado é difícil, quando não impossível, para muitos.

A maioria de nós amargará anos, ou décadas, de rejeição e, ao meu ver, isto serve para dois propósitos:
1 - separar os que tem persistência dos que não tem, e
2 - quebrar o ânimo dos autores, provar-lhes que são uns inúteis, para, quando um dia forem aceitos por uma editora comercial, eles erguerem as mãos para os céus e darem graças a Deus, contentes por terem se inserido no esquemão, independentemente de qualquer cláusula ridícula que esteja no contrato, ou qualquer futuro pagamento insignificante que venha a receber de direitos autorais.
"Vendi a alma? Tudo bem, pois agora fui publicado!"

Quantos farão sucesso, vendendo milhares de exemplares, a ponto de poderem viver somente da escrita?

Bem poucos, pouquíssimos!

O que a internet tem provado aos escritores?


A publicação independente sempre conviveu lado a lado com as editoras comerciais, pelo menos desde que houve a consolidação do mercado editorial, no início do século XIX, no auge da Revolução Industrial na Grã-Bretanha, EUA e França.
Balzac foi um dos autores que se aventurou no mundo da autopublicação e fracassou miseravelmente, com uma dívida que perdurou por anos.

Tanto nesta época como ainda em nossos dias, o calcanhar de Aquiles da publicação independente é a distribuição, como fazer os livros circularem e chegarem às mãos dos leitores.
Sem acesso às livrarias, às bancas de revista e aos supermercados, o autor independente tornava-se um vendedor de porta em porta, desesperadamente tentando socar sua obra goela abaixo de amigos e conhecidos.
Há uma anedota clássica sobre Jorge Luis Borges, quando foi publicada a primeira tiragem independente de seu livro de poemas "Fervor de Buenos Aires", que pediu aos amigos para enfiar o livro nos bolsos de pessoas influentes, críticos e escritores, para talvez causar algum burburinho.

No final do século XX, a internet se tornou um fenômeno e, por mais que muitos ainda não tivessem noção de como ela transformaria o mundo, era evidente que as distâncias estavam sendo encurtadas e o tempo de reação às novidades seria reduzido.
Era a realização da profecia de Andy Warhol que "no futuro, todos serão mundialmente famosos por 15 minutos".
Aos poucos, a distribuição deixava de ser o grande problema, mas sim como tornar-se visível em meio a uma multidão de famosos instantâneos e efêmeros.

O surgimento dos blogs, uma forma de publicação barata (ou gratuita), simples e acessível a qualquer pessoa no planeta, rompeu a cadeia tradicional de publicação escritor-editora-distribuidora-livraria-leitor. Desde então, a relação autor-leitor é feita sem intermediários, sem censura, sem mutilação da obra literária, por outro lado, também sem edição e muitas vezes sem senso autocrítico algum do autor.
Qualquer um pode dizer qualquer besteira para qualquer um.

No entanto, no fundo, o que a internet tem demonstrado aos escritores é que eles não necessitam mais passar por uma editora para serem lidos, para serem conhecidos e para se consolidarem como escritores de sucesso.
Nos próximos anos, veremos mais e mais casos de escritores bem-sucedidos que estarão fora do mercado literário, ou deixarão o mercado literário para se tornarem autores independentes, num ato de libertação de uma estrutura de exploração.

O caso do mercado norte-americano, ou o colapso da estrutura tradicional


Em 2011, a grande notícia do mercado de livros nos EUA foi o megasucesso do escritor John Locke, que vendeu mais de um milhão de livros digitais através da Amazon.com.

Mas, antes de tentarmos entender o que favoreceu esta façanha, temos de entender como funciona o mercado literário norte-americano.
Basicamente, além daquela cadeia que vimos, que começa no escritor e acaba na livraria vendendo o livro ao leitor, incluímos mais um intermediário, o agente literário.
A grande dificuldade dos escritores americanos não é somente conseguir uma editora, mas, antes, conseguir um agente literário para representá-lo.
O processo é o que se segue: o escritor envia cartas para alguns dos vários agentes literários do país, com um resumo de sua obra e por volta de umas dez páginas do manuscrito. Caso o agente se interesse pela trama e pela escrita, ele solicita o restante do material por correio e, por fim, se ele vir potencial de publicação naquela obra, o contrato é fechado e o agente inicia o contato com as editoras interessadas.
Se for um livro bom, será oferecido ao autor um adiantamento, entre 5 e 10 mil dólares, que será abatido dos direitos autorais das vendas futuras daquela tiragem. No entanto, se for uma obra extraordinária, ocorrerá uma espécie de leilão entre as várias editoras, que oferecerão adiantamentos maiores, já antecipando vendas futuras em paperback, um formato de bolso mais barato do que o hardcover, com capa dura para as primeiras edições. Estes adiantamentos podem chegar à casa de um milhão de dólares para grandes autores.
Depois, a cadeia segue normalmente, como no Brasil.

A maior parte dos autores norte-americanos não consegue nem um agente literário para representá-la, e vários que conseguem tem dificuldades para fechar contratos com editoras, isto num mercado muito mais aquecido e também mais competitivo do que o nosso.

Recentemente, assistimos à febre das POD (print on-demand), ou publicação sob demanda, uma saída genial para autores independentes que não podem ou não querem investir muito para a publicação de seus livros.
Há uma provedora de serviços que imprime somente os exemplares que venderam, ou seja, não há estoques nem desperdício.
Vendeu? Imprime o livro.
Não vendeu? Continua no catálogo até o dia em que alguém se interessar.
Muitíssimos autores vendem um ou dois exemplares somente, outros nem isto, mas há alguns casos de sucesso através de PODs.

Mas, aos poucos, o foco mudou do livro impresso para os livros digitais (ebooks), com custo praticamente zero, vendidos diretamente aos leitores, sem gastos com impressão, e a popularização dos leitores de ebooks representou um crescimento exponencial das vendas, enquanto ocorreu um decréscimo nas vendas de livros impressos.
A entrada na Amazon neste jogo, com a Kindle Direct Publishing, foi um balde de água fria nas editoras, ainda mais com as estatísticas de 2011 indicando que, pela primeira vez na História, os livros digitais estavam vendendo mais do que livros impressos, o que é muito fácil de se compreender, pois livros digitais são mais baratos, não ocupam espaço e você pode carregar centenas deles num único leitor de livros digitais.
O que poucos imaginavam, ou se recusavam a aceitar, ocorreu num intervalo de poucos anos. Todos aqueles que apregoavam que o livro digital jamais substituiria o impresso, que há o cheiro do papel, a sensação de tocar o livro, de vê-lo na prateleira de casa, todos estes estão agora mordendo os cotovelos, tentando entender o que aconteceu.
Era digital chegou, do MP3, do Youtube, do JPEG e do ebook, atropelando todos aqueles que dormiram no ponto.
Esta é a realidade que a editoras e livrarias americanas estão tendo de digerir e de se readaptar, não sem as fatalidades no caminho, como grandes livrarias fechando as portas, agentes literários deixando o negócio e pequenas e médias editoras desaparecendo ou sendo devoradas pelas big six (HarperCollins, Penguin, Hachette, Simon & Schuster, MacMillan e Random House).

Voltando, então, a John Locke e seus um milhão de ebooks vendidos, que abriu os olhos de numerosos autores publicados comercialmente e, convencidos pela Amazon com percentuais de direitos autorais mais apetitosos, iniciaram uma debandada sem precedentes no mercado americano, trocando grandes editoras pelo publicação independente online.
A lista de best-sellers fugindo da exploração editorial é grande, mas muitos deles são desconhecidos em nossas terras tupiniquins.
Todavia, no Brasil, com a chegada da gigante Amazon, já vemos autores de peso, como Paulo Coelho, embarcando nesta. Se o maior best-seller da História do Brasil e um dos mais vendidos autores do mundo considera isto um bom negócio, talvez esteja na hora de você também abrir o olho.

Seria esta a declaração de guerra dos escritores às editoras? Ou podemos esperar um contra-ataque em breve?

Wednesday, February 15, 2012

O papel da imprensa e da mídia na carreira de um escritor. O que muda?


A primeira vez que um grande jornal, revista, rádio ou emissora de TV o contacta para uma entrevista, você pensa que sua vida mudará.
Se você é um autor independente ou um blogueiro, tem expectativas que aquela reportagem atraia a atenção dos editores e, quem sabe, ajude-o a fechar um bom contrato.
Quem não assistiu ao filme "Julie e Julia", sobre uma blogueira de culinária que faz sucesso após aparecer num jornal, recebendo ligações de agentes literários, editores e de outros jornais, e não sonhou com esta mesma cena?

Se você é um autor publicado comercialmente, espera que uma boa crítica estimule os leitores a comprarem seu livro, dê mais visibilidade a sua obra e que talvez você consiga competir com os grandes sucessos do momento.

Desde crianças, somos bombardeados pela influência onipresente da mídia, através da televisão, da rádio, do cinema, da internet, dos jornais, das revistas, dos livros, da publicidade, ao ponto de acreditamos fielmente neste novo deus e, que no dia em que fizermos parte dele, nossa carreira se transformará milagrosamente.

Mas, no Brasil, milagres desta espécie raramente ocorrem, se é que um dia ocorreram. Em termos práticos, a imprensa não afeta em nada, nem para positivo ou negativo, com raríssimas exceções.

Mamãe, olha eu na TV!


O brasileiro é um povo historicamente movido pela televisão. É, ou era até o advento da internet, o poder supremo de comunicação.
Uma novela da Globo era capaz de parar a nação no último capítulo, e a chamada do plantão extraordinário tem o poder de deixar todos em silêncio, com a mão sobre a boca, tensos, para saber qual pessoa importante morreu ou qual é a catástrofe do dia.
A TV sempre ocupou o lugar dos livros, dos jornais impressos, das revistas e das rádios na maioria dos lares brasileiros e, de fato, ainda é a única mídia capaz de transformar uma carreira ou acabar com uma reputação.
A primeira entrevista que dei foi para a Globo, para um programa específico para a Globo Internacional, ou seja, que passaria em cento e tantos países, menos no Brasil!
Naquele instante, eu e minha esposa decidimos que estava na hora de transformar o nosso blog em livro e começar a vendê-lo. Tínhamos certeza que muita gente assistiria ao programa e se interessaria em comprar o nosso produto.
E estávamos certos: posso dizer que ali, em janeiro de 2008, foi que minha carreira como escritor profissional realmente começou. Os oito anos antes havia sido apenas um ensaio.

Mesmo que aparecer na TV e em um programa de influência, como um telejornal, talk-show ou algum programa de auditório não transforme a carreira de ninguém, certamente dará bastante visibilidade e atrairá milhares de curiosos.
Provavelmente você venderá uns dez ou vinte livros a mais do que o normal, ou um pouco mais se tiver sorte.
Seus amigos e parentes ficarão morrendo de orgulho e, por um dia, você será uma estrela.

Mas, na manhã seguinte, tudo retornará ao normal.

Ouvi na rádio


Seus avós e talvez seus pais cresceram sob a influência da rádio, que era o meio de comunicação mais importante até que a TV roubou toda a atenção. Muita gente ainda ouve rádio no carro, principalmente quando estão presos em engarrafamentos-monstros, e vários programas televisivos, como jornais, também acabam sendo transmitidos em FM ou AM.

No entanto, de fato, sua influência é incrivelmente inferior, mesmo de uma grande emissora de rádio, do que de qualquer programinha de TV.

Seu público não aumentará e é improvável que você venda um exemplar sequer por ter falado na rádio, a não ser que você seja o radialista e possa vender o seu peixe todo o santo dia.
Imagino que isto ocorra por algumas razões: primeiro porque a audiência não é tão grande quanto para a TV, obviamente; depois, porque se o sujeito está escutando a entrevista de dentro do carro, ele não vai parar na primeira esquina para anotar o nome do entrevistado e o título do livro, e correr para a livraria mais próxima.
A notícia entrará por um ouvido e sairá pelo outro.

O bom é que os seus amigos e parentes também ficarão orgulhosos de você!

O jornal de domingo enrolado embaixo do braço


Aparecer num jornal é uma sensação incrível, ainda mais se você ganhar uma reportagem de página inteira com a sua cara estampada nela, o que é raríssimo.
No entanto, não podemos nos esquecer que as tiragens da maioria dos jornais não são tão grandes assim, que eles tem influência regional (se desconsiderarmos os grandes jornais distribuídos nacionalmente) e que amanhã a sua cara estará embrulhandos copos para a mudança, ou servindo para forrar o cocô do totó.

Alguns curiosos procurarão por seu livro, mas não serão tantos assim. Se você der sorte e cair nas mãos de um repórter competente, o que você disse ou escreveu entrará quase literalmente na reportagem, mas se for um jornalista muito criativo, prepare-se para ler informações totalmente esdrúxulas, sem nenhuma relação com a realidade e você se questionará: "de onde saiu isto?!"

Eu lhe asseguro que ver escritas informações errôneas ou que você não disse também é uma sensação incrível. Mas não é nada boa...

Nas bancas de revista


Ao contrário do jornal, o tempo de vida de uma revista é um pouco maior, portanto, a visibilidade também.
Todavia, o número de leitores é geralmente muito menor e a repercussão é pouca, a não ser que seja uma revista muito especializada ou influente.
Você responderá uma porção de perguntas, crente que a reportagem sobre seu trabalho será enorme e, quando vir, saiu duas linhas com uma frase sua.
Mesmo assim, agradeça se esta frase foi realmente dita por você daquela maneira, pois não é garantia.

Sites e blogs


O que direi agora pode parecer inacreditável para muitos, mas um blog ou um site de sucesso pode dar muito mais visibilidade do que outros meios de comunicação tradicionais.

Atualmente, existem blogs que recebem centenas de milhares de visitantes ao dia e que, se este blogueiro resolver criar um link para o seu trabalho, esteja certo que algumas centenas ou até milhares de curiosos virão conferir.
É o complexo de dedo nervoso da internet: parece que somos obrigados a clicar em todos os links que aparecem em nossa frente, basta que tenha uma ou duas palavras que nos atraiam.

O ideal é que seja um interesse espontâneo, que aquele blog influente se interesse genuinamente por seu trabalho e queira recomendá-lo, mas é óbvio que este sistema pode ser burlado, seja pagando pelo link, seja realizando uma troca de links, isto é, você manda gente para cá, que eu mando gente para aí.
E na maior parte dos casos, este site ou blog possui um público-leitor bastante semelhante ao seu, e há chances maior daquele leitor também passar a seguir o seu trabalho.

Todavia, um blog muito influente dificilmente terá interesse em trocar links com um blog desconhecido, ou seja, você precisa já ter criado uma reputação antes de sair pedindo favores a todo o mundo.

Sites de jornais e revistas parecem ter uma abrangência maior de público do que as versões impressas, então, via de regra, você terá uma visibilidade melhor se aparecer num jornal online.

Contratando um assessor de imprensa

Alguns preferem contratar um profissional para ajudar a difundir sua imagem ou seu novo trabalho, "plantando" a pauta nos veículos de comunicação, mas não tenho ideia de valores ou de como funciona este serviço.
Todas as vezes que aparecemos na imprensa, foi porque os jornais, programas de TV, sites, rádios ou revistas se interessaram pelo nosso trabalho e nos contactaram.
Sugerimos pauta uma ou duas vezes, mas nestes casos não houve resposta alguma.

Para que serve aparecer na imprensa?

Você não venderá tantos livros a mais nem ficará tão conhecido ao aparecer através da imprensa, isto é fato.

No entanto, uma aparição atrairá outras, especialmente se for em alguma reportagem importante. Jornalista atrai jornalista, e vários deles correm para ler a seção "imprensa" dos escritores ou blogueiros que entrevistam, para conferir se o que você já disse é interessante.
Comumente, você não terá ideia de como eles descobriram seu trabalho, a não ser que você tenha escrito um livro:

1 - muito bom e premiado;
2 - muito bizarro ou polêmico;
3 - muito útil e interessante;
4 - muito engraçado e popular.

Inclusive, um livro pode ser as quatro coisas juntas, o que é muito melhor para divulgação de sua obra.

A maior vantagem de aparecer na imprensa é que, mesmo como autor independente, isto ajuda a consolidar sua credibilidade e é o reconhecimento dos formadores de opinião. Esta é uma das instâncias de legitimação de um escritor, e mesmo uma reportagem errônea (desde que não o denigra, é claro!) pode servir para divulgar o seu trabalho.

Inclusive, existem alguns casos famosos de autores que foram detonados pela imprensa, como Edgar Allan Poe e Paulo Coelho, que se consolidaram apesar ou até por causa deste massacre midiático.

Vai saber, às vezes até comprar briga com a imprensa também contribua, de alguma maneira, para uma carreira literária...

***

Caso você queira conferir algumas reportagens já feitas sobre o meu trabalho, você pode seguir para cá, ou aqui.

Sunday, February 12, 2012

Já foi mais fácil, ou como era a vida de um escritor nos séculos passados


Já foi mais fácil, mas também já foi muito mais difícil escrever.

Vira e mexe ocorre-me um ditado que ouvi muito de minha vó, e repetido em demasia por minha mãe, que em "terra de cego quem tem um olho é rei". O fato é que este ditado deveria ser erigido como uma das grandes verdades da humanidade, ao lado dos provérbios de Salomão e do Sermão da Montanha.

Não muito tempo atrás, havia uma legião de analfabetos ao redor do mundo. No Brasil, as campanhas maciças de alfabetização foram um legado de Getúlio Vargas, enquanto na China, de Mao Tsé-Tung. No Egito faraônico, havia uma classe especial para registrar a História e redigir os documentos; na Idade Média, a escrita e a leitura eram primazias do clérigo ou das pouquíssimas universidades. Ser um escritor era pertencer à elite de uma já elite, era uma tarefa admirável e única.

O contador de histórias, o vate, o bardo ou o menestrel eram os narradores populares, muitas vezes itinerantes, vagando de cidade em cidade difundindo a sua arte, enquanto os escritores eram os representantes da alta cultura. Havia uma linha divisora muito clara entre estas duas formas de arte.


A invenção da imprensa por Gutenberg foi uma grande revolução no mundo da escrita, comparável à elaboração do alfabeto. Pela primeira vez, era possível produzir livros em grande escala, mesmo que esta grande escala fosse ridícula em comparação aos parâmetros atuais: estima-se que a primeira tiragem da Bíblia de Gutemberg foi de uns 180 exemplares.
Todavia, rapidamente surgiram os primeiros best-sellers. Erasmo de Rotterdam vendeu em vida mais de setecentos e cinquenta mil exemplares de sua obra, enquanto Martinho Lutero mais de trezentos mil.
A escrita havia mudado, e transformava para sempre também o mundo, nada mais seria igual.

Por vários séculos, a escrita e a leitura ainda continuaram um ofício feito pela e para uma elite, mesmo após a revolução burguesa. Talvez a vida de um escritor não fosse tão mais fácil do que a nossa nos dias de hoje; sobreviver somente de direitos autorais também era um desafio, como a história clássica de Edgar Allan Poe vendendo os direitos do poema "O Corvo" por míseros nove dólares.
Ainda era necessário estar no lugar certo, na hora certa e conhecer as pessoas certas e, para se tornar um grande escritor, era obrigatória uma passagem pelos principais centros culturais do Ocidente - Londres, Paris, Nova York, São Peterburgo -, pois era onde tudo estava acontecendo.
Entretanto, "em terra de cego quem tem um olho é rei" e, num mundo onde poucos liam e menos conseguiam escrever com competência, encontrar o seu lugar era muito mais simples, ser publicado era bem menos doloroso.


Temos obviamente os renegados, sujeitos como Nietzsche, Kafka, ou Fernando Pessoa, autores brilhantes e que não tiveram a chance de ver suas obras publicadas ou lidas por um grande público. Mas a posteridade lhes pagou reverência, mas também porque talentos extraordinários eram tão raros, que desencavar manuscritos de desconhecidos e trazer à luz as obras de gênios ainda era factível.

Então, todos aprenderam a ler. E todos aprenderam a escrever. E todos decidiram tornar-se escritores.

Foi quando se descobriu que ter boas ideias e escrever bem não eram habilidades para poucos. Há tanta gente talentosa espalhada pelos quatro cantos do planeta que, a princípio, podemos nos surpreender.
Contudo, a luz não há de brilhar sobre todos estes talentos, pois isto é impossível. Existem limites nas prateleiras das livrarias e nos catálogos das editoras, e apesar de haver leitores para todo o tipo de livros, nem todos os livros merecem ser publicados.

Antigamente, a tarefa de um editor era selecionar um ou dois autores para publicação dentre um grupo limitado.
Hoje, há uma multidão de escritores e suas milhares de obras estão além de qualquer avaliação possível. O editor ainda tem de selecionar um ou dois autores para publicação, mas agora o grupo é imenso e inabarcável.

Como destacar-se? Como sobressair-se?

Escrever bem já não é um diferencial, isto qualquer um pode fazer. Muitos sonhavam em se tornarem o próximo best-seller, vendendo milhões de livros e vendo sua história nas telas cinema, mas esta é uma realidade cada vez mais distante.
Em nossa época, da comunicação em tempo real diretamente com nossos leitores, penso que o caminho é encontrar o seu nicho, aquele círculo de pessoas que se interessa em ler seus livros e que possa sustentar seu ofício.
O bolo da Literatura cresceu, mas as nossas fatias serão cada vez menores.

Já foi mais difícil, mas também já foi muito mais fácil.

Thursday, February 09, 2012

Microcontos e a dissolução da narrativa


A moda atual entre os escritores são os micro e os nanocontos, que encontrou na internet uma mídia privilegiada.
Através de histórias miniaturizadas, disseminadas através das redes sociais, espalhamos fragmentos de Literatura para quem tiver olhos para ler.

Um romance e suas centenas de páginas exigem do leitor tempo, paciência, atenção e concentração. Mesmo na leitura descompromissada, no metrô, no ônibus ou no avião, uma narrativa longa demanda do leitor a compreensão e a disposição para galgar o enredo e acolher os personagens. Pois uma narrativa longa deriva do desenvolvimento, da elaboração da psiqué de seus personagens e da coerência estrutural da obra.

Em oposição, temos o conto ou a narrativa breve, focalizada em um evento, com poucos personagens, pouca ambientação, num intervalo breve de tempo. É da concisão que um conto se constrói e, em algumas teorias, uma definição vaga para este gênero é de um texto ficcional que possa ser lido de uma só vez, apesar de haver vários casos de contos longos o suficiente para exigirem duas ou mais incursões.

Um gênero muito mais recente, aparentado do provérbio e do aforismo, é o microconto ou o nanoconto: a súmula máxima da narrativa.
Em muitos microcontos, temos apenas um ou dois personagens, quase sem ambientação e, frequentemente, com desenvolvimento brevíssimo do enredo, praticamente inexistente. A maioria dos nanocontos são apenas instantâneos, ou vislumbres da vida, como quem olha de passagem.
É exatamente neste ponto que surge o maior dos mal-entendidos...

Vários autores confundem brevidade com facilidade, quando é justamente o oposto. A brevidade é a técnica mais difícil de se dominar, uma arte para pouquíssimos.
O microconto é a hipérbole do conto; não pode haver uma vírgula, um artigo, um pronome, um adjetivo em excesso. Uma linha ou duas desnecessárias é uma atrocidade imperdoável, e até mais do que isto, um microconto que não atinja o coração ou a mente do leitor, reverberando por horas ou dias, não deveria ter sido escrito, não tem razão para existir.

No entanto, o domínio da escrita de microcontos assemelha-se, em parte, ao do humor e da concepção de chistes, inclusive na própria temática e desenvolvimento, muitas vezes em tom cômico. É através da escrita, divulgação e da recepção dos leitores que o autor refina sua técnica, detectando que espécie de micronarrativas funcionam melhor. E isto se dá à vista do leitor, com sucessos e fracassos narrativos dividindo o mesmo espaço.

Por outro lado, por melhor que um microconto seja, ao disputar atenção com várias outras atualizações do mundo virtual, como fotos, vídeos, músicas, piadas e textos não literários, a vida útil de uma narrativa brevíssima também é muito curta. É necessária uma produção frenética para a fidelização dos leitores e a repetição torna-se quase inevitável.

Dedicar uma carreira literária a microcontos me parece um grande equívoco, muito maior do que para poemas e contos mais longos, que desde há muito é considerado por alguns um suicídio literário, com possibilidade próxima de zero de publicação através de grandes editoras.
Apesar de toda a empolgação em torno das micronarrativas e de não ser um gênero passageiro - inclusive, talvez o gênero passageiro seja o próprio romance, em vias de extinção, quem sabe? -, não vejo como um autor consiga desenvolver um personagem interessante em tão poucas linhas.

A princípio, lemos porque nos identificamos, porque nos vemos retratados na história, porque gostaríamos de ser como aquele herói ou mocinha, ou porque a Literatura nos abre portas para mundos que não conhecemos.
Fragmentos da realidade, que nos toma segundos para lê-los, também nos proporcionam fragmentos de experiência. Sem a imersão, sem o aprofundamento, perdemos também boa parte do que torna a Literatura uma atividade tão interessante.

Por fim, a falsa sensação de facilidade das micronarrativas tem atraído uma legião de escritores que não teria a competência para narrativas mais longas, mas que também tem pouca ou nenhuma competência para as narrativas breves.
O fato é que alguns candidatos a escritores não merecem nem cento e quarenta caracteres.

Friday, February 03, 2012

Notas desde o terceiro escalão da Literatura


Não deveria, mas existe um hierarquia até no mundo do escritores.

E nem estamos falando de toda a estrutura editorial, passando por donos de editoras, editores, pareceristas, revisores, distribuidores, livreiros, críticos, professores de Literatura, leitores, etc. Trata-se de uma hierarquia no interior do próprio ofício da escrita, que distingue um escritor do outro.

O topo da hierarquia, os best-sellers e os aclamados

O primeiro escalão é dos autores megafamosos ou reconhecidíssimos, daqueles que, ao mencionarmos o nome, mesmo que não se tenha lido livro algum deles, imediatamente sabemos de quem se trata.
Ninguém precisa ter lido obras de Kafka, Dostoievsky, Dickens, Umberto Eco, Machado de Assis, Sidney Sheldon ou Paulo Coelho para, no ato, já exclamar, "sim, sim!". É o reconhecimento instantâneo.
Neste topo da hierarquia, temos um percentual ridiculamente insignificante dentre todos os escritores.

Não se engane: a Literatura, assim como a vida em geral, é uma loteria. Alguns conseguem um bilhete premiado, mas a maioria de nós não. É a ilusão do sucesso potencial, do reconhecimento futuro, da glória eterna que move todos os escritores ao redor do mundo. Todos, em algum nível, esperamos ser reconhecidos por nossos contemporâneos ou pelos pósteros, todavia, bem poucos chegarão lá.

E não há regra nem lógica nesta promoção. O cânone e o sucesso são essencialmente inexplicáveis. Existem todos os tipos de teorias sobre isto, desde decisão política até a recente hipótese das dez mil horas de trabalho, mas, no fundo, não há explicação plausível: alguns simplesmente nascem agraciados e prosperam.

O segundo escalão, os famosos anônimos

Em seguida, temos aqueles autores que já obtiveram um certo grau de reconhecimento, mas nada muito significativo. Talvez até sejam conhecidos por um pequeno grupo de leitores e críticos, com algum grau de visibilidade na imprensa e que tenham vendido poucos milhares de livros.
Geralmente, já foram publicados por grandes editoras e podem vir ou não juntarem-se ao primeiro escalão em algum momento vindouro.

Assim como ocorre com quase a totalidade dos escritores, mesmo com muitos do primeiro escalão, não conseguem viver somente da escrita, tem de dividir seu tempo entre palestras, traduções, escrevendo colunas para jornais ou até mantendo um trabalho de tempo integral, escrevendo apenas nas horas vagas.
Ainda não lhe disseram que Literatura não paga as contas?

Isto era verdade no tempo de Balzac, no de Poe, no de Joyce e no nosso também. Provavelmente, esta realidade perdurará até o final dos tempos: escrever dá pouco ou nenhum dinheiro, então deve-se escolher a penúria ou um segundo emprego, não há saída.

Esta é a dura situação que os autores do segundo escalão descobrem assim que fecham o contrato com alguma editora. Provavelmente, muitos deles tinham a ilusão que tudo mudaria daquele dia em diante, mas, com o passar dos meses e dos anos, com relatórios de vendas pífias e deprimentes pagamentos de direitos autorais, percebem que o buraco é mais embaixo.

Ser publicado não é a solução, às vezes, pode até ser mais um dos problemas que o autor tem de enfrentar, pois não basta mais apenas escrever, ele tem de se tornar também o marqueteiro, o assessor de imprensa de si próprio, o palestrante e, às vezes, até mesmo o vendedor de seus livros. Se pensava que teria mais tempo para dedicar-se somente à escrita, logo aprenderá que lhe restará ainda menos tempo, pois a obra não anda com as próprias pernas, precisa de supervisão constante antes que comece a engatinhar e a caminhar.

O terceiro escalão, os anônimos emergentes

Alguns escritores estão no meio do caminho. Ainda não foram publicados comercialmente, ou às vezes por pequenas editoras com pouca ou nenhuma distribuição, o que é quase o mesmo de não ter sido publicado, mas já possuem algum tempo de estrada, conhecem vários percalços da carreira e, quem sabe, em breve, eles se converterão num dos "famosos anônimos".

Neste terceiro escalão, o escritor talvez até tenha um ou mais livros publicados independentemente, muitos que acabam sendo distribuídos para amigos que não os leem ou ficam a mofar em pilhas num quartinho de casa. Podem ser do tipo franco-atirador, publicando seus textos em todos os blogs, sites, revistas literárias, distribuindo gratuitamente suas obras ou vendendo-as a preço de banana. Estão desesperados por um pouco de atenção, por uma mão amiga de algum editor, crítico ou escritor reconhecido que perceba o seu talento e o ajude na publicação, enfim, por uma grande editora.

Estes autores até são conhecidos por um pequeno grupo de leitores, ou por seus pares, já que caminham todos juntos. Às vezes, chegam a ter uma legião de seguidores, o que contribui para catapultá-los ao sucesso. É provável que tenham ganhado um concurso literário ou outro, mas nada representativo o bastante para lhe abrir as portas.

Muitos dos escritores jamais transporão este limiar, continuarão para sempre apenas uma boa promessa de sucesso que jamais se realizou. Alguns aparecerão em reportagens locais, em jornais, rádio ou TV, e só. Outros se tornarão escritores reconhecidos, um dia, mas tudo dependerá da loteria da vida, da estrela que brilha, da sorte imprevisível.

O quarto escalão, os anônimos otimistas

Geralmente, estes são os escritores que decidiram ontem que querem viver da escrita. Ainda não conhecem os percalços da Literatura, não tem ideia de como é difícil publicar e, frequentemente, ainda não escreveram nem um livro sequer.

Tais autores redigiram uma meia dúzia de contos ou poemas e acreditam que isto os transformou automaticamente em escritores. No entanto, ainda morrem de medo de divulgar seus trabalhos, apavorados que alguém plagie ou roube suas obras geniais. Ninguém lhes disse que, primeiro, são poucas as chances de alguém roubar ideias de um escritor desconhecido e provavelmente medíocre e, depois, que não há como proteger ideias, apenas a literariedade do texto, ou seja, se quiserem roubar sua ideia, não há do que reclamar.

Estes escritores tem uma noção idealizada da carreira literária e acreditam fielmente que seus livros mudarão o curso da humanidade, que ficarão ricos e famosos, ou que a mulherada cairá aos seus pés nos lançamentos.

Muitos não possuem a mínima bagagem teórica e pensam que um romance é um conto ampliado, ou que novela é o que passa na televisão no horário nobre. Há uma grande incidência de adolescentes neste escalão e que não tem o hábito de leitura, ou habituados a ler gêneros e autores bastante específicos, redigindo de maneira bastante parasitária.

Frequentemente, demora anos até que eles se libertem do fantasma da influência e descubram suas próprias vozes, isto se não desistirem da escrita antes disto.

A base da hierarquia, os não-escritores

Por fim, deparamo-nos com o quinto escalão, que são aqueles escritores que ainda não escreveram nada. Por mais paradoxal que isto possa parecer, quase todas as pessoas acreditam que existe um escritor dentro de si, ou como muito se repete, "a minha vida daria um livro".
Via de regra, a vida de praticamente todo o mundo daria um livro, tedioso, mas daria!

São os procrastinadores, os que pensam que, quando se aposentarem, então terão tempo o suficiente para viverem o sonho da escrita. Alguns acreditam que conceber frases bonitas ou haikais mal engendrados já é o bastante. Outros começam, começam, começam a escrever suas obras-primas, mas simplesmente são incapazes de concluí-las.
Talvez até tenham boas ideias ou dominem as regras gramaticais e ortográficas, mas isto não os torna escritores.

A escrita é o que torna alguém escritor, e também a publicação em papel ou digital, e também o reconhecimento dos pares e dos leitores. Tudo está atrelado.

Conclusão

Como qualquer hierarquia, ninguém começa pelo topo.

Leia qualquer biografia de grandes escritores e notará a recorrência. Quase todos começam a escrever duvidando do próprio talento; muitos unem-se a outros escritores desconhecidos, com quem aprendem e se aperfeiçoam, além de criar um círculo de influência; a maioria publica suas primeiras obras independentemente e obtém resultados quase nulos; então, conseguem atrair a atenção de algum editor com visão e, durante décadas, amargam um fracasso após o outro, este é o percurso do crescimento pessoal e do refinamento das técnicas literárias; enfim, produzem uma grande obra, que é o chamariz para seus trabalhos pretéritos e que consagra sua carreira, comumente este é o início do declínio na produção, da autorreferenciação, mas com um público já estabelecido, isto deixa de ter relevância.
Quando se atinge o topo do hierarquia, tornando-se uma das "vacas sagradas", quase tudo é permitido.

A transição de um escalão ao outro é praticamente imperceptível e indolor. Os únicos marcos realmente identificáveis são a publicação através de uma grande editora e a venda de mais de cem mil exemplares, o primeiro de que você se tornou um dos "famosos anônimos", o outro que você finalmente está no topo da pirâmide.
Mais do que isto, somente a imortalidade literária, a inserção na História da Literatura, mas isto é tão raro e para tão poucos, que está fora do alcance da vasta maioria dos escritores que já passou pela face da Terra.
Contente-se se você conseguiu vender alguns milhares de livros; isto deveria ser o bastante, é muito mais sucesso do que a maior parte dos escritores obterá.
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