Wednesday, March 14, 2012

A escrita e as redes sociais, indo aonde os leitores estão


Qualquer autor em início de carreira, e com isto me refiro aquele que acabou de ter um estalo e dizer para si "vou me tornar um escritor", pensa que a maior dificuldade da carreira literária é escrever um livro.

Escrever livros é o que há de mais fácil, tudo que você precisa é de um pouco de tempo e desenvolver a trama página após página. E nem precisa ser um livro muito grosso, se já tiver umas 80 páginas, você já tem uma obra em mãos.

A maior dificuldade da escrita, o maior desafio de todos é ser lido, conquistar os leitores e, o pior de tudo, convencê-lo a comprar este seu livro.

Quem são os leitores?

Os leitores estão por aí, espalhados pelo mundo, e não são muito diferentes de você. Alguns leem porque gostam; outros gostam de ler, mas não tem dinheiro para comprar livros; há os que leem ocasionalmente, quando não há mais nada para se fazer; e existem aqueles que leem por obrigação, seja para a escola ou para o trabalho.

Além disto, existem todos os tipos de gostos de leitura, uns preferem ficção científica, outros romances românticos, terror, aventura, mistério, fantasia, livros técnicos, de filosofia, de política, jornalísticos, de auto-ajuda ou espiritualidade.
Para cada gênero literário ou tema, existe pelo menos um leitor neste planeta.

E como é feita ponte entre o leitor e um livro que talvez o interesse?

Este é o grande mistério do negócio. Alguns simplesmente vão a livrarias, folheiam as obras e escolhem uma que parece ser instigante, outros recebem indicações de amigos ou professores, outros leem as críticas em jornais ou revistas, ou se empolgam com alguma obra de um autor e resolvem ler as outras que ele escreveu.
Mas, no fundo, tudo se resume a uma questão de visibilidade. Aquilo que está em evidência, na moda, ou abordando um assunto polêmico atual tem muito mais chances de chamar atenção para si.

Os seres humanos se articulam em padrões, esta é uma estratégia de sobrevivência e um dos segredos da nossa adaptabilidade. Temos instintos, pois somos animais, e também somos racionais, todavia, muitos de nossos comportamentos são determinados por padrões externos: "se os outros fazem, então é bom e eu deveria fazer também".
Todas as pessoas tem uma "Maria vai com as outras" dentro de si e esta é a chave de vários sucessos fenomenais que vemos por aí. Às vezes, sentimo-nos obrigados a ver um filme, ler um livro ou ouvir uma música, simplesmente porque todos estão comentando e não queremos ficar de fora, mesmo que seja para falar mal depois.

E onde entram as redes sociais nisto?


O autor estreante, e neste caso me refiro a alguém que escreveu pelo menos um livro e talvez até o tenha publicado, tem grandes dificuldades para se tornar visível no mercado.
Primeiro, porque está disputando espaços nas prateleiras das livrarias, na mídia e no orçamento dos leitores com best-sellers, isto é, com aqueles que já tem visibilidade.
Depois, justamente por ser desconhecido, seu livro não pertencerá àqueles padrões de consumo das pessoas, que compram o que faz sucesso apenas porque é o que está fazendo sucesso, ou melhor, ele estará no ciclo inverso: "se ninguém está comprando, é porque deve ser ruim".

Como autor estreante e desconhecido, a fidelização dos leitores precisará de um corpo a corpo muito mais agressivo do que no caso de autores de sucesso (que provavelmente tiveram de suar muito a camisa antes de emplacarem um hit) e, em nossos tempos, isto implica em saber utilizar as ferramentas virtuais, ou as redes sociais.

Um termo que passou a ser utilizado muito na era digital é "viral". Quase toda campanha de propaganda online deseja ser como a gripe, ou como o ébola, isto é, contaminha um, que contamina outros e, quando se vê, estão todos infectados.
Enquanto que uma pandemia destas proporções é o terror da medicina contemporânea, este é o sonho de qualquer marqueteiro, fazer uma campanha viral.
O desempenho viral nada mais é do que o boca a boca elevado à enésima potência. Se você, enquanto sujeito concreto, gosta de um livro, você o indicará para uma meia dúzia de pessoas, parentes e amigos mais próximos.
No entanto, através das redes sociais, você estará indicando para suas centenas de amigos virtuais (quase todos nós temos centenas ou milhares de amigos, ninguém quer ter menos do que 50 para não correr o risco de ser considerado antisocial!), que, se gostarem da sua indicação, repassarão para as centenas de contatos deles e assim respectivamente.
Na internet, a informação se propagada com uma velocidade e com proporções inacreditáveis, tanto para o bem quanto para o mal.

Qualquer autor estreante deveria dedicar alguns minutos de seu ofício de escritor para estabelecer uma boa comunicação com seus leitores online.
Você logo descobrirá que é muito mais fácil conseguir um seguidor no Twitter ou um amigo no Facebook do que é vender de fato um livro. Mesmo assim, você estará criando um vínculo com um leitor potencial, mesmo que este leitor esteja no fim de uma cadeia viral.

Não se pode jamais desprezar o poder do boca a boca.

Os revezes das redes sociais

É óbvio que nem tudo é uma maravilha neste mundo virtual, longe disto.

É fundamental estabelecer um limite de interação nas redes sociais, pois cada linha escrita na internet é uma linha a menos em sua obra literária.
Entendo que alguns prefiram criar diretamente em ambiente virtual, como os nanocontos que se proliferaram nos últimos tempos, mas se você é adepto da narrativa longa, como romances ou novelas, quanto mais tempo você passar online, menos tempo você estará criando.
E é muito fácil deixar-se seduzir e acabar protelando outras coisas mais importantes, às vezes sem relação nenhuma com a escrita, para ficar horas papeando ou vendo vídeos na internet.

Além disto, a repercussão ao que você escreve, isto quando você já obteve um número significativo de leitores, é instantânea. Basta um deslize, uma frase fora do contexto ou de mal gosto para arruinar sua reputação. Autocrítica é essencial antes de publicar qualquer coisa na internet, pois, mais do que nunca, "há quatro coisas que não voltam atrás: a pedra atirada, a palavra dita, a ocasião perdida e o tempo passado".
Qualquer coisa que você escrever na internet pode se voltar contra você um dia, e isto é um fato.

Por fim, quase todas as relações na internet são bastante efêmeras. A maioria dos seus amigos em redes sociais está longe de ser seus amigos de fato. E o mesmo vale para os leitores.
Ter leitores em blogs não quer dizer que você terá leitores para seus livros.
No entanto, para muitos, o simples fato de haver gente interessada no que você escreve, mesmo que não se ganhe um tostão com isto, já é a maior das recompensas.

Conclusão

Na era digital, o autor deve estar mais próximo do que jamais esteve de seu público potencial.

A quantidade de leitores neste mundo é imensa e, certamente, haverá alguns que se interessarão em conhecer e ler sua obra, basta fazer um esforço e tentar encontrá-los.

A internet e as redes sociais são, ao mesmo tempo, aliadas e inimigas dos escritores. Por um lado, permitem o contato direto com os leitores e a divulgação viral, por outro, devora parte do tempo da criação e, por seu efeito instantâneo e imediato, pode acabar se voltando contra o próprio autor.

São duas ferramentas que os autores contemporâneos precisam dominar. Numa era onde a publicação independente tem se tornado muito mais fácil e frequente, o escritor tem de ser também o criador de sua própria imagem e seu próprio divulgador, enfeixando mais estas dentre várias outras atribuições.

Escrever livros é fácil, o difícil é e sempre foi encontrar os leitores.

Monday, March 12, 2012

Escritor sim, blogueiro não!


Escritor?

Culpem Aristóteles, mas desde sempre nos acostumamos a categorizar tudo, de espécies de animais e plantas a profissões e saberes. Basta nos depararmos com alguma coisa exótica e desconhecida, que logo precisamos compará-la a outras e tentar enquadrá-la num gênero, numa espécie ou numa categoria.

O mesmo ocorre com as profissões: há os médicos, os engenheiros, os motoristas de fórmula 1, os pedreiros, as secretárias, os astronautas, os técnicos em informática, e assim por diante. Nas Artes, temos os pintores, os fotógrafos, os dançarinos, os cineastas, os escritores e a lista prossegue.

Você confiaria num dentista para fazer a revisão mecânica de seu automóvel? Ou pediria a um engenheiro para fazer um transplante de coração? Num pintor para ser o primeiro bailarinho do Bolshói?

É evidente que não! Pois todas estas profissões e ofícios são delimitados por saberes e práticas específicas; quando se escolhe uma delas, automaticamente estamos deixando de lado as demais, mesmo que não haja nada que impeça alguém de ser competente em mais de uma área.

Impressiono-me bastante quando leio sobre Leonardo Da Vinci, realmente um sujeito extraordinário e que dominou quase todos os ofícios de seu tempo, mas ele é a exceção das exceções, um em um trilhão. A maioria de nós mal consegue fazer uma coisa bem, muito menos uma porção.

Hoje, se me perguntam o que faço, digo sem hesitação: sou escritor.
No entanto, nem sempre foi assim. Já tive vergonha de me apresentar como um, pois não havia publicado nada e não confiava na qualidade do que havia escrito. Talvez tivesse razão em ser prudente naquela época. Demorou vários anos e muito senso autocrítico para atingir este ponto de afirmar, "sou um escritor".
Afinal de contas, já escrevi vários livros, publiquei alguns deles, ganho o pão e pago as contas com o que escrevo e é o que sei fazer bem.
Sou escritor, e ponto-final.

Blogueiro?

O blog é um fenômeno recente, surgido no final dos anos 90 e que se tornou uma verdadeira febre nos anos dois mil. Alguns afirmam que foi neste período que teve seu apogeu e logo começou o declínio, sendo substituído pelas redes sociais e sites de microblogging.

Mesmo assim, alguns blogs cresceram e prevaleceram, profissionalizando-se. O termo problogger foi cunhado nos EUA e logo passou a ser utilizado para identificar os blogueiros profissionais.

Mas é aí que surge a questão: blog é um ofício ou é uma mídia?

E lá vamos nós tentar categorizar este bicho chamado blog!

Os blogs são plataformas virtuais que permitem o compartilhamento de textos, vídeos e imagens, mas, a princípio, o que consagrou os blogs foi a possibilidade de qualquer pessoa comum, em qualquer lugar do planeta, expressar suas opiniões sobre qualquer assunto e atrair um público.
Eles abriram as portas para que nós, que não somos repórteres ou apresentadores de TV, também nos tornássemos em menor medida formadores de opinião.

Contudo, excluindo esta particularidade de ser acessível a qualquer um, um blog não é muito diferente de um jornal ou revista online. Tudo bem que não há toda a hierarquia editorial de uma mídia tradicional, mas, na prática, há o colunista (ou o suposto blogueiro) e o leitor.

Não acredito que exista isto de problogger, ou blogueiro profissional. Na minha concepção, existe o fotógrafo, o jornalista, o escritor, o engenheiro, o representante de vendas etc., que utiliza um blog como forma de expressão, mas há muita gente que pensa o contrário.

Escritor ou blogueiro?

Incomoda-me quando me chamam de blogueiro.

Escrevo uma dúzia de blogs, é verdade, mas estas são as plataformas que utilizo para divulgar meu trabalho, assim como são os livros, os livros digitais, as revistas, os jornais, a TV, a rádio e qualquer outro meio de comunicação.

Saramago, pouco antes de morrer, havia descoberto os prazeres de escrever um blog e poder dialogar em tempo real com seus leitores. Alguém ousaria chamar Saramago, o prêmio Nobel de Literatura, de blogueiro?

E por que insistem em chamar de blogueiros os demais escritores como eu, que não somos Nobel de nada, somente porque escrevemos em blogs?

Blogueiro soa aos meus ouvidos como demeritório, como metade do caminho, como se fosse menos.

Então, por favor: escritor sim, blogueiro não!

Friday, March 02, 2012

Decálogo do perfeito contista, de Horacio Quiroga


por Horacio Quiroga
trad.: Henry Alfred Bugalho



Creia em um mestre — Poe, Maupassant, Kipling, Tchekov — como em Deus mesmo.

II 
Creia que sua arte é um cume inacessível. Não sonhe em domá-la. Quando puder fazê-lo, você o conseguirá sem mesmo sabê-lo.

III 
Resista o quanto puder à imitação, mas imite se o influxo for ­forte demais. Mais do que qualquer outra coisa, o desenvolvimento da ­personalidade é uma grande paciência.

IV 
Tenha fé cega não em sua capacidade para o triunfo, senão no ­ardor com que o deseja. Ame a sua arte como à sua namorada, ­dando-lhe todo seu coração.


Não comece a escrever sem saber desde a primeira palavra aonde vai. Em um conto bem realizado, as três primeiras linhas têm quase a importância das três últimas.

VI 
Se quer expressar com exatidão esta circunstância: “Do rio soprava o vento frio”, não há em língua humana mais palavras do que as apontadas para expressá-la. Uma vez dono de suas palavras, não se preocupe em observar se são consoantes ou assonantes entre si.

VII 
Não adjetive sem necessidade. Inúteis serão quantas notas de cor adicionar a um substantivo débil. Se achar aquele que é necessário, apenas ele terá uma cor incomparável. Mas tem de achá-lo.

VIII 
Tome seus personagens pela mão e conduza-os firmemente até o final, sem ver outra coisa além do caminho que lhes traçou. Não se distraia vendo o que eles podem ou não lhes importa ver. Não abuse do leitor. Um conto é um romance depurado de cascalho. Tenha isto como uma verdade absoluta, mesmo que não seja.

IX 
Não escreva sob o império da emoção. Deixe-a morrer, e evoque-a depois. Se for capaz então de revivê-la tal qual foi, terá chegado à metade do caminho na arte.


Não pense em seus amigos ao escrever, nem na impressão que causará sua história. Conte como se seu relato não tivesse mais importância do que para o pequeno ambiente de seus personagens, dos quais você poderia ter sido um. De nenhum outro modo se obtém a vida do conto.

Biografia do autor

Horacio Silvestre ­Quiroga Forteza (Salto, 31 de dezembro de 1879 — Buenos Aires, 31 de dezembro de 1937) foi um escritor uruguaio famoso por seus contos, que geralmente tratavam de eventos fantásticos e macabros na linha de Edgar Allan Poe e de temas relacionados à selva, sobretudo da região de Misiones, na Argentina, onde Quiroga passou parte da vida.
Sua obra mais famosa são os Cuentos de amor de locura y de muerte (1917; título sem vírgula no original), na qual se encontra o célebre conto A Galinha Degolada.
Em 1937, após ter sido diagnosticado com câncer, Quiroga cometeu suicídio, ingerindo uma dose letal de cianureto.

(Publicado originalmente na SAMIZDAT 32)
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