Thursday, November 07, 2013

Dialética da obra concluída


Você relê, está bom.
Relê, está um lixo.
Relê, está ótimo. 
Relê, uma bosta. 
Relê, está ok. 
Relê, como tive coragem de escrever isto? 
Relê e conclui que é o melhor livro da Humanidade... 

Esta é a hora de nunca mais tocar nele.

Quem nunca passou por isto, que atire a primeira pedra!

Saturday, October 19, 2013

Como produzir um romance best-seller?

(Escrita com princípios de linha de montagem)

Não acredito que exista fórmula para o sucesso, muito menos para escrever um livro de sucesso.
O mercado é tão imprevisível, com tendências passageiras (e recorrentes), movido às vezes por interesses escusos e por compadrio, e, se nos referirmos especificamente ao mercado editorial brasileiro, extremamente colonizado, onde os maiores sucessos são de já best-sellers estrangeiros.

Além disto, há uma rejeição tremenda entre editores, críticos e acadêmicos em relação a obras de ficção mais populares, com estruturas e linguagem mais simples que possam ser compreendidas pelas massas.
Boa Literatura é, no Brasil, aquela que só a elite consome e compreende.

De qualquer maneira, se esta é a sua praia e se você quiser algumas dicas sobre como estruturar um romance best-seller, seguem abaixo as recomendações do escritor John Baldwin, que observou a organização, os enredos, as construções de várias obras bem-sucedidas e elaborou uma listinha.
Balwin escreveu um romance seguindo tais dicas, "The Eleventh Plague: A Novel of Medical Terror", que foi adquirido pela editora Harper Collins por 2 milhões de dólares. O livro não foi tão bem-sucedido como seria de se esperar, ou seja...

Atente bem sobre a palavra "produzir", pois esta é a lógica do mercado: criar um produto para o consumo.

Como produzir um romance best-seller

1 - O herói é um expert.
2 - O vilão é um expert.
3 - Você deve assistir a todos os atos maldosos a partir do ponto de vista do vilão.
4 - O herói tem um time de experts em várias áreas ajudando-o.
5 - Duas ou mais pessoas da equipe devem se apaixonar.
6 - Duas ou mais pessoas do time devem morrer.
7 - O vilão deve desviar sua atenção do objetivo inicial para voltar-se contra a equipe.
8 - O vilão e o herói devem sobreviver para lutarem novamente na sequência.
9 - Todas as mortes devem partir do individual para o coletivo: por exemplo, nunca diga que a bomba explodiu e matou 15.000 pessoas. Comece com "Jamie e Suzy estavam caminhando no parque com sua avó, quando a terra se abriu sob seus pés."
10 - Se você estiver encalhado, basta matar alguém.

Estas dicas foram publicadas em The New York Times em 1998, e podem ser lidas em inglês no link abaixo
http://sprott.physics.wisc.edu/pickover/nytimes_bestseller.htm

Friday, July 26, 2013

Quem são seus personagens?

(Quasimodo, personagem de "O Corcunda de Notre-Dame" de Vitor Hugo)

Não minta. Você também se inspira em pessoas reais para compôr seus personagens. Eu sei disto. É o que todos nós escritores fazemos.

Os personagens não surgem do nada. Nenhum personagem é puramente inventado, sem nenhuma relação com pessoas com as quais você convive ou conviveu, com aquelas que viu na TV ou sobre as quais você leu.

Autobiografia/memórias

Eu sou da teoria que toda ficção é, em algum ponto, autobiográfica.

Se não for uma autobiografia de fato, relatando exatamente o que e como ocorreu - entenda-se este "exatamente" de acordo com a percepção do autor, pois nem sempre a nossa percepção dos fatos corresponde aos fatos como eles se deram -, ao menos é uma autobiografia num sentido mais amplo.

Toda obra literária revela facetas de seus autores, sejam suas inquietações, medos, desejos, traumas, alegrias, mas principalmente seus interesses enquanto pessoa. Alguém que não tenha o mínimo interesse em Ficção Científica provavelmente não se arriscará a escrever um livro do gênero.
Mesmo alguém que resolva escrever uma narrativa na qual não acredita nem se interessa somente pela possibilidade de enriquecer já está revelando uma característica sua: este apego pelo dinheiro.

Nesta lógica, os personagens de uma obra literária também pertencem a este universo autobiográfico, de pessoas que passaram por nossas vidas e nos afetaram, positiva ou negativamente.

Por outro lado, existem livros que são claramente autobiográficos, no sentido mais específico.
Alguns exemplos são "Paris é uma Festa" de Ernest Hemmingway, relatando os anos de juventude dele em Paris e seu contato com a geração perdida; temos também "Memórias, sonhos e reflexão" de C. G. Jung, os diários de Anaïs Nin, "Fala, Memória" de Vladimir Nabokov, e "Infância" e "Memórias do Cárcere" de Graciliano Ramos.

O risco de escrever autobiografias ou memórias é que, por mais que estas sejam as suas recordações, geralmente elas compromentem outras pessoas, e quase ninguém gosta de se ver refletido no espelho das rememorações alheias. Não é à toa que há tantos processos de difamação envolvendo a publicação de obras (auto)biográficas.

Roman à clef

Uma ótima alternativa para fugir dos problemas envolvendo biografias, autobiografias e memórias, é o Roman à clef, o que nada mais significa do que a ficcionalização de fatos reais através de personagens supostamente ficcionais.

Em muitos casos, um romance com estas características é uma autobiografia/memória alterando os nomes dos personagens e afirmando: "esta é uma obra de ficção".
Digamos que você namorou uma tal Maria da Silva em sua infância e perdeu a virgindade com ela. Esta Maria da Silva hoje é casada com outra pessoa, mãe de três filhos, advogada e tem uma vida própria que não lhe diz respeito (talvez até tenha se casado com este outro sujeito jurando de pés juntos que ainda era "pura").

Então, na hora de escrever seu livro, para evitar quaisquer complicações futuras, que a Maria da Silva acabe dando com seu romance numa livraria qualquer e se emputeça com os detalhes íntimos revelados, você altera o nome do personagem para "Marieta da Costa".
Pronto, todos seus problemas foram resolvidos!

Muitíssimos grandes autores trabalharam, às vezes exclusivamente, com romans à clef. Poderia citar incontáveis escritores, mas alguns bastante simbólicos são James Joyce, Charles Bukowski, Marcel Proust, Henry Miller, George Orwell, Thomas Mann, Roberto Bolaño, Jack Kerouac, entre vários outros.

Outra vantagem deste tipo de obra é que, pelo fato de ser descaradamente ficção, você não precisa ater-se fielmente à realidade. Por mais que seus personagens sejam inspirados em pessoas reais, você pode alterá-las um pouco para se encaixarem na proposta de sua história. Afinal de contas, é ficção, e em ficção pode tudo.

Ficção, ma non tanto

Por fim, entramos no terreno puramente ficcional, quando as situações e personagens são criados, vivem e existem somente no interior da prosa ficcional.

Como afirmar categoricamente que o Sméagol de "O Senhor dos Anéis" foi inspirado numa criatura/pessoa real?
Ou que existiu de fato um Corcunda de Notre-Dame ou um Jean Valjean?
Será que se caminhássemos pelas ruas de Londres daríamos de cara com o Harry Potter em alguma esquina?

Todavia, por mais inventivos e originais que os personagens pareçam ser, todos eles fatalmente possuem alguma relação com pessoas reais. O autor pode ter se inspirado em alguém particular ou reunido as características de várias pessoas, mas de algum lugar aqueles traços surgiram.
Citando Lavoisier: "na Natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma."

E o mesmo vale para a Literatura, tudo se transforma, tudo vira matéria e inspiração para um autor, seja a própria vida dele, a da esposa, dos pais, dos vizinhos, ou de um mendigo pelo qual ele passou na saída do metrô. Tudo é assimilado e retorna como criação ficcional.

Em suas essências, os personagens são pessoas reais, e é justamente por isto que nos identificamos com eles, pois trazem atributos, qualidades e defeitos que podem ser encontrados nas pessoas do nosso dia a dia; eles mantém um contato com a nossa vida real, trazem-nos para o mundo que nos circunda e, muitas vezes, ajudam-nos a reinterpretar este mundo.

Personagens puramente ficcionais são incontáveis, mas, se fôssemos investigá-los um a um, estou certo que encontraríamos a raiz de onde eles brotaram, seja na história particular do autor, seja em suas influências literárias, cinematográficas, musicais, mitológicas ou de qualquer outra fonte que ele tenha bebido.

Num estrato mais fundamental, os nossos personagens partem da nossa compreensão da realidade. Eles são moldados a partir de nossas vivências e interesses e, por mais diferentes que sejam de nós, ainda assim são uma parte indistinguível de quem somos.

Revelamo-nos através de nossas criaturas.

Friday, May 31, 2013

Livros com capítulos longos ou curtos?


As dimensões dos capítulos são determinantes e refletem muito da natureza de um livro.

Geralmente, romances mais complexos, chamados por alguns de "obras sérias", possuem capítulos mais extensos, às vezes com várias dezenas de páginas.
Por outro lado, romances populares se caracterizam por capítulos breves, com poucas páginas e, em casos extremos, até menores do que uma única página.

O que é um capítulo?

Os capítulos são divisões de um livro, podemos pensá-los como pequenas unidades narrativas no interior da trama.

Eles podem ser:
- numerados (Capítulo 1, 2, 3, ou I, II, III...),
- com letras do alfabeto (A, B, C... como em "Os Cus dos Judas" de Lobo Antunes),
- com títulos descritivos (Urge uma providência, como em "Capitães de Areia" de Jorge Amado);
- com números e títulos (Capítulo VIII: Razão contra sandice, como em "Memórias Póstumas de Brás Cubas" de Machado de Assis)
- com quebras de página,
- ou simplesmente com espaçamento entre uma seção e outra.

Como determinar o tamanho de um capítulo?

Quão longo será o capítulo de um livro dependerá, antes de tudo, das características da obra e da visão do autor sobre a estrutura da obra.

As perguntas que o autor deve se fazer durante a escrita de um capítulo são:

1 - o que tanto precisa ser narrado?
2 - o capítulo possui uma unidade de ação/exposição?
3 - há informações excedentes ou ausentes?
4 - qual é o tipo de leitor que tenho em mente?

Para fins narrativos, os três primeiros pontos são fundamentais, pois um capítulo deve ser longo o suficiente para expormos todos os fatores essenciais para mover o enredo adiante, como descrições, diálogos e pensamentos do personagem, mas sem revelarmos demais de modo a manter o leitor imerso na narrativa.
Já sob o aspecto de legibilidade, o quarto ponto é o mais importante, pois capítulos demasiadamente longos podem desmotivar certos leitores, enquanto capítulos curtos podem criar uma sensação de uma narrativa superficial (mesmo que falsa, já que vários grandes autores, como o próprio Machado de Assis, muniam-se de capítulos breves ou brevíssimos).

De qualquer maneira, o autor sempre deve respeitar o ritmo que o próprio romance e os personagens impõem.
Na releitura, será possível desmembrar os capítulos longos demais em unidades menores, mas, idealmente, é recomendável que os capítulos tenham uma extensão homôgenea, que não varie muito ao longo do livro.
Todavia, em tese, é possível escrever livros inteiros num único capítulo, como "Malone Morre" de Samuel Beckett, apesar de isto estar comumente associado a obras modernistas, que optam por sacrificar a legibilidade em detrimento à proposta estética.

Quantos capítulos um livro deve ter?

Quantos capítulos forem necessários para desenvolver a trama do início ao desfecho.
Obras monumentais, com várias centenas de página, além de possuir a divisão por capítulos, também costumam ser divididas em partes, ou seja, no interior das partes há vários capítulos.

A divisão por partes é útil quando há saltos temporais numa narrativa, ou quando há a mudança de foco para um outro narrador/personagem.

Não há limite máximo de capítulos, principalmente se estes capítulos forem breves.

O que é cliffhanger?

A estratégia mais fundamental dos gêneros literários populares é o cliffhanger, que numa tradução literal seria "à beira do penhasco".
Este recurso nada mais significa do que terminar um capítulo com suspense, deixando o leitor curioso para prosseguir na leitura e descobrir como o enredo se desenvolve.

Alguns romances famosos, como clássicos de Dickens e Alexandre Dumas, são compostos de um cliffhanger após o outro, pois são de uma época em que os livros eram publicados serialmente em revistas ou jornais e podiam se estender por meses ou até anos de publicação.
Na época, o segredo do sucesso era manter o leitor ansioso por acompanhar o desfecho.
Ainda hoje é um recurso bastante eficaz, presente na maioria dos best-sellers e também em séries de TV ou no cinema.

O autor Wilkie Collins afirmou sobre esta técnica: "Faça-os chorar, faça-os rir, faça-os esperar - exatamente nesta ordem."

Conclusão

Com frequência, a extensão dos capítulos será uma decisão prévia do autor, de qual é sua intenção narrativa e também de seu público-alvo.
Por outro lado, o escritor pode simplesmente mergulhar na escrita e, ao terminar a obra, retornar e dividí-la em capítulos, se considerar necessário. Não sei se isto seria o mais recomendável, mas é totalmente possível.

Saturday, May 11, 2013

Escrever para ganhar dinheiro. Existe isto?


Já fui muito mais fundamentalista quando o assunto era escrita e dinheiro.
Até alguns anos atrás, para mim um escritor que produzisse suas obras pensando na vendagem não diferia muito de uma prostituta, vendendo barato seu talento.

Não penso mais assim, aliás, não me sinto na posição de julgar as motivações de cada um para escrever, tampouco sobre o que farão com o produto de seu trabalho.
Repare bem no uso da palavra "trabalho", pois aí reside todo o segredo.

Escrever para vender não é um equívoco porque o dinheiro seja sujo ou imoral, afinal, todos necessitamos dele para sobreviver. O problema da grana não é a sua existência, mas a desigualdade. É a injustiça do mundo que revolta, quando alguns ganham rios de dinheiro, e outros mal podem comprar um prato de comida.
Moralmente, não concordo que um escritor ganhe milhões com seus livros, mas também não concordo que um jogador de futebol, um político, ou qualquer outra profissão supérflua gere lucros absurdos, enquanto alguns médicos, professores, policiais e garis recebem salários de miséria.
Mas é assim que a banda toca e não somos nós, individualmente, que decidimos sobre a distribuição de renda.

O equívoco de escrever para ganhar dinheiro é muito mais simples.
Não existe fórmula para vender livros, portanto, não há garantias alguma que você enriquecerá neste ramo.
Não possuo dados concretos, mas podemos estimar que, para cada mil livros publicados, somente uns 100 geram algum tipo de vendas reais, enquanto destes apenas uns 10 vendem bastante.
Todos os demais 900 livros vendem pouco, ou nada.
Reflita bem sobre este percentual. Tornar-se um best-seller definitivamente não é tão improvável quanto ganhar na loteria, mas ainda assim será muito difícil.

Quando escrever para lucrar funciona?

Quando se trata de ficção, não existe garantias se seu livro venderá muito ou não. Você pode preparar o melhor livro do mundo, o mais bem escrito, o mais divertido, mas isto nada significa em termos de potencial de mercado.

Só existem duas regras para vender um livro com estas características: 1 - um plano de marketing, ou 2 - pura sorte.
No primeiro caso, geralmente implica em contratar alguém para elaborar estratégias de divulgação, com acesso à imprensa, e isto também significa um grande investimento, sem certeza dos resultados.
No segundo caso, trata-se do fator "cu virado pra Lua", quando a crítica, a imprensa, ou os leitores compram sua ideia sem nenhum motivo aparente, e seu livro estoura com uma grande ajuda do destino.

Por outro lado, sempre se pode dar uma mãozinha à sorte, principalmente se você for:
a - alguém muito famoso em sua área;
b - alguém muito influente; ou
c - alguém que já possua uma plataforma.

O que é uma plataforma?

Esta é a palavra da moda no mundo editorial contemporâneo. Você dificilmente conseguirá ser publicado atualmente se não demonstrar que, de algum modo, você possui uma plataforma consistente.

Mas o que é isto?

Plataforma nada é mais do que uma palavra bonita para designar que você já possui um número considerável de seguidores, que se interessará em comprar seu livro.

Vamos supor que você seja uma autoridade em gastronomia, talvez um chef reconhecido, e escreva um livro de culinária. A sua reputação entre seus pares e com seus fregueses seria sua plataforma, ou seja, os compradores potenciais de seu livro.

Neste sentido, se você já possui uma plataforma em uma área específica, escrever livros destinados a este segmento é uma ótima ideia para ganhar dinheiro com escrita. Pelo menos, não é nenhum tiro no escuro.

Vou ficar rico?

Se você não for nenhuma autoridade, tampouco possui uma plataforma, você está na mesma situação da maioria dos escritores por aí.

Restam-lhe duas opções:
1 - criar uma plataforma, o que pode ser feito através de um blog, das redes sociais, ou mesmo através de um primeiro livro que atraia atenção, criando uma comunidade de leitores para seus livros subsequentes,
2 - continuar escrevendo sem nenhuma pretensão de riqueza ou sucesso.

De qualquer modo, no Brasil, você dificilmente enriquecerá com a vendagem de seus livros.
Mesmo livros de sucesso de autores nacionais raramente ultrapassam a marca de algumas dezenas de milhares de exemplares vendidos, ou seja, você gastará dois ou mais anos escrevendo sua obra-prima e, se as vendagens foram excelentes, receberá uns vinte ou trinta mil reais por isto.

A solução será a mesma de quase todos os demais escritores: coincidir sua atual carreira com a escrita e, se por acaso algum dia você vender milhões de livros, dedicar-se exclusivamente à Literatura.

Tuesday, April 16, 2013

O vazio e a satisfação de concluir a escrita de um livro


Concluir uma obra longa é um marco na vida de qualquer escritor.

Todo aquele que inicia sua carreira literária escrevendo textos curtos, como contos, crônicas e poemas, observa de longe o romance, ou um livro completo, como se fosse a escalada do Everest, quase como um cume inatingível.

Um romance é escrito página após página, dia após dia, semanas após semanas e, às vezes, até ano após ano. Alguns autores podem passar a vida inteira escrevendo um único romance.

Agora, prestes a concluir meu quinto romance (o décimo-segundo livro de minha autoria), volto a ser inundado por dois sentimentos contraditórios.

O vazio

Durante a escrita de uma narrativa longa, você convive com seus personagens numa relação tão íntima, que eles quase se convertem em seus melhores amigos.
Um autor de ficção dialoga com seus personagens, ocasionalmente suplicando para que eles cumpram o destino traçado pelo escritor. Todavia, certos personagens possuem vida própria e não aceitam passivamente os ditames de autor, seguindo seus próprios rumos e ditando o ritmo da história.

Não raro, estes personagens vivos, quase tão vivos e reais quanto pessoas de carne e osso, nem são os protagonistsa da narrativa, mas alguns personagens menores, que de tão cativantes crescem e se entranham na mente do autor.

Despedir-se destes personagens, ou pior até, matá-los, cria uma profunda sensação de vazio. É como ver um amigo partindo, com a certeza que jamais o reecontrará.
Você descobrirá que reler a obra depois não lhe causará a mesma empolgação ou emoção de quando você a escrevia.
Às vezes, você até sentirá que aquilo é obra de outra pessoa, que não são palavras suas.

A satisfação

Comumente, você terá dúvidas durante a redação de um livro, talvez até o abandone por dias ou semanas, retornando à escrita com maior vigor depois, oscilando entre ânimo e desânimo.

De certo modo, a analogia com a escalada do Everest é acertada, pois é preciso cautela e determinação para chegar ao topo, numa expedição cercada por imprevistos e contratempos.

Portanto, o ponto-final é também um momento de grande satisfação, de uma sensação de missão cumprida, que fizemos o que viemos para fazer.

É a célebre frase de Júlio César, "veni, vidi, vici", isto é, "vim, vi e venci". E você deve se vangloriar por ter concluído um livro, pois, de todos os candidatos a escritores ao redor do mundo, dentre todos aqueles que sonham em seguir esta carreira, somente alguns concluirão uma obra longa.

Eu diria que esta é a primeira triagem da vida de um escritor. Nada garante que ela será publicada um dia, tampouco que seja bem escrita, mas já é um passo, um grande passo, do qual você deve se orgulhar.

Conclusão

Escrever uma obra longa é motivo para comemoração, pois exigiu dedicação e esforço por um longo tempo.
Assim que você terminar seu livro, descanse um pouco e relaxe. Aproveite um pouco do seu trabalho recém-concluído. Deixe-o de lado por um período, para depois começar a reescrita e revisão.

Contudo, não permita que um livro ofusque o potencial das obras futuras. Assim que terminar um projeto, comece a determinar as diretrizes de seu próximo trabalho, inicie a pesquisa e delineie seus pontos principais.

O final de um livro é o término de uma etapa, mas também o início da próxima.
O fim é sempre um recomeço.

Thursday, April 11, 2013

Os livros que vendem mais, vendem mais porque vendem mais



(Livraria Ateneo, em Buenos Aires)

Escrever um livro não é um desafio.

Tire da cabeça que redigir uma obra de 200 páginas é um feito extraordinário, só possível de ser realizado por grandes gênios.
Eu lhe asseguro que escrever um livro do começo ao fim é muito mais simples do que parece, e os muitos milhares de novos títulos, publicados todos os anos por editoras comerciais ou em edições do autor, não me desmentem.

Escrever é fácil. Escrever bem é um pouco mais complicado. Agora, escrever extraordinariamente bem, aí sim estamos falando de uma habilidade para poucos afortunados.

O problema real da maioria dos autores nunca foi o estágio de escrita, tampouco a publicação. O grande mistério da escrita é como fazer com que a sua obra chegue ao leitor certo.

Continue lendo o restante do artigo aqui, na Revista SAMIZDAT

Friday, March 22, 2013

Dicas indispensáveis de escrita de grandes autores

Para escrever, existem técnicas, planejamento, conhecimento da gramática e de ortografia. Mesmo não havendo regras absolutas, dicas de grandes autores sempre podem nos auxiliar de algum modo, ainda que as ignoremos.

1 - Ernest Hemingway


Não há nada na escrita. Tudo que você precisa fazer é sentar-se diante da máquina de escrever e sangrar.

2 - Anton Tchekov


Não me diga que a Lua está brilhando; mostre-me o reflexo da luz num copo quebrado.

3 - Toni Morrison

A habilidade dos escritores de imaginarem o que não são si próprios, de familiarizarem-se com o estranho e mistificar o familiar, é o teste de seu poder.

4 - E. L. Doctorow

Escrever um romance é como conduzir um carro à noite. Você só consegue enxergar até onde mostram seus faróis, mas você pode empreender toda uma viagem deste modo.

5 - Henry Miller


Quando você não pode criar, você pode trabalhar.

6 - Elmore Leonard

Eu tento retirar aquelas partes que as pessoas pulam.

7 - John Steinbeck


Abandone a ideia que um dia você concluirá. Deixe de ter em vista as 400 páginas, e escreva somente uma página ao dia, isto ajuda. Então, quando concluir, você sempre se surpreenderá.

8 - Stephen King

Se você quer ser um escritor, você precisa fazer duas coisas acima de tudo: ler bastante e escrever bastante.

9 - Maya Angelou

O que faço quando tento escrever. Posso escrever por duas semanas "batatinha quando nasce, se esparrama pelo chão". E pode ser a coisa mais chata e horrível. Mas eu tento. Quando estou escrevendo, eu escrevo. Então, é como se a musa se convencesse que não estou para brincadeiras e dissesse: "Tudo bem, tudo bem, virei".

10 - James Patterson

Sempre finjo que estou sentando diante de alguém. Estou contando uma história e não quero que ele se levante até eu acabar.

11 - Edgar Allan Poe


Um conto deve ter um único tom e cada frase deve conduzir a ele.

12 - John Steinbeck

Se você estiver usando um diálogo - leia-o em voz alta enquanto escreve. Somente assim você terá o som da fala.

13 - Ray Bradbury


Quantidade produz qualidade. Se você só escreve poucas coisas, está condenado.

14 - T. S. Eliot

Poetas imaturos imitam; poetas maduros roubam.

15 - Ernest Hemingway

Entrevistador: Quantas vezes você reescreve?
Hemingway : Depende, reescrevi o final de "Adeus às Armas", a última página, trinta e nove vezes antes de ficar satisfeito.
Entrevistador: Havia algum problema técnico nele? O que o estava travando?
Hemingway: Encontrar as palavras certas.

16 - Gertrude Stein


Escrever é escrever é escrever é escrever é escrever é escrever é escrever é escrever

17 - F. Scott Fitzgerald

Corte todos os pontos de exclamação. Um ponto de exclamação é como rir da própria piada.

18 - G. K. Chesterton

Devo meu sucesso a ouvir respeitosamente aos melhores conselhos, então partir e fazer exatamente o oposto.

Thursday, March 21, 2013

8 boas práticas de escrita, por Neil Gaiman



trad.: Henry Alfred Bugalho

1 - Escreva.

2 - Ponha uma palavra depois da outra. Encontre a palavra certa, escreva-a.

3 - Conclua o que você está escrevendo. Conclua qualquer coisa que você tiver de fazer, conclua.

4 - Deixe descansar. Leia-o fingindo que você nunca o havia lido antes. Mostre para amigos cuja opinião você respeita e que gostam deste tipo coisa.

5 - Lembre-se: quando as pessoas lhe dizem que algo está errado, ou que não funciona, elas estão quase sempre corretas. Quando elas lhe dizem o que pensam estar errado e como arrumar, elas estão quase sempre erradas.

6 - Arrume. Lembre-se que, cedo ou tarde, antes que isto atinja a perfeição, você terá de deixá-lo partir e seguir adiante para escrever a próxima coisa. Perfeição é como perseguir o horizonte. Continue seguindo adiante.

7  - Ria de suas próprias piadas.

8 - A regra principal da escrita é que, se você fizer isto com bastante segurança e confiança, você será autorizado a fazer o que quiser. (Talvez esta seja a regra para a vida, bem como para a escrita. Mas definitivamente é verdadeira para a escrita). Então escreva sua história como ela precisa ser escrita. Escreva-a com honestidade, e conte-a tão bem você consiga. Não estou certo se há outras regras. Nenhuma que seja importante.

De um artigo em The Guardian

Wednesday, March 06, 2013

A arte de não concluir a leitura de livros


Durante quase uma década, li freneticamente tudo aquilo que caía em minhas mãos.
Li ficção, poesia, teoria literária, Filosofia, Psicologia, História, Teologia, sobre a Teoria do Caos, sobre viagens espaciais, acupuntura, medicina, Física, biografias, auto-ajuda, espírita, best-sellers, outros que não venderam tão bem, clássicos e contemporâneos. Li catataus de mais de mil páginas e livrinhos de bolso. Li a Bíblia do cabo a rabo.

Li até alguns livros que me levam hoje a indagar: por que perdi meu tempo?

Já não tenho mais este ímpeto. Nos últimos anos, os livros que abandonei são muito mais numerosos do que aqueles que consegui terminar de ler.
Anteriormente, largar um livro no meio era uma heresia imperdoável para mim. Mesmo se fosse ruim, chato, sem propósito, eu me sentia numa obrigação interior de chegar ao ponto final.
Hoje, não mais.

A última obra que consegui ler do começo ao fim foi uma das incontáveis releituras de "Ficções" de Jorge Luis Borges. Conheço muito bem alguns dos contos deste volume, mas sempre me surpreendo com suas histórias e, principalmente, com suas entrelinhas.
Este é o tipo do livro que tenho buscado no momento, daquele que nos transporta para algum lugar misterioso para além das palavras, que vive mesmo quando a leitura foi concluída.
São obras raras, e tenderão a rarear ainda mais em nossa época.

Jamais concluí a leitura de "Clube da Luta" de Chuck Palahniuk, apesar de sempre me prometer que o farei. Cheguei a ler o primeiro capítulo de "50 Tons de Cinza" para saber a razão de tanto furor, mas não dá, é um livro tão ruim que eu não usaria nem para a limpar a bunda se fosse pego desprevenido por uma caganeira na beira da estrada. Até "Grande Sertão: Veredas" repousa na prateleira, lido até a metade, sendo revisitado duas vezes ao ano para rápidas leituras, mas a conclusão dele parace ser inatingível.

Talvez a primeira obra que eu consiga ler na íntegra neste ano seja "The Friends of Eddie Coyle", do americano George V. Higgins, com uma escrita tão única, agradável e inusitada, que todo fim do dia me pego lendo um capítulo. Mesmo sendo um livro curto, já me tomou algumas semanas; era o tipo de obra que eu leria em dois dias algum tempo atrás. Está disputando cabeça a cabeça com "A Teoria do Romance" de Lukacs, também numa leitura a passo de tartaruga.

O fato é que a leitura é uma prática sobrevalorada.
Há um mito que quem lê muito, independentemente da qualidade da obra, será alguém mais inteligente, ou pelo menos mais culto.
Não se engane, quem lê porcaria não é muito diferente de quem assiste ou ouve porcarias.
Ler não é nenhuma tarefa excepcional, que distingue os gênios da boiada. Ler é uma das competências da linguagem, que não torna ninguém melhor do que os outros.
Ler revista de fofocas não o tornará um intelectual. Ler livrinhos eróticos das bancas de jornal também não. Na verdade, tampouco a Filosofia ou qualquer outra obra de alguma disciplina complexa e sofisticada o tornará uma pessoa melhor, pois ler nem sempre é compreender, e compreender nem sempre implica em aprendizado real.
Inclusive, não devemos sequer confundir cultura e conhecimento com inteligência. Algumas das pessoas mais insuportáveis e intolerantes que conheci eram bastante cultas, mas sem um pingo de inteligência.

Hoje, não tenho mais paciência para certos livros. Não quero ler e reler as mesmas histórias que retornam num ciclo infindo de clichês e enredos previsíveis, mas também não pretendo me esforçar para deglutir um livro insosso, por mais cultuado que seja.
Mostre-me uma grande obra que eu a seguirei, mas tem de ser daquelas que nos consomem, que se injetam em nossas veias e transformam a nossa visão de mundo. Não peço menos do que isto.

Nosso tempo é limitado e precioso, e abandonar uma leitura pela metade pode ser um ato até muito mais significativo do que o da escolha do que leremos.
A biblioteca é vasta, mas o tempo é escasso.

***
E você tem alguma recomendação de um bom livro para que eu o leia até a metade?

Friday, March 01, 2013

A ordinária (?) vida doméstica dos escritores

Após ler este artigo do Flavorwire, 25 fascinating photos of famous writers at home, resolvi fazer uma versão do Blog do Escritor, com retratos da vida privada de alguns escritores.

João Guimarães Rosa

Em casa com a esposa Aracy, e uma porção de gatos.

Erico Veríssimo

O autor em seu escritório em Porto Alegre.

Carlos Drummond de Andrade

O poeta em seu apartamento no Rio de Janeiro.

Clarice Lispector

A escritora em sua casa em Nápoles com o cão Dilermando, que ela recolheu da rua.

Vinícius de Moraes

O poetinha na banheira de sua casa, no Rio de Janeiro, onde trabalhava e recebia os amigos.

Graciliano Ramos

Última foto tirada do autor, em 1952, na casa dele no Rio de Janeiro.

Jorge Amado

Retrato tirado pela esposa do autor, na casa deles em Salvador.

José Saramago

O primeiro e único, até o momento, ganhador de língua portuguesa do Prêmio Nobel de Literatura em sua casa, em Lanzarote, Ilhas Canárias.

Raquel de Queiroz

A autora em sua casa no Rio de Janeiro.

Julio Cortázar

No apartamento do autor em Paris.

Jorge Luis Borges

O maestro e María Kodama, seu amor tardio, na residência deles em Genebra.

Pablo Neruda

O poeta na varanda de sua casa em Isla Negra, Chile.

James Joyce

O autor irlandês ao lado de seu neto, Stephen, na casa dele em Paris.

Henry Miller

Miller em seu refúgio em Big Sur, Califórnia.

Charles Bukowski

A pocilga do velho safado em Los Angeles.

Albert Camus

Na varanda de seu apartamento em Paris.

Gabriel García Márquez

O escritor colombiano com a esposa e filhos, na casa deles na Cidade do México.

Henry Alfred Bugalho

É óbvio que eu não podia me deixar de fora desta. Aqui estou eu escrevendo na varanda do meu apartamento anterior, na Perúgia, Itália.

E você?
E você também escreve? Tem alguma foto sua no seu ambiente de trabalho em sua casa? Mande-nos o link da imagem no comentário para conferirmos.

Thursday, February 28, 2013

Não, obrigado!, de e. e. cummings


Depois de fracassar quatorze vezes, Cummings desistiu e recorreu à sua mãe. Ela lhe deu 300 dólares, com os quais ele convenceu o impressor Samuel Jacobs a publicar o volume em sua própria gráfica, a Golden Eagle Press. O título foi mudado de 70 poemas para Não obrigado (No thanks), em alusão às educadas recusas das editoras. Como golpe de misericórdia, Cummings incluiu na página de dedicatória do livro um poema concreto, organizando as quatorze editoras na forma de uma urna funerária:

Não
Obrigado
para
Farrar & Rinchart
Simon & Schuster
Coward-McCann
Limited Editions
Hancourt, Brace
Random House
Equinox Press
Smith & Haas
Viking Press
Knopf
Dutton
Harper's
Scribner's
Covici-Friede

***
Edward Estlin Cummings, usualmente abreviado como e. e. cummings, em minúsculas, como o poeta assinava e publicava, (Cambridge, Massachusetts, 14 de outubro de 1894 — North Conway, Nova Hampshire, 3 de setembro de 1962) foi poeta, pintor, ensaísta e dramaturgo americano. Tendo sido, principalmente, poeta, é considerado por Augusto de Campos um dos principais inovadores da linguagem da poesia e da literatura no século XX. (Wikipédia)

Thursday, February 21, 2013

Nunca ganhei um concurso literário


Nunca ganhei um concurso literário, mas também nunca fui um concurseiro fervoroso.

Talvez no começo da minha carreira de escritor, quando eu ainda acreditava em duendes e Papai Noel, arrisquei-me mais, enviando contos para algumas dúzias de concursos.
Um deles apareceu numa antologia, custando-me 50 reais para incluí-lo lá. Outro deles ficou em sexto lugar num concurso do Paraná. Mas ganhar mesmo, nunca.

Perder nestes concursos literários vagabundos, que pagam pouco ou nada, nunca me irritou muito. O que me incomodava para valer era perder nos grandes, naqueles prêmios apetitosos valendo alguns milhares de reais.
Lembro-me como se fosse hoje quando participei pela primeira e única vez do Concurso Cruz e Souza (então, pensava que se chamava Souza Cruz, sem entender bem a relação entre uma fábrica de cigarros e o mundo literário). Enviei uma antologia de contos e aguardei ansioso pelo resultado, com premiação de 60 mil reais.
Na época, não tinha muito senso crítico para avaliar meu próprio trabalho, assim julgava como ótimos aqueles contos péssimos.
Revoltei-me ao descobrir o nome do ganhador: Miguel Sanchez Neto, um autor já estabelecido.

Foi o primeiro momento que constatei que, nestes prêmios grandes, participam de escritor mendigo a best-seller. E, geralmente, são os figurões que levam a bolada.

Mais recentemente, fui um das centenas de escritores que enviaram obras para o concurso "Os Melhores Jovens Escritores Brasileiros", promovido pela revista britânica Granta. Eles escolheriam os 20 melhores autores e, mesmo sabendo que não sou uns dos 20 melhores, talvez nem um dos 300 melhores (mas possivelmente entre os 3 mil melhores), lancei a sorte com um trecho de um romance experimental.
A minha expectativa era a de que, nesta seleção, houvesse algum tipo de chacoalhão no establishment, uma renovação no cenário, a descoberta de alguns grandes talentos ocultos, tudo que o mundo da literatura brasileira sempre anseia.
Mas não! Sempre o óbvio, sempre esta insuportável obviedade.

Ontem, saiu o resultado do concurso Benvirá, da editora Saraiva, com prêmio de 30 mil reais e publicação do livro.
Ano passado, este mesmo concurso descobriu um promissor autor estreante e, provavelmente, vários estreantes viram aí a oportunidade. 30 mil reais não é pouca grana, ainda mais para um escritor. Se um autor ganhar 3 reais por cada exemplar, ele precisa vender 10 mil livros para angariar este montante.
10 mil livros é uma vendagem excelente mesmo para vários autores conhecidos, ainda mais para um estreante.
Só que, neste ano, o establishment venceu uma vez mais, optando por um veterano.

Quando você descobre o número de obras que este concurso recebeu, 1500 originais, a primeira coisa que se pensa é: "quem é o filho da puta que consegue ler mil e quinhentos originais?"

Eu não consigo. Num ano bom, leio uns 30 ou 40 livros, mas, no geral, se houver lido uns 12 já estou no lucro.
Então surge a desconfiança. Algum jurado conseguiu ler e analisar com atenção cada um destes quase 2 mil manuscritos? E mesmo se descartássemos aquelas obras realmente mal escritas, sobrando, digamos, umas 200, ainda assim, quem conseguiria lê-las todas?

O problema dos concursos literários é que não eles têm transparência alguma. Quem determina quais são os 20 ou 30 melhores livros dentre 2 mil? Quais são os critérios? O que eles estão procurando?

Ninguém sabe, e ninguém jamais saberá, pelo menos não deste lado dos escritores.

Ainda estou aguardando o resultado de alguns concursos grandes este ano, certo que também não ganharei. Agora, se ocorrer a improbabilidade matemática de eu levar algum destes prêmios, vocês serão os primeiros a saber.
Contudo, talvez tenhamos de esperar mais umas duas ou três décadas para isto, pois concursos literários parecem ter uma estranha atração por veteranos.

Saturday, February 16, 2013

Tenho de fazer faculdade de Letras para ser escritor?


Se você sonha em tornar-se um escritor e está em idade de fazer vestibular, talvez esteja naquele dilema: se eu cursar Letras, isto me ajudará a ser um escritor melhor?

Bastante populares nos EUA, os Cursos de Escrita Criativa destinam-se especificamente para a produção literária e envolvem o estudo de técnicas e gêneros literários, construção de personagens e enredo, como funciona o mercado, muitos trabalhos de escrita e também a leitura de clássicos da Literatura.
Muitas vezes, para a conclusão do curso, o aluno deve apresentar um livro concluído, seja romance, de contos ou de poesia. Caso deseje prosseguir no meio acadêmico, existem mestrados e doutorados em Creative Writing, geralmente envolvendo também a escrita de obras integrais, bem como uma breve dissertação sobre elas.
Todavia, no Brasil, existem pouquíssimos destes cursos voltados para formar escritores.

Portanto, não confunda uma faculdade de Letras com uma de Escrita Criativa. A primeira formará um professor de Português ou Literatura, enquanto a outra fornecerá ferramentas para a consolidação de uma carreira literária.

Qual é a estrutura do Curso de Letras?

Se você analisar a grade de disciplinas de um curso de licenciatura em Letras - Português de qualquer universidade brasileira, você logo perceberá que a ênfase é sobre o estudo das obras da Literatura em Português, Linguística e Metodologia de Ensino da Língua Portuguesa, ou seja, como dito anteriormente, é uma formação voltada para quem deseja se tornar professor de Português ou Literatura, ou talvez um crítico literário.

Num curso de Letras, você aprenderá como ler, interpretar e analisar clássicos da Literatura e, eventualmente, algumas obras mais modernas.
As universidades brasileiras foram influenciadas profundamente por correntes francesas, isto significa que há uma tendência a um viés estruturalista na leitura destas obras, ou seja, uma análise da composição interna da obra literária e como ela se relaciona à produção de sua própria época, o que se entende como uma análise sincrônica, tal como vemos em Roland Barthes, Greimas e Todorov, em oposição a uma análise diacrônica, isto é, que relaciona as obras literárias ao longo de seu percurso histórico, dialogando ou contrapondo-se à tradição ou à própria sociedade que permitiu o surgimento delas, como vemos em Bakhtin e Lukács.
De qualquer maneira, a aproximação às obras literárias dependerá exclusivamente da formação e orientação dos professores e também de sua própria inclinação de pesquisa.

Isto pode me ajudar a escrever melhor?

Um curso de Letras, e a Universidade em geral, tem efeitos muito diferentes em cada aluno. Por isto, é impossível prever como a formação universitária afetará sua escrita literária.

O que vejo frequentemente é que o curso de Letras costuma ser muito mais nocivo do que benigno para a escrita, por várias razões:

1 - a formação universitária é restritiva por sua própria natureza, coagindo os alunos à especialização, ao domínio de um único tópico, obra ou assunto, ao "recorte".

2 - a crítica acadêmica possui um método muito mecânico, e por vezes estéril, para destrinchar as obras literárias. Se o escritor incorporar este método na composição ou avaliação de sua própria produção, pode-se sentir constrangido em sua liberdade criativa.

3 - a academia trabalha, geralmente, com o cânone literário, isto é, com aqueles livros consagrados pelo tempo. Todo o esforço de conhecer e compreender a contemporaneidade, quais são as tendências atuais, as temáticas, as inovações, dependerá exclusivamente do escritor. Frequentemente, os cursos de Letras não estão preparados para compreender o hoje.

4 - o jargão e a terminologia acadêmica, bem como a produção de trabalhos acadêmicos, seguem parâmetros bastante específicos e que não dão margem para liberdade estilística. Isto pode ser frustrante para um escritor literário.

Posso dizer que conheci muitas pessoas que entraram num curso de Letras crendo que isto as tornaria escritores melhores, e não apenas perderam o prazer na escrita literária quanto na própria leitura.
Mas isto está longe de ser uma regra, o que funciona para alguns, não funciona para outros.

O que estudar, então?

Veja bem, nada o impede de cursar Letras e aprender muito com isto, de maneira que sua escrita se aperfeiçoe neste processo. Há alguns casos de grandes escritores que cursaram, total ou parcialmente, Letras.
James Joyce é um dos célebres autores formados em Letras, enquanto Fernando Pessoa é o exemplo clássico de um escritor que desistiu deste curso.

No entanto, ao verificarmos as biografias de vários grandes autores, constataremos que a formação universitária não possui nenhuma relação com a qualidade de escrita.
Pushkin era médico, Kafka era advogado, Camus era formado em Filosofia, Guimarães Rosa era médico e diplomata.

Ernest Hemmingway (à esq.) durante a Segunda
Guerra Mundial
Por outro lado, a listagem de grandes autores sem nenhum tipo de formação universitária é imensa.
Hemmingway, Bukowski, Cortázar, Proust ou Henry Miller jamais concluíram ou cursaram uma faculdade.
Já Borges, Mark Twain, Saramago, Bernard Shaw e Machado de Assis praticamente não tiveram educação formal alguma, e isto não os impediu de incluírem seus nomes nas galerias da História, obviamente por esforço próprio para se aperfeiçoarem.

Inclusive, penso que uma formação, universitária ou da vida, que não tenha relação direta com Letras poderia contribuir muito mais para um escritor, como experiência, do que restringir-se ao mundo autorreferencial da Literatura.
Colecionar histórias, observar as pessoas, conviver com povos e culturas diferentes ampliarão o seu repertório de narrativas possíveis, permitindo-lhe uma penetração mais profunda na alma do ser humano.

Como na inesquecível recomendação de Hemmingway: "para poder escrever sobre a vida, primeiro você deve vivê-la".

Sunday, February 03, 2013

Os 7 piores finais possíveis para uma história


Você começou a escrever sua história, desenvolveu-a, criou seus personagens, as reviravoltas e tudo o mais.

Agora, você chegou, enfim, ao momento decisivo: daquele desfecho inesquecível.

Alguns teóricos americanos de roteiros afirmam que os dois momentos mais importantes de uma narrativa são o início e o final.
O começo porque será quando você convencerá os demais a continuarem acompanhando sua história.
O desfecho porque será a impressão definitiva que as pessoas levarão da sua trama.

Assim como ocorre com os inícios, muitos autores acabam recorrendo ao óbvio, em parte pelo medo de arriscar, mas também por acabar imitando tantas outras histórias que já viram por aí.

Abaixo, você encontrará vários tipos de finais recorrentes, que vemos nos livros, no cinema, nas novelas, até cansarmos. Evite-os, se puder, ou renove-os, se considerar necessário, mas, por favor, fuja dos clichês, pois nem você, nem seus leitores ganham com isto.

1 - Felicidade eterna


Mocorongo e Tansinha se abraçaram e se beijaram com a luz do sol poente abençoando o amor deles. Haviam passado por muitos desafios e dificuldades, mas agora estavam confiantes que nada jamais os separaria. O laço que os unia era maior do que tudo.
FIM

Esta é uma das heranças dos contos populares adaptados pela Disney.
Após muitas desventuras e perigos, o mocinho ou a mocinha conseguem superar todos os obstáculos, vencer os inimigos e, no final, tudo se resolve, com a promessa de serem "felizes para sempre".

Isto não quer dizer que uma trama não possa ser concluída num tom alegre, que eleve seus leitores. Inclusive, este tipo de final otimisma costuma ser um dos favoritos, pois, pelo menos, nos dá alguma esperança de felicidade neste mundo tão maluco.

O equívoco, ao meu ver, é a ilusão de que, com a solução dos problemas propostos naquela história particular, todos os problemas futuros também estariam resolvidos.
Felicidade é uma coisa, "felizes para sempre" é outra bem diferente.

2 - tudo não passou de um sonho/delírio


Zé-Ninguém despertou assustado, todo suado e trêmulo. Aquela série inacreditável de eventos havia sido apenas um terrível pesadelo, apesar de ter sido aparentemente tão real. Ele se beliscou, para constatar se realmente havia despertado.
Então, sorriu, levantou-se, vestiu os chinelos e foi até o armário para se trocar. Já amanhecia e ele precisava ir ao trabalho.
Um pesadelo, somente um pesadelo, cuja lembrança ele carregaria consigo durante muito tempo.
FIM

Este recurso, além de ser completamente amadorísco, é também muito irritante.
Concluir uma história com o personagem despertando de um sonho ou recuperando-se de delírio demonstra que o autor perdeu as rédeas do enredo em algum momento, permitindo absurdos tão absurdos que, no final, a única alternativa que resta é recorrer ao sonho, onde tudo é possível.

Se você gosta de tramas absurdas ou surreais, o melhor que pode fazer é levá-la até as últimas consequências, sem escorar-se numa técnica flácida e sem graça.
Fazer seu personagem acordar no final de um livro é quase tão insosso quanto fazê-lo despertar na primeira página, na verdade, é até muito pior, pois você conduz um leitor por páginas e mais páginas, convencendo-o a suspender a descrença, ou seja, levando-o a acreditar no mundo que você está criando, para, depois, jogar nele um balde de água fria.

Seja honesto com seu leitor.

3 - Múltiplas personalidades


O psiquiatra surgiu com uma pasta debaixo do braço, sentou-se diante do delegado e afirmou: 
– Sei que você adoraria culpar o Jeca por todos estes crimes, porém, o verdadeiro culpado é o Tatu. 
– E quem é Tatu? 
– Um desdobramento da personalidade de Jeca, sobre o qual ele não tem controle. Quando Tatu assume o domínio do consciente, ele é capaz de realizar as maiores atrocidades concebíveis. Tatu é o assassino! 
Jeca e Tatu, estas duas facetas de um mesmo homem, passariam o resto de seus dias num hospital psiquiátrico, envoltos num diálogo inaudível e secreto.
FIM

Há muito tempo, autores medíocres têm usado o transtorno de múltiplas personalidades (ou transtorno disassociativo de identidade) para explicar atos inexplicáveis de seus personagens.
No entanto, bons autores e cineastas também já usaram esta justificativa, de maneira até convincente. Consigo me lembrar de alguns casos, como "O Clube da Luta" de Chuck Palahniuk, "Psicose" de Alfred Hitchcock e "O Médico e o Monstro" de Robert Louis Stevenson.

Apesar de alguns exemplos clássicos, enredos com desfecho envolvendo este transtorno são, geralmente, deprimentes de tão ruins. É uma variação dos finais de sonho/delírio, pois demonstra que o autor não teve muita habilidade para conduzir os rumos da trama.

4 - O protagonista se suicida

Não haveria futuro para Borra-Botas... Sua vida não tinha sentido, ninguém o amava, ele odiava seu trabalho.
Fitou o rio escuro lá embaixo, enquanto os carros passavam atrás dele, iluminando a ponte com seus faróis.
Precipitou-se e, como um pedra, desapareceu no torvelinho das correntes.
Não faria falta a ninguém. A ninguém.
FIM

Este é o extremo oposto do final "felizes para sempre". Geralmente, o desfecho do suicida já indica uma história bastante depressiva, daquelas que nos obriga a digerirmos todas as angústias, enfermidades e traumas de infância do personagem.
Excetuando os casos do suicídio heróico, quando o personagem se sacrifica pelo demais, num último grande ato de bravura, que, convenhamos, também é um baita lugar-comum.
Não existe herói mais insuportável do que aquele que se mata para salvar os outros!

5 - O personagem morre de maneira inesperada e abrupta

O sinal de pedestres se abriu e Azarado começou a atravessar a rua. Foi estraçalhado por um caminhão sem freios, que pôs fim a seus sonhos e ambições.
FIM

Este final, no cinema, significaria que acabou o dinheiro. A produção simplesmente não tinha mais como arcar com os gastos e fez qualquer final para terminar a história.

Na Literatura, pode ser apenas o desleixo do escritor mesmo.
Na vida real, situações sem sentido como esta ocorrem todos os dias. Alguém está tomando um café na cozinha de sua casa, escorrega, bate a cabeça na quina da mesa e morre. Inclusive, estúpidos acidentes domésticos são umas das maiores causas de morte no mundo.
Todavia, a ficção é um mundo à parte, regida por regras próprias e que exige uma certa coerência, o que se denomina de verossimilhança interna.
Alguns teóricos mais radicais afirmam que qualquer cena, diálogo ou personagem devem mover a trama adiante, devem possuir um sentido, devem ter uma razão de ser.
Matar um personagem sem nenhuma causa aparente até pode ser realista, mas, para a ficção, cria um constrangimento no leitor por sua falta de propósito.

Se pensarmos em alguns clássicos da literatura, veremos como a morte do protagonista ou de algum personagem importante pode ser a decorrência lógica da trama, como o assassinato de Josef K. em "O Processo", a morte de Heitor em "Ilíada", ou a de Thomas em "Os Buddenbrooks" representando a decadência final de uma família de burgueses alemães.

Se for para matar algum personagem, que seja de maneira consciente e com alguma finalidade no enredo.

6 - Então veio Deus e resolveu todas as pendengas

(Imagem: William Blake)

O Bonzão havia caído nas garras de seu maior inimigo. Agora seria a morte certa, pois a lança do vilão estava a ponto de ser cravada na garganta do guerreiro.
Então, ouviu-se um som de trombetas e a cavalaria surgiu, com gárgulas terríveis pelos ares e serpentes que brotavam da terra e que, em um só bote, engoliram o vilão.

Vez ou outra, a história fica descontrolada e o autor tenta retomar o poder a todo o custo, recorrendo a soluções tão inacreditáveis que quebram a magia do enredo.
Os gregos – ah, os sábios gregos! – tinham um nome para isto: deus ex machina, isto é, o deus fora da máquina.
Esta é a hora que a mão do escritor pesa demais e ele tenta mudar todas as regras de maneira inesperada.

Lembra-se de quando falamos que um enredo ficcional precisa ter coerência, ter lógica?
É aí que o deus ex machina aparece para estragar tudo. E isto pode significar várias coisas: a chegada de um irmão-gêmeo ou de um personagem surpresa no final, alguma coincidência muito bizarra em favor do protagonista, algum milagre sem sentido, catástrofes naturais sem explicação, ou simplesmente criaturas sobrenaturais que surgem do nada.

O deus ex machina pode se manifestar em vários momentos do enredo, geralmente através de situações impossíveis que comprometem a verossimilhança interna da narrativa, mas um recurso deste no final do livro é imperdoável.

7 - Um bela lição de moral


Lambisgóia havia aprendido que, nesta vida, não devemos maltratar os animais nem os demais seres vivos, pois todos possuem a mesma essência cósmica das estrelas.
FIM

Este é outro resquício dos contos populares, que possuíam uma forte tendência pedagógica, ensinando através de exemplos. "Chapeuzinho Vermelho", "João e Maria", "A Branca de Neve", entre outros, nada mais são que fábulas sobre o bom comportamento, alertando as crianças sobre os perigos de se desobedecer os pais e os riscos pelo mundo afora, numa clara distinção entre bem e mal.

A não ser que você esteja escrevendo livros infantis, não há necessidade alguma de deixar clara a moral de sua história. Obviamente que sua obra terá um conteúdo ideológico, alguma tese que você estará defendendo, mas isto pode estar (e é melhor que esteja) diluído nas ações e falas de seus personagens.

Você não deve pensar que seus leitores são bestas ignorantes que precisam de tudo mastigado. Você pode criar tramas com sutilezas e refinamento, sem a necessidade de concluir seu livro explicando o que você queria dizer.

Conclusão

Assim como quando falamos dos piores começos, também é possível escolher qualquer um destes piores finais e torná-los bons.
Mesmo com o mais perigoso deles, o deus ex machina; consigo me lembrar do final de "Cem Anos de Solidão", com um evento tão surpreendente e incrível, porém ainda assim coerente no interior da proposta de García Márquez.

Uma vez mais, a capacidade de renovar, reinventar ou surpreender mesmo com os finais mais clichês dependerá da habilidade de cada escritor, no entanto, o que justificaria escrevermos as mesmas histórias, com os mesmos desenvolvimentos e os mesmos finais sempre?

Talvez um dos maiores méritos da Literatura seja esta possibilidade inesgotável de surpreender, apresentando-nos mundos extraordinários e, ainda assim, convencer-nos que tudo aquilo ali, que se transcorre em páginas e mais páginas, poderia ser tão real quanto o mundo concreto em que vivemos, dentro de suas próprias regras ficcionais.

Tuesday, January 29, 2013

Ler me tornará um escritor melhor?


Acho que muitos esperam uma resposta óbvia, como se eu houvesse acabado de fazer uma pergunta capciosa.

Todavia, o que parece ser senso comum, que todo escritor precisa ler muito, ao observarmos friamente, não é tão evidente assim.

Portanto, a resposta para a indagação "ler me tornará um escritor melhor?" é dúbia.

Sim... e não.

Ler ajuda a escrever?


As quatro competências da comunicação - fala, compreensão, escrita e leitura - são relativamente independentes, apesar de estarem interrelacionadas.

Só para contextualizarmos, é completamente plausível pensarmos em um sujeito que compreenda a linguagem falada, mas que não consiga comunicar-se bem oralmente, ou que seja capaz de ler livros, mas que não consiga escrever uma única palavra.

Qualquer um que já tenha aprendido uma língua instrumental, tal qual ensinada em várias universidades, possui um grau de competência de leitura de uma língua estrangeira, mesmo que não seja capaz de compreendê-la oralmente, de falar ou escrever neste idioma.
Neste caso, temos alguém que domina uma das competências, mas não as demais, ou seja, ser capaz de ler não contribui, de maneira alguma, na habilidade de escrita.

Ler não o ajudará a escrever melhor.

Escrever é que o ajudará a escrever melhor.

A relação entre leitura e escrita


Isto quer dizer que não preciso ler nada para me tornar um bom escritor?

Não exatamente.

Apesar de esta ser uma situação hipoteticamente plausível, na maior parte dos casos alguém se envereda pelo campo da escrita literária porque já gosta de ler.

Escrevo porque adoro ler, e penso que falo pela maioria dos autores.

A leitura não o ensinará a escrever, porém contribuirá em sua escrita de inúmeras maneiras:

1 - enriquecendo seu vocabulário
Na fala cotidiana, utilizamos um repertório muito limitado de palavras e expressões.
Por outro lado, a literatura não é uma mera reprodução da fala, mas um universo linguístico muito mais vasto, no qual podemos expressar ideias, situações, diálogos de uma maneira que não encontramos na vida real.
A melhor maneira para aprender novas palavras e, principalmente, seu uso é através da leitura, bem como da consulta de seu significado num dicionário.

2 - incorporação de enredos
Existe um rol muito limitado de histórias a serem contadas. Vingança, traição, amor, desespero, sobrevivência, viagem, etc. estão presentes na Literatura desde seus primórdios, inclusive, até numa era pré-escritura, quando estas histórias eram narradas oralmente.
Através da leitura de histórias de gêneros variados você assimilará estes diferentes tipos de enredos, compreendendo como eles se desenvolvem.

3 - descobrindo estilos e técnicas
Cada grande autor possui um estilo particular que o distingue dos demais escritores de seu tempo. Frequentemente, o desenvolvimento de um estilo é um processo consciente do autor, que refina seus temas e sua linguagem obra após a outra.
Além disto, existem várias técnicas literárias que contribuem para se atingir certos fins.
Como descrever bem uma cena? Como produzir um bom diálogo? Como desenvolver um personagem cativante?
Estas técnicas e várias outras podem ser aprendidas através da leitura das obras de grandes autores.

O Fantasma da Influência


Por outro lado, a leitura de certos autores pode ter um efeito paralisante em alguns escritores.
Diante de algumas obras aparentemente perfeitas, um escritor iniciante pode se questionar:

O que tenho de relevante para dizer? Jamais conseguirei escrever assim!

Já me senti desta maneira... Várias vezes! Alguns autores são tão estupidamente bons que nós, como escritores, queremos nos encolher num canto e chorar.
Se eu tivesse de reconhecer alguns fantasmas deste tipo, poderia enumerar, sem dificuldade, alguns escritores: Dostoievsky, Kafka, Borges, Fernando Pessoa, Machado de Assis, Nietzsche...
Alguns livros de certos autores possuem um efeito muito destrutivo no meu processo criativo, a ponto de ficar dias sem vontade sequer de voltar a escrever.
Senti-me assim depois de ler "Trópico de Câncer" de Henry Miller, por exemplo.

No entanto, há aqueles autores que servem como uma brisa de ar fresco, revelando-nos novas possibilidades criativas.
Enquanto lia "Molloy" de Samuel Beckett, tudo em que eu pensava era: "preciso escrever. Preciso escrever!", pois a prosa deste autor era tão solta e liberadora que a cada frase eu tinha novas ideias.
Outros escritores que surtiram em mim efeito semelhante foram James Joyce, Cortázar, Italo Calvino, García Márquez, Bukowski, Thomas Mann e Guimarães Rosa.

Isto não significa que estes mesmos escritores o influenciarão da mesma maneira. Contudo, você só descobrirá quais serão seus fantasmas e seus gênios inspiradores ao lê-los, ao embrenhar-se nos mais diversos tipos de leituras, não apenas naquelas que você gosta ou admira.
Comumente, correr riscos e tentar ler aquilo que você não está habituado pode surtir grandes efeitos positivos.

Conclusão

Repito: ler não o tornará um escritor melhor. Escrever sim.

Todavia, a leitura e a escrita estão profundamente entranhadas. Mesmo se você for um leitor ávido, se não possuir disciplina para escrever diariamente, você dificilmente se tornará um escritor melhor.

A leitura é uma etapa fundamental no processo de aprendizado da escrita, disto não temos dúvida. No entanto, a partir do momento em que você decide se tornar um autor, ler apenas não basta. É preciso ler bem.
Como escritor, você aprenderá a criar personagens, a realizar descrições, a narrar, a fazer com que seus personagens dialogue.
Mas como um leitor, você pode utilizar seu conhecimento para identificar as soluções utilizadas pelos outros autores.

Como Dostoiesvksy estabelece um ritmo narrativo através dos diálogos? Como Milan Kundera utiliza a Filosofia para compôr seus personagens? Como Dickens apresenta e constrói seus protagonistas? Como Joyce desconstrói a linguagem para seus propósitos estéticos?

Estas e várias outras indagações podem - e devem - ser feitas durante suas leituras.

Agora, se você não tem prazer lendo, eu recomendaria que você nem tentasse a carreira literária. Para mim, isto não faz sentido.

Se você não gosta de ler os livros dos outros, também não pode esperar que os outros queiram ler os seus.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Seguidores

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.